O STF e a regulação dos meios de comunicação social: a metalinguagem adotada pela Corte na decisão da ADPF 130/DF

AutorOona de Oliveira Cajú
CargoMestre em Ciências Jurídicas e Graduada em Direito pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB). É professora da Universidade Federal Rural do Semiárido (UFERSA), no Rio Grande do Norte, desde 2014 e coordenadora do Centro de Referência em Direitos Humanos do Semiárido, vinculado à UFERSA. Email: oona.caju@ufersa.edu.br.
Páginas93-124
O STF e a regulação dos meios de comunicação social ... (p. 93-124) 93
CAJÚ, O. de O.
O STF e a regulação do s meios de comunicação social: a me talinguagem adotada pela Corte na decisão
da AD PF 130/DF
.
Revista de Direito, Estado e Telecomunicações
, Brasília, v. 9, n. 1, p. 93-124,
maio de 2017. [DOI: https://doi.org/10.26512/lstr.v9i1.21515]
O STF e a regulação dos meios de comunicação social: a
metalinguagem adotada pela Corte na decisão da ADPF 130/DF
The Federal Supreme Court and the regulation of the social media: the
metalanguage adopted by the court in the decision of the ADPF 130/DF
Submetid o(
submitted
): 04/04/20 16
Oona de Oliveira Cajú*
Parecer(
revised
): 01/09/ 2016
Aceito(
accepted
): 23/01/2 017
Resumo
Propósito
Este artigo apresenta uma análise dos votos proferidos pelos ministros do
Supremo Tribunal Fede ral no jul gamento da ADPF 1 30/DF, quando foi declarada a não
recepção e m bloco da L ei de Imprensa , e, a partir dos elementos c onceituais extraído s da
construções argumentativa s das decisões, revela a metalinguagem sobre a qual a Corte,
majoritariamen te, sustenta suas conce pção acerca de regulação do setor da comunica ção
social.
Metodologia/abor dagem/design
A primeira seçã o do trabalho apresenta os paradigmas
teóricos mais influentes nas refle xões acerca da regula ção do setor da com unicação social
para, na seg unda seção, confrontá -los com os votos apresentados no julgame nto da ADPF
130/DF e extrair as sínteses conceituais orientador as dos ministr os, identificando o
paradigma reg ulatório do campo comu nicacional ao qual se al inham.
Resultados
Foi possível identi ficar que o discurso majoritário no STF sobre quest ões
regulatórias referentes ao setor da comunicação s ocial está mais próxima do paradigma
libertariano e s ua síntese de free flow of information .
Palavras-chav e: regulação da comunicação social, teorias libertária e democrática, fr ee flow
of information, self r eliance, liberdades de expressão e imprensa.
Abstract
Purpose
This article analyzes the votes utt ered by the Federal S upreme Court justices at
the trial of ADPF 130/ DF, in which it was denied value to the Press Law. It also tackl es the
reasoning behind the Court’s decision, which clarifies its con ception of re gulation of the
social media.
Methodology/approach/design
The firs t section of the arti cle presents the most influent
theoretical paradigms on the social media regulation . The s econd section confronts them
with vot es presented at the trial of the ADPF 130/DF and extract the guiding conceptual
syntheses of the justices, identifying the regula tory paradigm of communicational field to
which they al ign themselves.
*
Mestre em Ciências Jurídicas e Graduad a em Direito pela Universidade Fede ral da Paraíba
(UFPB). É pro fessora da Universidade Federal Rural d o Semiárido (UF ERSA), no Rio
Grande do N orte, desde 2014 e coor denadora do Centro de Referência e m Direitos
Humanos do S emiárido, vinculado à UF ERSA. Email: oona.caju@ufersa.edu.br.
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O STF e a regulação do s meios de comunicação social: a me talinguagem adotada pela Corte na decisão
da ADPF 130/DF
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Revista de Direito, Estado e Telecomunicações
, Brasília, v. 9, n. 1, p. 93-124,
maio de 2017. [DOI: https://doi.org/10.26512/lstr.v9i1.21515]
Findings
It was possib le to identify that the libe rtarian paradigm of free flo w of
informartion is the pred ominant mindset guiding the rulings conce rning social media in the
Federal Supre me Court.
Keywords: regulatio n of soci al media, liberta rian and democratic theories, free flow of
information, self relia nce, freedom of speech an d press.
1. Introdução
Em 2009, o Supremo Tribunal Federal (STF) realizo u julgamento da
Arguição de Descumprimento de Pr eceito Fundamental (ADPF) 130/DF, em que
o Partido Democrático Trabalhista (PDT) requeria a declaração de não recepção
da Lei nº 5.250/67 pela Constituição de 1988. A norma, conhecida como Lei de
Imprensa, estabelecia regramentos referentes à atividade de imprensa, censura
oficial, responsabilidades dos veículos jornalísticos e exercício do direito de
resposta.
Embora a Lei de Imprensa não se tratasse de marco regulatório da
comunicação social, os debates realizados na apreciação da ADPF 130/DF
abordaram diversos temas referentes ao campo comunicacional. As manifestações
dos ministros revelaram as compreensões sobre liberdades de expressão e de
imprensa, esfera pública de debate, o papel dos meios de comunicação na
sociedade e possibilidades regulatórias do Estado sobre a comunicação social,
dentre outros elementos em que embasaram suas decisões.
Neste trabalho, temos o objetivo de demonstrar esses elementos a partir de
um estudo analítico dos votos apresentados no julgamento. Iniciamos a primeira
seção com a apresentação dos paradigmas libertário, democrático, o free flow of
information e a self reliance como metalinguagem estruturante dos debates em
torno da regulação da comunicação social.
Na parte seguinte, analisamos o voto-condutor da decisão, proferido pelo
ministro Carlos Ayres Britto, e extraímos de suas construções argumentativas os
elementos que evidenciam a aproximação ou afastamento dos paradigmas
apresentados. O mesmo processo é realizado com os votos divergentes.
O julgamento da ADPF 130/DF foi a ocasião mais i mportante e m que o
STF debateu em plenário o tema da regulação dos meios de comunicação social e,
do conjunto conceitual tratado nos votos, foi possível extrair a metalinguagem
orientadora da decisão do Supremo e o paradigma regulatório do setor de
comunicação ao qual a Corte se filiou majoritariamente.
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O STF e a regulação do s meios de comunicação social: a me talinguagem adotada pela Corte na decisão
da AD PF 130/DF
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, Brasília, v. 9, n. 1, p. 93-124,
maio de 2017. [DOI: https://doi.org/10.26512/lstr.v9i1.21515]
2. Paradigmas influentes: a metalinguagem da regulação da
comunicação social
O fenômeno regulatório se fundamenta na necessidade de manutenção
constante do equilíbrio de atividades sociais em que se dão interações humanas.
Essa co mpreensão pressupõe que a dinâmica das trocas humanas é afetada por
fatores que podem gerar resultados não razoáveis e, dessa forma, afetar direitos
fundamentais, bases sobre as quais se sustentam as democracias contemporânea s.
Nessa pretensão, a atividade regulatória do Estado tem se transformado
desde as primeiras décadas do século XX, quando se i nicia a implementação do
modelo político de Estado de Bem Estar Social, aos dias de hoje, em que se
delineia o perfil do Estado Regulador.
A definição do campo d e atuação regulatória, bem como das políticas e
instrumentos de regulação q ue deve m ser construídos, dependerá da
metalinguagem que informa a compreensão de mundo incorporada pelo ente
regulador e pelo setor a ser regulado.
Desse modo, é possível vislumbrar os paradigmas aos quais as instituições
estatais (ou seus membros) se filiam a partir da observação das medidas que
adotam no exercício da atividade regulatória ou através da apreciação jurisdicional
acerca dela (como é o objeto deste estudo).
Para a comunicação social, que comporta o conjunto de direitos e
liberdades, individuais e coletivos, de manifestação do pensamento e expressão,
os paradigmas que fundamentalmente tem influenciado o setor são o libertário (ou
libertariano), derivado do liberalismo clássico; o democrático, elaborado a partir
das visões comunitaristas; o free flow of information, que incorporou o paradigma
libertário e o laissez faire como proposta para a regulação da comunicação global;
e a self reliance, derivada de reivindicações sociais e d a elaborações da economia
política da comunicação. Passamos a definir cada um desses referenciais e suas
principais proposições no tocante à atividade reguladora do Estado sobre o setor
da comunicação.
2.1. Teoria libertária e teoria democrática
Especialmente partir da tradição p olítico-filosófica estadu nidense, duas
correntes fundamentais1 se dividem quanto às possibilidades de regulação e
1
É c onhecida a disputa polí tica entre as conce pções liberal e comuni tarista, cujos
desdobrament os não ca bem no espaço deste trabalho. Ca da uma das correntes comporta
formulações específicas e, para uma visão ma is detalh ada, reco mendamos a leitur a do

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