Supremacia do negociado em face do legislado. a natureza bifronte (ou as faces) da nova CLT

AutorEnoque Ribeiro dos Santos
Páginas141-154
Supremacia do Negociado em
Face do Legislado. A Natureza Bifronte
(ou as Faces) da Nova CLT
enoque RibeiRo dos sanTos
Professor Associado da Faculdade de Direito da USP – SP. Desembargador do
Trabalho do TRT da 1ª Região – Rio de Janeiro. Mestre (UNESP), Doutor e Livre
Docente em Direito do Trabalho pela Faculdade de Direito da USP.
1. INTRODUÇÃO
O presente escrito tem por finalidade debater al-
guns aspectos relevantes da Lei n. 13.467/2017 perti-
nentes a um dos eixos centrais da reforma trabalhista
no Brasil – a supremacia do negociado em face da legis-
lação do trabalho e a percepção doutrinária que a CLT
passou a apresentar, com mais força, uma natureza bi-
fronte (ou bidimensional), ora refletindo o Direito Indi-
vidual, ora espelhando o Direito Coletivo do Trabalho,
como demonstraremos nas próximas linhas.
Como já tinha ocorrido com o microssistema tra-
balhista na Constituição Federal de 1988, os legislado-
res brasileiros foram buscar inspiração no Direito do
Trabalho Português, especialmente na recente Reforma
Trabalhista Portuguesa e as respectivas alterações pro-
movidas no Código do Trabalho Português, em 2003 e,
posteriormente, em 2009, replicando no Brasil virtual-
mente a maioria dos institutos implementados naquele
país-irmão, inclusive a adoção da dupla exegese em re-
lação à CLT – Consolidação das Leis do Trabalho.
2. NEGOCIAÇÃO COLETIVA COMO UM DOS
EIXOS SUBSTANCIAIS DA LEI N. 13.467/2017
E DA MEDIDA PROVISÓRIA N. 808/2017
Consoante o art. 2º da Convenção n. 154 da Orga-
nização Internacional do Trabalho (OIT), a convenção
coletiva do trabalho como o processo que compreende
todas as negociações que tenham lugar entre um em-
pregador, um grupo de empregadores ou uma organi-
zação ou várias organizações de empregadores, de uma
parte, e uma ou várias organizações de trabalhadores,
de outra parte, com o escopo de: a) fixar as condições
de trabalho e emprego ou; b) regular as relações entre
empregadores e trabalhadores ou; c) regular as relações
entre os empregadores ou suas organizações e uma ou
várias organizações de trabalhadores ou; d) alcançar to-
dos esses objetivos de uma só vez.
A negociação coletiva de trabalho pode ser con-
ceituada como um processo dialético por meio do qual
os trabalhadores e as empresas, ou seus representantes,
debatem uma agenda de direitos e deveres, de forma de-
mocrática e transparente, envolvendo as matérias perti-
nentes às relações entre trabalho e capital, na busca de
um acordo que possibilite o alcance de uma convivên-
cia pacífica, em que imperem o equilíbrio, a boa-fé e a
solidariedade.
Podemos sintetizar o conceito de negociação cole-
tiva de trabalho: processo dialético por meio do qual os
seres coletivos (sindicatos e empresas) discutem uma
pauta de reivindicações, devidamente homologada pela
Assembleia Geral respectiva, no sentido de estabelecer
novas condições de trabalho e de remuneração para as
respectivas categorias.
No caso brasileiro, a Constituição Federal de 1988
foi a primeira a tratar diretamente da negociação coleti-
va de trabalho em vários de seus dispositivos, reconhe-
cendo-a como direito dos trabalhadores (arts. 7º, XXVI
e 8º, VI). Antes de sua previsão na Constituição Federal
de 1988, a negociação coletiva de trabalho foi instituída
pelo Decreto n. 21.761, de 23 de agosto de 1932, sendo
posteriormente disciplinada no Decreto-lei n. 1.237, de
2 de maio de 1939, que também regulamentou a Justiça
do Trabalho e, finalmente, encontrou previsão na Con-
solidação das Leis do Trabalho (CLT) de 1943, que a re-
gulou de modo mais amplo em seus arts. de 611 a 625.

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