Segurança pública, mídia e neoconservadorismo: a naturalização da barbarização das relações sociais

AutorSilene de Moraes Freire, Larissa Costa Murad, Leticia Tavares da Silva e Silva
Páginas212-231
SEGURANÇA PÚBLICA, MÍDIA E NEOCONSERVADORISMO: a naturalização da
barbarização das relações sociais
Silene de Moraes Freire1
Larissa Costa Murad2
Leticia Tavares da Silva e Silva3
Resumo:
O artigo problematiza a complexida de da barbarização das relações sociais no Brasil. A partir da intervenção federal no Rio
de Janeiro em 2018, indicamos a política de segurança pública, sua abordagem pe la mídia e a reorganização da moralidade
pelos movimentos evangélicos como centrais na construção do consenso necessário à cons olidação da hegemonia
neoconservadora processo que culmina nos resultados obtidos no pleito eleitoral de 2018. O consenso acerca da
necessidade da coerção aparece como nexo nos distintos discursos que permearam o recrudescimento da militarização da
segurança pública, expressa na intervenção federal no Rio de Janeiro, e da própria política, instituindo-se, de vez, a
regressão social própria do tardo-capitalismo.
Palavras-chave: Segurança Pública. Mídia. Neoconservadorismo.
PUBLIC SAFETY, MEDIA AND NEOCONSERVATISM: the naturalization of the barbarism of social relations
Abstract:
This article discusses the complexity of the barbarism of social relations in Brazil. Through the federal intervention in Rio de
Janeiro in 2018, we indicate the centrality of the public safety policy, the media approach and the reorganization of the
morality made by the evangelical movements in the consensus building needed for the consolidation of neoconservative
hegemony process that culminates in the results obt ained in the elections of 2018. The consensus on the necessity for
coercion appears as a nexus in the distinct speeches that permeated the intensification of the militarization of public secur ity,
expressed in the federal intervention in Rio de Janeiro, and of politics itself, establishing once and for all the social
regression characteristic of late-capitalism.
Keywords: Public Safety. Media. Neoconservatism.
Artigo recebido em: 14/01/2019 Aprovado em: 04/04/2019
DOI: http://dx.doi.org/10.18764/2178-2865.v23n1p212-231.
1 Doutora em Sociologia pela Universidade de São Paulo (USP, 1999) e pós doutorado em Serviço Social pela Universidade
Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Professora associada da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ),
coordenadora do Program a de Estudos de América Latina e Caribe (PROEALC) e do Observatório de Direitos Humanos
(ODH) da América Latina do Centro de Ciências Sociais da UERJ. E-mail: tavar esleticiass@gmail.com
2 Doutora em Serviço Social pela UFRJ. Bolsista PNPD/CAPES no Programa de Pós-graduação em Serviço Social
(PPGSS) da UERJ. Colaboradora no PROEALC do Centro de Ciências Sociais (CCS) da UERJ. Professora convidada
nas pós-graduações “Serviço Social e o Sistema Sociojurídico” e “Família, Envelhecimento e o Cuidado com Idosos” do
Centro Universitário Augusto Motta. E-mail: larissamuradrj@hotmail.com
3 Graduada em Ciências Sociais. Bolsista de Iniciação Científica (IC/CNPq). Pesquisadora do ODH vinculado ao
PROEALC/CCS/UERJ. Endereço: 1º andar, Bloco A, R. São Francisco Xavier, 524 - sala 1006 - Maracanã, Rio de Janeiro
RJ. CEP: 20550-900.
Silene de Moraes Freire, Larissa Costa Murad e Leticia Tavares da Silva e Silva
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1 INTRODUÇÃO
As proposições aqui apresentadas foram construídas a partir das experiências de
pesquisa desenvolvidas no Observatório de Direitos Humanos na América Latina (ODH), vinculado ao
Centro de Ciências Sociais (CCS) da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Partimos do
entendimento de que, diante da complexificação da realidade própria do tardo-capitalismo (PAULO
NETTO, 2013), é urgente o mapeamento acerca dos pilares de sustentação das mudanças
sistemáticas nas relações sociais, o que no Brasil culminou com a eleição de executivos e
parlamentares alinhados ao movimento global de crescimento da ultradireita à qual nos referiremos
como alt-right em 2018.
A partir da sistematização e da coleta de notícias realizada na mídia online, observamos
que o enfoque conferido à política de segurança pública nos permite analisar alguns elementos que,
combinados ao crescimento de movimentos religiosos, em particular o movimento neopentecostal,
coadunaram na reorganização da moral conservadora e no recentramento da mesma enquanto
política. Como observou Zaffaroni (2011), a discursividade vendida pela mídia tem um modelo
disseminado que aparece como discurso naturalizado. Para ele, uma das técnicas do poder é o
monopólio da informação, que impede a comunicação entre as margens, por isso o isolamento
intramarginal. Por que incorporamos acriticamente a barbárie vivenciada nos dias de hoje? Ainda
segundo Zaffaroni (2011), a produção midiática daquilo que Chomski chamou de aquiescência passiva,
manufatura do consentimento, é realizada milimetricamente, palavras são escolhidas e a elite é sempre
colocada como vítima. Para o autor, os especialistas usados pela mídia são sempre os mesmos para
referendar essa manufatura do consentimento, verdadeira colonização das almas. Colonização esta,
como mencionou Batista (2011, p. 8), que fez com que “[...] passássemos da crítica da truculência e da
militarização da segurança pública à sua naturalização e agora ao aplauso, adesão subjetiva a
barbárie. Triunfalismo exorbitante da Tropa da Mídia. (BATISTA, 2011).
Nesse sentido, apresentaremos alguns elementos discursivos presentes na mídia 1acerca
da política de segurança pública, analisados a partir do léxico gramsciano, tendo em vista que, partindo
do pressuposto de que a mídia conforma um dos aparelhos privados de hegemonia com maior
ramificação social, categorias tais como ideologia, hegemonia, coerção e consenso, nos permitem
observar a canalização da insegurança social e a difusão do medo como substratos da construção do
consenso sobre a coerção. Assim, partimos da premissa (já mencionada em estudos anteriores) que na
atualidade não é possível entender a produção de sentidos e significados, que reproduzem os
esquemas de dominação, sem compreender a mediação dos meios de comunicação na interpretação
da realidade falando pelos e para os indivíduos. (GUATTARI; ROLNIK, 1985).

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