A sociedade tecnológica reduz direitos sociais?

AutorPaulo César Baria de Castilho
Páginas54-65
A SOCIEDADE TECNOLÓGICA REDUZ DIREITOS SOCIAIS?
Paulo César Baria de Castilho
Advogado. Mestre em Direito Tributário e Doutor em Direito do Trabalho pela PUC/SP.
Pós-doutor pela Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra — Portugal. Membro da
Academia Brasileira de Direito da Seguridade Social — ABDSS, ocupa a Cadeira n. 5.
1. INTRODUÇÃO: PERCEPÇÃO DO PROBLEMA
O homem é um ser social. Essa afirmação, contida no início de um trabalho jurídico, seria totalmente
despicienda se não fosse a perplexidade já externada pelo dramaturgo alemão Bertolt Brecht: “Que tempos
são estes, em que temos que defender o óbvio?”
Isso porque a forma com que foi idealizado o mundo capitalista, é necessário produção e consumo. A
produção depende dos investimentos do capital, que escolhe a melhor opção, com o menor risco. Quanto
ao consumo, não tem jeito: a mola propulsora da economia globalizada ainda está atrelada ao pagamento
de salários. Apenas os mais abastados financeiramente, ainda que queiram, não conseguiriam consumir
tudo o que é produzido e necessário para fazer a roda da economia continuar girando.
Isso não é novo. Foi observado por Adam Smith há mais de 200 anos, ratificando que é necessário
o reinvestimento do lucro por meio da contratação de mais empregados.(1) O salário, nas mãos dos
trabalhadores, gera mais consumo, que continua o mecanismo próprio do sistema econômico vigente.
Na fase atual do capitalismo, agora denominado de financeiro, em que uma das suas vertentes é
o capitalismo tecnológico(2), a produção de bens está cada vez mais automatizada e dispensando o
trabalho humano, especialmente aquele considerado repetitivo. Num primeiro momento, isso pode causar
desemprego e a consequente falta de renda das famílias. Corre-se o risco de fazer a máquina parar ou andar
mais devagar, gerando recessão.
Com a introdução das novas tecnologias, resolve-se grande parte do problema da produção, mas
não a questão do consumo. Esse fenômeno também não é novo e já foi observado, no final do século XIX,
por Paul Lafargue: “O grande problema da produção capitalista não é mais o de encontrar produtores e
decuplicar forças, mas descobrir consumidores, instigar seus apetites e criar-lhes necessidades factícias.(3)
No mesmo sentido e percebendo-se disso, o capitalismo camaleão(4) passou a exigir que os Estados
investissem em previdência social, pois há necessidade que o aposentado continue tendo renda para
(1) SMITH, Adam. A riqueza das nações. Uma investigação sobre a natureza e as causas da riqueza das nações. São Paulo: Madras, 2018.
p. 62-79.
(2) DELGADO, Mauricio Godinho. Capitalismo, trabalho e emprego: entre o paradigma da destruição e os caminhos de reconstrução.
3. ed. São Paulo: LTr, 2017. p. 154.
(3) LAFARGUE, Paul. O direito à preguiça. Tradução, apresentação e notas Alain François. São Paulo: Edipro, 2016. p. 71.
(4) CASTELO, Jorge Pinheiro. O direito do trabalho líquido: o negociado sobre o legislado, a terceirização e o contrato de curto prazo na
sociedade líquida. São Paulo: LTr, 2017. p. 47.
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