Suspensão condicional do processo: natureza jurídica

AutorMarcelo de Oliveira Milagres e Pablo Gran Cristóforo
Páginas158-182
PABLO GRAN CRISTÓFORO E MARCELO DE OLIVEIRA MILAGRES
158
Art. 89. Nos crimes em que a pena mínima cominada for igual ou inferior
a 1 (um) ano, abrangidas ou não por esta Lei, o Ministério Público, ao ofe-
recer a denúncia, poderá propor a suspensão do processo, por 2 (dois) a 4
(quatro) anos, desde que o acusado não esteja sendo processado ou não
tenha sido condenado por outro crime, presente os demais requisitos, que
autorizam a suspensão condicional da pena (art. 77 do Código Penal).
§ 1º Aceita a proposta pelo acusado e seu defensor, na presença do juiz,
este, recebendo a denúncia, poderá suspender o processo, submetendo o
acusado a período de prova, sob as seguintes condições
I – reparação do dano, salvo impossibilidade de fazê-lo
II – proibição de frequentar determinados lugares
III – proibição de ausentar-se da comarca onde reside, sem autorização do
juiz
IV – comparecimento pessoal e obrigatório a juízo, mensalmente, para infor-
mar e justicar suas atividades.
§ 2º O juiz poderá especicar outras condições a que ca subordinada a
suspensão, desde que adequadas ao fato e à situação pessoal do acusado.
§ 3º A suspensão será revogada se, no curso do prazo, o beneciário vier
a ser processado por outro crime ou não efetuar, sem motivo justicado, a
reparação do dano.
§ 4º A suspensão poderá ser revogada se o acusado vier a ser processo, no
curso do prazo, por contravenção, ou descumprir qualquer outra condição
imposta.
§ 5º Expirando o prazo sem revogação, o Juiz declarará extinta a punibili-
dade.
§ 6º Não correrá a prescrição durante o prazo de suspensão condicional do
processo.
§ 7º Se o acusado não aceitar a proposta prevista neste artigo, o processo
seguirá em seus ulteriores termos.
SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO: NATUREZA JURÍDICA
Na justiça penal consensual e na mesma lógica da transação penal, destaca-se
a suspensão condicional do processo.
Trata-se de instituto de natureza híbrida em que se suspende a relação processual
penal com a potencialidade de extinção de punibilidade. Como bem destacam Ada
Pellegrini, Antônio Magalhães Gomes Filho, Antônio Scarance Fernandes e Luiz
Flávio Gomes, “tem seu lado processual (porque implica o sobrestamento do feito)
EBOOK JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL.indb 158EBOOK JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL.indb 158 18/12/2020 08:34:2018/12/2020 08:34:20
JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL
159
e tem também sua face penal (porque esse sobrestamento pode levar à extinção da
punibilidade)”.1
A suspensão condicional do processo, denominada de sursis processual, não se
confunde com a suspensão condicional da pena, prevista nos arts. 77 a 82 do Código
Penal. Na suspensão condicional da pena, suspende-se a execução da própria pena
privativa de liberdade. Na suspensão condicional do processo, suspende-se a própria
persecução penal, evitando-se eventual condenação.
Discute-se sobre a natureza jurídica do sursis processual. Trata-se de direito
público subjetivo do acusado ou de medida despenalizadora atribuível ao titular
da ação penal?
Segundo o Superior Tribunal de Justiça (STJ), “a suspensão condicional do
processo não é direito público subjetivo do acusado, mas sim um poder-dever do
Ministério Público, titular da ação penal, a quem cabe, com exclusividade, analisar
a possibilidade de aplicação ou não do referido instituto, desde que o faça de forma
fundamentada” (HC 218. 785/PA, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, j. 04.09.2012).
Igualmente, já entendeu o Supremo Tribunal Federal (STF) que a suspensão
condicional do processo tem natureza de acordo processual, não existindo, portanto,
direito público subjetivo do acusado (HC 83.458/BA, Rel. Min. Joaquim Barbosa,
DJ de 6.2.2003).2
Com efeito, a suspensão condicional do processo não conf‌igura direito subjetivo
do acusado nem a sua proposição uma faculdade do titular da ação penal. Trata-se de
benefício legal fundado nos princípios da discricionariedade regrada e da autonomia
da vontade do acusado. O Ministério Público, em razão da mitigação do princípio
da obrigatoriedade da persecução penal, verif‌icando a presença dos requisitos do
sursis processual, tem o poder-dever de ofertar a proposta, cabendo ao acusado, em
face de sua autonomia, avaliar a conveniência – ou não – da aceitação.
Destarte, eventual e injustif‌icada negativa de proposta de suspensão condicional
do processo pode ser objeto de controle jurisdicional mediante a incidência, por
analogia, do instrumento do art. 28 do Código de Processo Penal.3
Segundo o verbete 696 da Súmula do Supremo Tribunal Federal (STF), “reu-
nidos os pressupostos legais permissivos da suspensão condicional do processo,
mas se recusando o Promotor de Justiça a propô-la, o Juiz, dissentindo, remeterá
a questão ao Procurador-Geral, aplicando-se por analogia o art. 28 do Código de
1. GRINOVER, Ada Pellegrini; GOMES FILHO, Antônio Magalhães; FERNANDES, Antônio Scarance;
GOMES, Luiz Flávio. Juizados especiais criminais. 2. ed. São Paulo: Ed. RT, 1997, p. 251.
2. Cf, também, RHC 115997/PA, Rel. Min. Cármen Lúcia, j. 12.11.2013.
3. ERESP 185.187/SP, Rel. Min. José Arnaldo Fonseca, j. 13.10.1999.
EBOOK JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL.indb 159EBOOK JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL.indb 159 18/12/2020 08:34:2018/12/2020 08:34:20

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT