O software e a sua exploração econômica

AutorMaria Ângela Lopes Paulino Padilha
Páginas111-171
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3. O SOFTWARE E A SUA EXPLORAÇÃO
ECONÔMICA
A evolução mercadológica do software, representada pela
sofisticação crescente dos negócios jurídicos tendo-lhe como
objeto, é o retrato certeiro da evolução técnica da informática
e dos meios de comunicação. Somente com os avanços tecno-
lógicos dessas áreas, marcadas pelo aprimoramento da Inter-
net e da capacidade computacional, foi possível a migração
da exploração econômica do software do mundo físico para o
universo virtual.
É inegável que o ciberespaço impulsionou, e continua a
impulsionar, profundas mudanças no modus operandi de em-
preender com programas de computador, despertando novas
formas de contratar e novos modelos de negócio, o que pode
repercutir na esfera tributária. Daí advém a suma importân-
cia de nos ocuparmos, em capítulo próprio, da exploração
econômica do software e seus desdobramentos no atual está-
gio do progresso tecnológico.
3.1 Comércio tradicional versus comércio eletrônico
Retomando parte das reflexões ensaiadas no item 1.5.1
(Parte 1), o avanço dos recursos informáticos e das telecomuni-
cações favoreceu, e muito, o desenvolvimento do denominado
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MARIA ÂNGELA LOPES PAULINO PADILHA
“comércio eletrônico”. Distintamente do conceito tradicional
de comércio, em que as transações comerciais são marcadas
pela tangibilidade e pelo contato direto entre os sujeitos en-
volvidos, a modalidade eletrônica baseia-se nos negócios ju-
rídicos realizados de forma não presencial (por meio de te-
lemarketing, redes de computadores ou qualquer outro meio
eletrônico).
Neste universo da contratação eletrônica, destacam-se as
transações em ambiente virtual (e-business), que se servem
dos recursos informáticos como ferramenta para formação,
instrumentalização ou execução do liame contratual. Arrima-
das no processamento automático de dados através da Inter-
net, tais transações desdobram-se em negócios com tangíveis
e intangíveis: os primeiros consistentes em atos negociais
que, a despeito da oferta e firmamento do contrato efetiva-
rem-se eletronicamente, têm como objeto bens corpóreos; e
os segundos, relativos a operações com produtos e serviços
virtuais, reportam-se às hipóteses em que a Internet é o meio
pelo qual se perfazem não só a oferta e a contratação, mas a
própria disponibilização do conteúdo digital transacionado.
No âmbito da União Europeia, conforme Comunicado da
Comissão Especial de Iniciativa no Setor do Comércio Ele-
trônico, costuma-se discernir essas duas modalidades em: (i)
o comércio eletrônico indireto, representado pela encomenda
eletrônica de bens tangíveis que precisam ser entregues fisi-
camente e, por isso, dependem de uma série de fatores exter-
nos, tais como a eficiência do sistema de transporte e serviço
postal; e (ii) o comércio eletrônico direto, alusivo à encomenda,
ao pagamento e à entrega eletrônicas de bens intangíveis, tais
como software e conteúdo de entretenimento.111
111. Tradução livre do seguinte texto: “Electronic commerce, based on the electro-
nic processing and transmission of data, encompasses many diverse activities in-
cluding electronic trading of goods and services, on-line delivery of digital content,
electronic funds transfers, electronic share trading, public procurement, and so on.
These activities may be divided into two categories: (i) indirect electronic commer-
ce, i.e. the electronic ordering of tangible goods that must still be physically delive-
red and which therefore depends on a number of external factors, such as the
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TRIBUTAÇÃO DE SOFTWARE
Tendo em mente a segunda categoria mencionada, re-
ferente a operações com intangíveis, nota-se que o vocábulo
“comércio” é empregado com uma conotação bastante ampla,
na medida em que alcança também qualquer forma negocial
de disponibilização de conteúdo e informação digital. A res-
peito dessa extensão significativa pontua Arnaldo Wald que,
“numa visão mais ampla, concebe-se comércio eletrônico
como o conjunto de usos comerciais de redes, com a alienação
ou a simples apresentação de produtos ou serviços”.112
Essa dinâmica do mercado virtual pressupõe uma nova
compreensão às relações intersubjetivas e um desafio para a
tributação sobre o consumo, porquanto o fato de o objeto ne-
gociado inexistir fisicamente impacta diretamente na forma
de apropriá-lo e utilizá-lo, ainda que as funcionalidades do
bem digital percebidas pelo consumidor sejam as mesmas.113
De acordo com Estudos da Secretaria da Receita Federal
sobre “O Brasil e o Comércio Eletrônico” ,114 quando a circu-
lação do produto, vendido on-line, é física, apesar de surgirem
problemas de controle de documentação fiscal e de distribui-
ção de receitas entre Estados de origem e destino da merca-
doria em operações interestaduais, a tributação segue a legis-
efficiency of the transport system and postal services; and (ii) direct electronic com-
merce, i.e. the on-line ordering, payment and delivery of intangible goods and servi-
ces such as computer software and entertainment content. Electronic commerce is
not limited to the Internet, but includes other applications such as videotex, tele-
-shopping and catalogue sales on CD-Rom” (EUROPE. European initiative on elec-
tronic commerce. The principal aim of this communication is to encourage the vigo-
rous growth of electronic commerce in Europe. 18 April 1997. Disponível em:
https://bit.ly/2lJHXmp Acesso em: 10 set. 2019.
112. WALD, Arnoldo. Um novo direito para a economia: os contratos eletrônicos e o
Código Civil. In: GRECO, Marco Aurélio; MARTINS, Ives Gandra da Silva (Coords.).
Direito e internet: relações jurídicas na sociedade informatizada. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2001, p. 17.
113. EMERENCIANO, Adelmo da Silva. Tributação no comércio eletrônico. São Pau-
lo: IOB; Síntese, 2003, p. 32.
114. BRASIL. Ministério da Fazenda. Secretaria da Receita Federal. O Brasil e o
Comércio Eletrônico. Brasília, abr. 2001. Disponível em: https://bit.ly/2kapBKK
Acesso em: 10 set. 2019.

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