Status Social: A Baliza para o Estabelecimento da Justiça

AutorBruno Milenkovich Caixeiro
Páginas25-88
Capítulo 1
StatuS soCial: a Baliza para o
estaBeleCiMento da justiça
1.1. O Direito grego e o surgimento da polis
Explorando a organização do poder em determinada localida-
de e tempo pela historiografia7, não se permite esquecer de alguns
fatores ou condições indispensáveis de existência para o seu exercí-
cio. Isso porque ponderam-se os valores já exercidos aos exercíveis,
tratando-se, portanto, de circunstâncias sociais, econômicas e po-
líticas a serem analisadas que impõem a produção do pensamento
que se narra adiante, tanto do transcurso do tempo, como do refle-
xo materialmente obtido por meio do resultado de sua expressão.
Implícito determinismo não pode ser levado ao “pé da le-
tra”. Destarte, não se pode negar sua influência. Segundo Assis
(2002, p. 53), as condições econômicas, a organização do poder
(condições políticas e sociais) e a produção cultural perfazem
o conjunto de fatores, culminantes em transformações, inexo-
ravelmente interconectadas que se influenciam mutuamente e
refletem sobre esse contexto8.
7 Entende-se que historiografia seja o estudo da história contada por meio de
grafos, isto é, pelo modo como ela foi contada por historiadores na interpre-
tação do transcurso do tempo; quanto à historicidade, esta seria a narração
de acontecimentos específicos, conforme a necessidade de sua produção pelo
uso da história, de modo que suas informações estariam gestadas e contadas
conforme a ordem daquilo que se pretendeu produzir (FONSECA, 2002).
8 Conforme Foucault (1999a, p. 27) sobre sua obra (referencial teórico des-
ta): “(...) as condições políticas e econômicas de existência não são um
véu ou um obstáculo para o sujeito de conhecimento mas aquilo através
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Para tanto, duas são as transformações do processo histó-
rico: as quantitativas e as qualitativas, e um modelo caracte-
rístico delas pode ser a polis, objeto indireto deste subtítulo,
considerando-se o status social. Pertinem-se, respectivamen-
te, ao aumento dos volumes e das proporções que podem ser
medidos (transformações quantitativas) e ao surgimento de
condições diferentes das anteriores, que, em suma, provocam
perturbação ou modificação da sociedade (transformações
qualitativas). Exemplo disso: o aumento populacional e o sur-
gimento de novas práticas sociais, além do domínio do saber
(Filosofia9), que os envolve respectiva e reciprocamente10.
Eis, então, o motivo para o estudo do Direito Grego11 e
do surgimento da polis e, ainda, de modo indireto, da Filosofia
(do Direito grego) enquanto razão: o surgimento simultâneo de-
do que se formam os sujeitos de conhecimento, por conseguinte as rela-
ções de verdade”, justificando que Nietzsche não pretendia em seus textos
restituir uma teoria do conhecimento, mas, sim, entender o problema da
formação de domínios do saber a partir das relações de força e políti-
ca na sociedade. Aliás, os “Foucaultianos” entendem ter ele passado por
momentos de desenvolvimento de pesquisas e de ideais epistêmicos: a)
sobre os saberes, em que procurou na história a gênese de alguns matizes
de seus interesses; b) sobre os poderes, em que analisou a evolução das
valorizações em relação ao materialismo histórico, desenvolvido por Karl
Marx; c) sobre o sujeito (de saberes e de poderes) que, na era moderna,
influencia(va)m as interpretações políticas, econômicas e, por conseguin-
te, jurídicas.
9 Segundo Revel (2005, p. 09), Foucault definia “problematização” como “um
exercício do pensamento que se opõe à ideia de uma pesquisa metódica
da ‘solução’, porque a tarefa da filosofia não é resolver – aí compreendida a
ação de substituir uma solução por outra – mas ‘problematizar’, não refor-
mar, mas instaurar uma distância crítica , fazer jogar o ‘desprendimento’”.
10 Não destoa deste entendimento Pozzoli (2001, p. 23).
11 Ferraz Jr. (2003a, p. 141) anota a preferência de tratá-lo como “Direito
Ático” por representar a florescência deste pensamento não somente na
região que hoje se denomina Grécia, mas por ser um fenômeno que tem
sua origem na chamada Grande Grécia, que se compunha também da Itá-
lia Meridional e da Sicília.
Ordenamento Jurídico Penal (Tributário) 27
les. Tal situação se revela mais claramente diante do domínio
apresentado pelas novas situações que emergiam na quais os
membros que compunham a polis passaram a viver.
Tudo se inicia com a crise12 da organização gentílica13,
quando se instaurou em seu seio o fortalecimento da proprie-
dade privada, culminando com o surgimento da polis, sendo
certo que, para que ocorresse esta evolução, foi necessária a
produção e a organização de um chamado excedente, elemen-
to fundamental da economia para a época que, muito embora
fosse muito rudimentar, serviu de mola propulsora para impri-
mir a evolução daquele povo.
Referido excedente veio a culminar na diferenciação dos
membros da organização no que tange às qualificações para
adquiri-lo, questionando-se pela contribuição oferecida ao co-
letivo, seja pela força, seja pelo conhecimento, respectivamen-
te vinculados aos guerreiros e aos anciãos, acentuando-se que
os últimos, no passado, também compuseram e representaram
força de manifestação e de defesa da organização.
Considerando-se o exposto, tem-se que a ruptura dos valo-
res coletivos anteriormente pregados e o aumento da comple-
xidade da vida social foram essenciais para o advento da polis,
posto que o mundo se tornava mais problemático pela própria
ampliação do horizonte de possibilidades e pelo aparecimento
constante de um universo mais amplo de alternativas de situa-
ções fáticas aos gregos.
12 O entendimento do termo, conforme sua própria razão, induz à com-
preensão de situações diferentes das convencionais e costumeiras que
garantem estabilidade e relativa segurança social quanto à expectativa de
normalidade e futuro, em que se demonstra, portanto, grande instabilida-
de dos fatos e situações advindas do aumento das complexidades sociais
do presente, em que a dúvida quanto às novas situações, resultantes das
iniciais, repita-se, provocam a chamada situação de crise, isto é, expecta-
tiva do estabelecimento de algo novo sem instabilidades.
13 Esta preconizava valores coletivos e um modo de produção autossuficiente.

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