Sistema prisional brasileiro: COVID-19 e os reflexos em um ambiente de 'pandemia estrutural'

AutorPaulo Roberto Felix dos Santos, Izy Rebeka Gomes Lima, Maria Suelen Santos
CargoAssistente Social. Doutor em Serviço Social pelo Programa de Pós-Graduação em Serviço Social da Universidade Federal do Rio de Janeiro (PPGSS/UFRJ). Docente do Curso de Graduação (DSS/UFS) e do Programa de Pós-Graduação em Serviço Social da Universidade Federal de Sergipe (PROSS/UFS). Líder do Grupo de Estudos e Pesquisas Marxistas (GEPEM/UFS)....
Páginas245-262
SISTEMA PRISIONAL BRASILEIRO: Covid-19 e os reflexos em um ambiente de “pandemia
estrutural”
Paulo Roberto Felix dos Santos
1
Izy Rebeka Gomes Lima
2
Maria Suelen Santos
3
Resumo
O presente artigo busca proporcionar uma reflexão crítica do sistema prisional brasileiro em tempos de pandemia. A partir
de revisão bibliográfica, pesquis a documental, e noticiários jornalísticos,identifica como as condições precarizadas das
unidades prisionais propiciam a expansão da pandemia, expondo seus(uas) internos(as) às mais variadas violações de
direitos, que impactam mais diretamente a população negra e pobre, escancarando o racismo estrutural nesses ambientes.
Demonstra algumas das medidas utilizadas para mitigar os efeitos da pandemia que, apesar de importantes, revelam-se
limitadas diante das estruturas das prisões. Tais elementos explicitam os fundamentos das medidas de aprisionamento e
das formas de controle capitalista mobilizadas em face do excedente de força de trabalho, e que no contexto de pandemia
tem essa condição agravada nas prisões.
Palavras-chave: Sistema Prisional Brasileiro. Pandemia. Violação de Direitos. Racismo Estrutural.
BRAZILIAN PRISON SYSTEM: Covid-19 and its reflexes in an “structural pandemic” en vironment
Abstract
The present article seeks t o provide a critical reflection of the Brazilian prison system in times of pandemic. From
bibliographic review, documentary research, and journalistic news, it identifies how the precarious conditions of the prison
units propitiate the expansion of the pandemic, expo sing its inmates to the most varied rights violations, which most directly
impact the black population. and poor, opening up structural racism in these environmen ts. Demonstrate some of the
measures used to mitigate the effects of the pandemic, which, although important, are limited in view of prison structures.
Such elements explain the fundamentals of the imprisonment measures and the forms of capitalist control mobilized in the
face of the surplus of workforce, and that in the context of a pandemic this condition i s aggravated in prisons.
Keywords: Brazilian Prison System. Pandemic. Violation of Rights. Structural Racism.
.
Artigo recebido em: 21/12/2020 Aprovado em: 20/05/2021
DOI: http://dx.doi.org/10.18764/2178-2865.v25n1p245-262
1
Assistente Social. Doutor em Serviço Social pelo Programa de Pós-Graduação em Serviço Social da Universidade Federal
do Rio de Janeiro (PPGSS/UFRJ). Docente do Curso de Graduação (DSS/UFS) e do Programa de Pós-Graduação em
Serviço Social da Universidade Federal de Sergipe (PROS S/UFS). Líder do Grupo de Estudos e Pesquisas Marxistas
(GEPEM/UFS). E-mail: fellix.ufs@gmail.com
2
Graduanda em Serviço Social pela Universidade Federal de Sergipe (UFS). Integrante do Grupo de Estudos e Pesquisa
em Fundamentos, For mação em Serviço Social e Políticas Sociais- GEPSSO/ UFS. Integrante do Programa de Educação
Tutorial de Serviço Social - PET/SS. E-mail: izy_rgl@hotmail.com
3
Graduanda em Serviço Social pela Universidade Federal de Sergipe (UFS). Integrante do Programa de Educação Tutor ial
de Serviço Social da Universidade Federal de Sergipe (PET-SS/UFS). E-mail: maria.sue llem@gmail.com.
Paulo Roberto Felix dos Santos, Izy Rebeka Gomes Lima e Maria Suelen Santos
246
1 INTRODUÇÃO
O contexto do capitalismo contemporâneo elucida as consequências destrutivas de um
projeto necropolítico estatal no tratamento conferido às expressões da questão social
1
por meio do
processo de criminalização da pobreza que se caracteriza através da penalização estatal, da violência
cotidiana, da repressão e do encarceramento das massas que em sua maioria corresponde à
população negra, pobre e sem escolaridade (BORGES, 2018; 2020). Esse processo acentua-se tendo
no Estado o aparato central para garantir as condições pertinentes para a acumulação e valorização do
capital, bem como concentração/centralização dessa riqueza que é garantida às corporações
financeiras e grandes monopólios por meio da intensificação da exploração da força de trabalho,
gerando consequências destrutivas. Dentre as consequências, além da ampliação das formas
precarizadas de trabalho, observa-se no circuito de desenvolvimento da lei geral de acumulação
capitalista (MARX, 2013), um incremento das modalidades de subemprego e de desemprego,
resultando no aumento de volume da força de trabalho sobrante.
Das alternativas mediatizadas de gestão desse excedente de força de trabalho, cada vez
maior, em um contexto de crise estrutural (MÉSZÁROS, 2002), verificamos a política de
“encarceramento em massa” (BORGES, 2018; WACQUANT, 1999) como um dos mecanismos que
vem ganhando centralidade. Uma mirada simples na escalada punitiva do Estado brasileiro é capaz de
ilustrar essa constatação, quando observamos que, até o início de 2020
2
, o país contava 338 pessoas
presas para cada 100 mil habitantes, o que o coloca com a terceira maior população carcerária do
mundo, ficando atrás somente de países como EUA e China (BORGES, 2020).
Em paralelo ao aumento exponencial da massa carcerária brasileira, identificamos
péssimas condições das unidades prisionais, em uma histórica “pandemia estrutural”, que levou o
Supremo Tribunal Federal (STF) a classificar essa situação como “estado de coisas inconstitucional”,
num cenário de violação permanente de direitos. Esse contexto tende a se agravar diante do
aprofundamento da crise capitalista que, por sua vez, revisita, cada vez mais, formas brutais de
controle sobre o trabalho, que demarcaram o início desse modo de produção. Diante desse quadro,
torna-se fundamental refletir acerca da configuração, principalmente em um contexto em que se
explicita uma das maiores crises sanitárias desse século, causada pelo SARS-COV-2 (Severe Acute
Respiratory Syndrome Coronavirus 2) ou COVID-19, tornando-se necessário compreender os desafios
e seus impactos, sobretudo para a população mais “vulnerabilizada”, e dentro desta, para a população
que hoje ocupa os espaços do sistema prisional brasileiro. Destarte, apresente discussão gira em torno
da problematização da configuração das condições (jurídicas, estruturais e sanitárias) atuais dos

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT