Sistema financeiro nacional

AutorAlice Saldanha Villar
Páginas49-80

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1 Mercado Financeiro Nacional

O mercado financeiro é o mercado onde os valores das poupanças disponíveis (de indivíduos, empresas e governos) são reconduzidos para empréstimos ou investimentos. Deve-se entender por poupança a parcela de renda não gasta pelos agentes econômicos no período em que é recebida, sendo guardada para uso futuro. As poupanças são, portanto, instrumentos de fomento do mercado financeiro, permitindo que recursos excedentes da economia sejam redirecionados para a promoção do desenvolvimento econômico, financiando a atividade negocial e viabilizando novos projetos.

Os principais atores do mercado financeiro são: os compradores (tomadores de empréstimos), os vendedores (poupadores) e os inter-mediários (instituições financeiras). Os compradores ou tomadores de empréstimos são os agentes econômicos deficitários, isto é, os comer-ciantes, industriais ou mesmo pessoas físicas que precisam de capital para financiar suas atividades negociais e poder de consumo de bens ou serviços. Os vendedores ou poupadores são os agentes econômicos superavitários dispostos a ofertar seus recursos monetários disponíveis, de modo a transformá-los em ativos financeiros. Os poupadores, nessa medida, atuam como investidores, que se sujeitam aos riscos de mercado com vistas a obter resultados financeiros positivos.

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As instituições financeiras são os atores intermediários do mercado, cuja função é efetuar a intermediação de fluxo de capitais, promovendo a circulação de moeda. Como aponta Gitman, "as instituições financeiras são intermediários que canalizam as poupanças de indivíduos, empresas e governos para empréstimos ou investimentos".46Para tanto, cobram dos tomadores de empréstimos uma taxa, cuja finalidade é cobrir os custos de transação e os riscos inerentes ao empréstimo.

Cabe registrar que o art. 17 da Lei nº 4.595/64 define as instituições financeiras como "as pessoas jurídicas públicas ou privadas, que tenham como atividade principal ou acessória a coleta, intermediação ou aplicação de recursos financeiros próprios ou de terceiros em moeda nacional ou estrangeira, e a custódia de valor de propriedade de terceiros". O parágrafo único ainda estabelece que "equiparam-se às instituições financeiras as pessoas físicas que exerçam qualquer das atividades referidas neste artigo, de forma permanente ou eventual". É prerrogativa do Banco Central do Brasil (BACEN) "exercer a fiscalização das instituições financeiras e aplicar as penalidades previstas" (Lei nº 4.595/64, art. 10, IX). Conforme dispõe o art. 67 da Lei no 9.069/95: "As multas aplicadas pelo Banco Central do Brasil, no exercício de sua competência legal, às instituições financeiras e às demais entidades por ele autorizadas a funcionar, bem assim aos administradores dessas instituições e entidades, terão o valor máximo de R$100.000,00 (cem mil reais)". Por sua vez, a Lei nº 7.492/86 pune com pena de reclusão o indivíduo que faz operar, sem a devida autorização, instituição financeira, inclusive de distribuição de valores mobiliários ou de câmbio (art. 16).

2 Criação do Sistema Financeiro Nacional

O Sistema Financeiro Nacional é o conjunto de órgãos e instituições responsáveis por regulamentar, fiscalizar e executar as operações relacionadas à gestão da política monetária nacional.

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Conforme prevê o art. 192 da Constituição Federal de 1988, na redação dada pela Emenda Constitucional nº 40, de 2003: "O Sistema Financeiro Nacional, estruturado de forma a promover o desenvolvimento equilibrado do país e a servir aos interesses da coletividade, em todas as partes que o compõem, abrangendo as cooperativas de crédito, será regulado por leis complementares que disporão, inclusive, sobre a participação do capital estrangeiro nas instituições que o integram". Este dispositivo prevê a elaboração de lei complementar do Sistema Financeiro Nacional, ainda não editada. Enquanto não for criada esta lei complementar, o Sistema Financeiro Nacional continua atrelado ao disposto na Lei nº 4.595/64.

A formação do Sistema Financeiro no Brasil remete à vinda da Família Real portuguesa em 1808, quando foi criado o Banco do Brasil. Com o tempo, novas instituições foram criadas, como a Inspetoria Geral dos Bancos (1920), as Câmaras de Compensação do Rio de Janeiro (1921) e de São Paulo (1932), entre outros bancos e instituições privadas e caixas econômicas.

Como consequência da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), novas instituições financeiras surgiram no cenário internacional, como o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial. Ambas foram instituídas na Conferência de Bretton Woods, em 1944. O FMI foi criado para proteger o sistema monetário internacional, auxiliando os governos a superar problemas financeiros em suas balanças de pagamento. Já o Banco Mundial, cujo nome oficial é Banco Inter-nacional para Reconstrução e Desenvolvimento" (BIRD) - do inglês, International Bank for Reconstruction and Development (IBRD) -, foi criado para atender às necessidades de financiamento de programas que promovessem a reconstrução dos países devastados pela Segunda Guerra Mundial.

No ano de 1945 é criada no Brasil a Superintendência da Moeda e do Crédito (SUMOC), que em 1964 deu lugar ao BACEN, em razão do advento da Lei da Reforma Bancária (Lei nº 4.595/64). Em 1952, foi criado o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) pela Lei nº 1.628/1952 para o financiamento de longo prazo à realização de investimentos em todos os segmentos da economia.

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Mais de uma década depois, no ano de 1964, foi criado o Sistema Financeiro de Habitação, pela Lei nº 4.380/1964, para facilitar a aquisição da casa própria e favorecer as classes de baixa renda.

A regulamentação do Sistema Financeiro Nacional no Brasil só veio a ser feita pela Lei nº 4.595, de dezembro de 1964 - chamada Lei da Reforma Bancária. Esta lei tinha o intuito de modernizar as estruturas de regulação e supervisão monetária no Brasil, bem como promover a segurança do sistema financeiro. Este diploma legal criou o Conselho Monetário Nacional (CMN) e o BACEN, que se tornaram os principais órgãos do sistema. Ao CMN - órgão responsável por expedir diretrizes gerais para o bom funcionamento do SFN - foi delegada a função de formular a política da moeda e do crédito, sendo o BACEN o principal executor das orientações do CMN. É importante destacar que, antes do advento da Lei nº 4.595/64, o sistema financeiro pátrio não possuía uma estruturação lógica racional. As autoridades monetárias eram representadas pela SUMOC, pelo Banco do Brasil e pelo Tesouro Nacional, que possuíam, respectivamente, as funções de execução do controle monetário, supervisão da atuação dos bancos comerciais e orientação da política cambial; controle de operações de comércio exterior, recebimento de depósitos compulsórios e voluntários dos bancos comerciais e execução de operações de câmbio em nome de empresas públicas e do Tesouro Nacional; e emissão de papel-moeda.

Em 1976, foi criada a Comissão de Valores Mobiliários (CVM), pela Lei nº 6.385/76, com o objetivo de fiscalizar, normatizar, disciplinar e desenvolver o mercado de valores mobiliários no Brasil. Em 1979, foi implantado o Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), sob a égide da Circular 466, de 11/10/1979, do BACEN. Trata-se de um sistema informatizado que se destina à custódia de títulos escriturais de emissão do Tesouro Nacional, bem como ao registro e à liquidação de operações com esses títulos.

3 Função Social do Sistema Financeiro Nacional na Constituição Federal de 1988

O mercado financeiro é um dos pilares do desenvolvimento econômico no Estado Democrático de Direito, devendo o Estado

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atuar como agente normativo e regulador da atividade econômica, com vistas a promover a segurança e o desenvolvimento da economia nacional, por meio da observância e concretização dos princípios da Ordem Econômica. Tais princípios encontram-se definidos no art. 170 da CF/88:

I - soberania nacional;

II - propriedade privada;

III - função social da propriedade;

IV - livre concorrência;

V - defesa do consumidor;

VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 42, de 19/12/2003)

VII - redução das desigualdades regionais e sociais;

VIII - busca do pleno emprego;

IX - tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no país. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 6, de 1995)

A implementação dos princípios constitucionais da Ordem Econômica na dinâmica dos mercados financeiros tem por objetivo superar as desigualdades e garantir a proteção dos direitos fundamentais, com vistas à realização dos ideais de justiça social. A chamada atividade regulatória deve estar revestida de "preocupação social e econômica, intervindo na sociedade de forma a produzir normas socializantes e buscando diminuir as desigualdades existentes".47Em seu art. 192, a Constituição Federal de 1988 dispôs o seguinte:

CF/88. Art. 192. O Sistema Financeiro Nacional, estruturado de forma a promover o desenvolvimento equilibrado do país e a servir aos interesses da coletividade, em todas as partes que o compõem, abrangendo as cooperativas de crédito, será regulado por leis complementares que disporão, inclusive, sobre a participação do capital estrangeiro nas instituições que o integram.

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