Os seguros e planos de saúde e a regulação setorial por agência ou entidade independente

AutorOscar Ivan Prux
Páginas111-159
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Capítulo 5
OS SEGUROS E PLANOS DE SAÚDE
E A REGULAÇÃO SETORIAL POR AGÊNCIA OU
ENTIDADE INDEPENDENTE
Na formatação que a maioria dos Estados modernos ocidentais
vêm adotando, a regulação estatal costuma estar presente na área da
saúde em razão do interesse social envolvido. E a forma como ela é
estruturada em relação aos seguros e planos de saúde, em especial, o grau
de intervencionismo estatal, não apenas indica seus aspectos
fundamentais, como sinaliza conclusões visualizadas nos resultados
decorrentes seu funcionamento. E nesse ponto para melhor análise do
modelo brasileiro, novamente recorremos ao direito comparado
encontrável em Portugal. A análise das diferenças faz transparecer os
pontos positivos e negativos de cada sistema.
Os seguros de saúde em Portugal (não existe a modalidade de
plano de saúde) tem regulação, de modo mais direto, efetivada pela
Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensão ASF que
supervisiona todos os tipos de seguros. Já no Brasil, a regulação é feita
pela Agência Nacional de Saúde Suplementar ANS95, que devido ao
regime de especialização trata apenas desse tipo de seguro ou plano de
saúde. Nesse contexto, passa-se a detalhar essa espécie de
“organograma” formado pelas Agências envolvidas, as quais, vale
lembrar, fazem parte do Estado e são instituídas em prol do bom
funcionamento do mercado que regulam e do bem comum. Em questão
tão sensível como essa em setor de exercício pela iniciativa privada, faz
parte da função social de uma entidade reguladora atentar para aspectos
como o respeito aos direitos humanos e fundamentais das pessoas, sem
que para isso seja preciso sacrificar a ordem econômica. A regulação
95 Os outros tipos de seguros têm regulação pela Superintendência de Seguros Privados
Susep.
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deve fazer parte da otimização dos esforços que reúnem tacitamente a
contribuição do setor privado como complemento à atuação do setor
público.
Nesse aspecto, embora com ideais idênticos, o modelo brasileiro
e o modelo estrangeiro já referido, pela forma como é executada a
regulação, mostra semelhanças e diferenças substanciais claramente
percebíveis, como ficará explícito a seguir.
5.1 Direito comparado: a Regulação do Setor na Realidade
Portuguesa
A Constituição da República portuguesa, em seu art. 267º, nº 3,
prevê que A lei pode criar entidades administrativas independentes,
estabelecendo o permissivo para esse tipo de regulação, praticada por
estruturas com independência orgânica, funcional e financeira.
Eduardo Paz Ferreira, Luís Silva Morais e Gonçalo Anastácio96,
tratando a respeito do que consideram ser um conceito geral de regulação
jurídica da economia, disseram:
Este poderá ser enunciado como o desenvolvimento
de processos jurídicos de intervenção indirecta na
actividade económica produtiva indirecta, porque
se exclui a participação pública directa na actividade
empresarial incorporando algum tipo de
condicionamento ou coordenação daquela actividade
e das condições do seu exercício, visando garantir o
funcionamento equilibrado da mesma actividade em
função de determinados objectivos públicos.
Portanto, os objetivos são públicos, mas não é o Estado quem
executa diretamente aquelas tarefas que passaram a ser encargo das
entidades reguladoras independentes (regulamentar, controlar, fiscalizar,
aplicar sanções etc.), as quais, tendo recebido autonomia, possuem a
competência para atuar em prol do correto e construtivo funcionamento
96 FERREIRA, Eduardo Paz; MORAIS, Luís Silva; ANASTÁCIO, Gonçalo (Coords.).
Regulação em Portugal. Coimbra: Almedina, 2009. p.22.
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do setor. Note-se que para essas entidades é dado o poder de fiscalizar
tanto a atuação das empresas privadas, quanto das públicas (incluindo os
fornecimentos que o Estado faz diretamente nos atendimentos na área da
saúde).
Em relação ao sistema antigo/tradicional pelo qual o Estado
realizava intervenção direta, sistema este que acabou modificado com o
surgimento de um novo modelo pautado na regulação por entidades
independentes, as vantagens podem ser múltiplas, como refere Marisa
Caetano Ferrão97:
As principais razões que conduziram a essa divisão
foram: a vantagem em afastar o mercado da lógica
política; separar a intervenção directa no mercado
(que o Estado, em algumas áreas, ainda mantém
enquanto <<Estado Produtor>>) da regulação do
mesmo; a redução dos custos do Estado com a
regulação; e aumentar a eficácia e a legitimidade da
decisão.
Como se pode observar quanto às entidades independentes, elas
geram uma diminuição da estrutura administrativa composta de
funcionários públicos envolvidos na regulação do setor e eliminam
possíveis problemas pelo fato de servidores (públicos) também serem os
fiscalizadores dessa atuação, condição suficiente para colocar em risco a
eficácia dos procedimentos.
De forma didática, o autor português Rui Nunes98, afirma que os
reguladores podem ser divididos em: a) dedicados, no que se refere ao
âmbito da atividade, ou seja, esta é voltada exclusivamente para a
regulação; b) não dedicados, no caso, a entidade não se limita à
regulação, mas esta afeta mais de uma atividade, tal como, por exemplo,
ocorre com o Ministério da Saúde. Pode também haver entidades que se
97 FERRÃO, Marisa Caetano. As entidades administrativas independentes com funções
de regulação económica e dualidade de jurisdições: Breves notas. Revista “O Direito
III”, Almedina, p.601-637, 2007. p.607.
98 NUNES, Rui. “Regulação da saúde”. 3.ed. Porto, Portugal: Vida Económica, 2014.
p.131.

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