O STF e a (in)constitucionalidade do funrural: construções jurídicas em um cenário de incertezas

AutorMarcela Cunha Guimarães e Felipe Montes Guerra
Páginas841-870
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O STF E A (IN)CONSTITUCIONALIDADE DO
FUNRURAL: CONSTRUÇÕES JURÍDICAS EM UM
CENÁRIO DE INCERTEZAS
Marcela Cunha Guimarães1
Felipe Montes Guerra2
1. Apresentação
Pretende-se com o presente artigo demonstrar o cenário
de completa insegurança jurídica instaurado por nossa Corte
Suprema a partir da mudança de posicionamento apresenta-
do nas decisões dos Recursos Extraordinários nº 363.852/MG
e nº 596.177 envolvendo a constitucionalidade do Funrural,
alterado no Recurso Extraordinário nº 718.874.
Busca-se, outrossim, demonstrar que a decisão do Supre-
mo Tribunal Federal proferida no Recurso Extraordinário
718.874 em 2017 não autoriza a cobrança da contribuição de
forma retroativa como tem sido feita pela Receita Federal.
1. Doutora e Mestre em Direito Tributário pela Pontifícia Universidade Católica de
São Paulo (PUC/SP). Professora de Direito Tributário da Universidade Federal de
Uberlândia (UFU) e do Instituto Brasileiro de Estudos Tributários (IBET). Advoga-
da na área tributária.
2. Pós-graduando em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tribu-
tários (IBET). Graduado em Direito pela Universidade Federal de Uberlândia
(UFU). Advogado na área tributária.
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IBET - INSTITUTO BRASILEIRO DE ESTUDOS TRIBUTÁRIOS
Para defender tal posicionamento, vale-se do método do
construtivismo lógico-semântico e, assim, partindo dos enun-
ciados prescritivos válidos no sistema positivo, notadamen-
te o princípio da legalidade estrita e o artigo 146 do Código
Tributário Nacional, os quais se afiguram enquanto limites
objetivos, que visam resguardar o sobre princípio da segu-
rança jurídica e boa-fé objetiva, mobiliza-se, a seguir, argu-
mentos amparados em construções normativas que alicerçam
o entendimento de que tal contribuição somente poderá ser
exigida, validamente, a partir da lei n° 13.606/2018, uma vez
respeitado o princípio da anterioridade.
Para chegar a tal conclusão, procedeu-se à análise de
todo arcabouço legislativo referente à instituição e à respon-
sabilidade do Funrural, construindo as normas respectivas
antes e depois das decisões proferidas pelo Supremo Tribunal
Federal e da Resolução nº 15 do Senado Federal.
2. Breve Escorço Legislativo e Jurisprudencial acerca da
Contribuição F unrural e a norma de Responsabi lidade
Deve-se aclarar que a contribuição “Funrural” encontra-
va-se prevista originariamente na Lei nº 8.212/913, texto pres-
critivo a partir do qual constrói-se a seguinte regra matriz de
incidência tributária:
3.
Art. 12. São segurados obrigatórios da Previdência Social as seguintes pessoas físicas:
(...)
V - como contribuinte individual:
a) a pessoa física, proprietária ou não, que explora atividade agropecuária ou pesqueira,
em caráter permanente ou temporário, diretamente ou por intermédio de prepostos e com
auxílio de empregados, utilizados a qualquer título, ainda que de forma não contínua;
b) a pessoa física, proprietária ou não, que explora atividade de extração mineral garimpo,
em caráter permanente ou temporário, diretamente ou por intermédio de prepostos e com
auxílio de empregados, utilizados a qualquer título, ainda que de forma não contínua;
(...)
Art. 25. A contribuição da pessoa física e do segurado especial referidos, respectivamente,
na alínea a do inciso V e no inciso VII do art. 12 desta lei, destinada à Seguridade Social, é
de:
I - dois por cento da receita bruta proveniente da comercialização da sua produção;
II - um décimo por cento da receita bruta proveniente da comercialização da sua produção
para financiamento de complementação das prestações por acidente de trabalho.

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