Suspensão, interrupção e extinção do contrato de trabalho

AutorGeorgenor de Sousa Franco Filho
Páginas243-278
CAPÍTULO IX
SUSPENSÃO, INTERRUPÇÃO E EXTINÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO
1. SUSPENSÃO E INTERRUPÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO
1.1. CONCEITO E DISTINÇÃO
Tem o instituto da suspensão do trabalho a finalidade de promover, segundo Mário de La Cueva, la defensa
del trabajador contra ciertas circunstancias que podrian provocar la disolución de las relaciones(269), eis que se trata de
paralisação temporária de trabalho.
Não se deve confundir suspensão ou interrupção do trabalho, espécies do gênero paralisação temporária do
contrato de trabalho, com sua cessação. O primeiro caso, c’est une situation de droit que assure le maintien du contrat
en même temps qu’elle légitime l’inexécution des obligations suspendues(270). Na cessação, também chamada de termi-
nação, deixa de existir, definitivamente, qualquer liame entre as partes, desfazendo-se o contrato, mediante sua
rescisão, resolução ou resilição contratual.
Abrangendo as hipóteses nas quais existe paralisação temporária das atividades do trabalhador, a legislação
trabalhista brasileira dedica o Capítulo IV do seu título IV (Do contrato individual de trabalho) à suspensão e inter-
rupção do contrato. A doutrina estrangeira não faz distinção alguma entre as duas figuras, como se infere das obras
de Mário de La Cueva (México), Santoro-Passarelli (Itália), Couturier, Javillier, Rivero & Savatier e Lyon-Caen &
Pélisser (França), dentre outros.
De fato, a rigor a distinção não tem caráter substancial, dizendo apenas respeito aos seus efeitos e não ao seu
conceito jurídico(271). Poderia chamar-se suspensão total ou parcial, tendo o legislador brasileiro optado pela adoção
de interrupção para identificar o segundo caso(272).
São efeitos que servem de principal elemento diferenciador entre suspensão e interrupção. Cesarino Júnior
identifica, claramente, os diferentes efeitos que produzem as duas figuras:
consiste a suspensão na prestação de serviços pelo empregado, sem direito à percepção dos salários a que teria direito se
estivesse trabalhando, durante o período de suspensão. A interrupção do contrato de trabalho, ao contrário, importando
embora em não prestação de serviços pelo empregado durante algum tempo, não acarreta perda do direito à percepção
do salário, durante o tempo de interrupção(273).
Temos, então, que ambas se assemelham quanto ao fato de ocorrer paralisação temporária de trabalho, e en-
contramos duas situações distintas quanto aos seus efeitos.
(269) DE LA CUEVA, M. Ob. cit. (I), p. 234.
(270) COUTURIER, Gérard. Droit du travail. Paris: Presses Universitaires, 1990. p. 311.
(271) N. sent.: NASCIMENTO, A. M. Curso... cit. 24. ed., p. 379; e, Iniciação... cit., 33. ed., p. 220.
(272) N. sent.: SÜSSEKIND, A. L. et alii. Instituições... cit. (I). 16. ed. São Paulo: LTr, 1996. p. 484.
(273) CESARINO JÚNIOR, A. F. Ob. cit., p. 294.
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Curso de Direito do Trabalho
Georgenor de Sousa Franco Filho
Na suspensão do trabalho, os efeitos contratuais deixam, temporariamente, de existir. O trabalhador deixa de
executar suas tarefas habituais, e, consequentemente, fica impossibilitado de receber a contraprestação pecuniária.
Na interrupção, continua a existir a provisoriedade da cessação de atividades, mas seus efeitos são apenas parciais,
eis que, agora, subsiste a obrigação patronal de remunerar o trabalhador.
Liga-se intimamente à paralisação do trabalho o princípio da continuidade do contrato de trabalho. Para com-
preender este princípio, ensina Plá Rodriguez que,
devemos partir da base que o contrato de trabalho é contrato de trato sucessivo, ou seja, a relação de emprego não se
esgota mediante a realização instantânea de certo ato, mas perdura no tempo. A relação empregatícia não é efêmera, mas
pressupõe uma vinculação que se prolonga(274).
Assim, fatos que poderiam, normalmente, ensejar o rompimento do contrato de trabalho, apenas proporcio-
nam a sua paralisação temporária. E por quê? Porque –, e ainda é Plá Rodriguez quem doutrina:
tudo que vise a conservação da fonte de trabalho, a dar segurança ao trabalhador, constitui não apenas um benefício para ele,
enquanto lhe transmite uma sensação de tranquilidade, mas também redunda em benefício da própria empresa e, através dela,
da sociedade, na medida em que contribui para aumentar o lucro e melhora o clima social das relações entre as partes(275).
Feitas essas considerações, e conservando a distinção assinalada acima, entre suspensão e interrupção, pelo
seu caráter prático, vejamos as principais hipóteses existentes no Direito brasileiro.
1.2. HIPÓTESES DE SUSPENSÃO
São várias as hipóteses de suspensão do contrato de trabalho existentes na legislação brasileira. Examinemos
os casos mais relevantes e seus respectivos efeitos.
1.2.1. Auxílio-doença
Esse benefício previdenciário, que teve origem na Alemanha de Bismarck, é de curta duração e renovável sem-
pre que o segurado dele necessite, observando os arts. 59 a 64, da Lei n. 8.213, de 24.07.1991, que dispõe sobre
os Planos de Benefícios da Previdência Social.
No México, são causas expressas de suspensão das relações de trabalho a enfermidade contagiosa do trabalha-
dor, a incapacidade temporária ocasionada por um acidente ou enfermidade que não constituam risco de trabalho
(art. 42, I e II, da Ley Federal del Trabajo).
No Brasil, estando o trabalhador em gozo de auxílio-doença, o contrato de trabalho será considerado suspenso
durante o prazo do benefício, a partir do 16º dia, consoante dispõe o art. 476, da CLT, c/c o art. 71 do Regulamento da
Previdência Social (RPS), aprovado pelo Decreto n. 3.048, de 06.05.1999. Se o afastamento por doença demorar menos
de quinze dias, tratar-se-á de hipótese de interrupção, e o salário será pago pelo empregador (art. 75 do RPS).
A MP n. 664, de 30.12.2014, pretendeu ampliar o prazo de suspensão para trinta dias, mas, convertida na Lei n.
13.135, de 17.6.2015, esta norma não trouxe as modificações pretendidas pela MP, sendo mantida a regra anterior.
Assim, somente quando afastado por mais de quinze dias, estará o trabalhador gozando de benefício previ-
denciário, findo o qual deverá retornar ao serviço no prazo de trinta dias, salvo motivo justificado, sob pena de
configurar-se abandono de emprego, que é a falta grave ensejadora da ruptura da relação de emprego, ex vi do
art. 482, alínea
i
, da CLT, conforme o Enunciado n. 3, do TST.
Pode o auxílio-doença, ademais, transformar-se em aposentadoria por invalidez, cessando então (arts. 43 e 78
do RBPS).
1.2.2. Aposentadoria por invalidez
Trata-se de suspensão do trabalho decorrente de concessão de aposentadoria por invalidez ao trabalhador. Fica
suspenso o contrato de trabalho até que o obreiro recupere as condições que o afastaram da atividade laborativa,
(274) PLÁ RODRIGUEZ, A. Ob. cit., p. 138.
(275) Ibidem, p. 139.
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Parte I - Direito Individual do Trabalho
Capítulo IX – Suspensão, Interrupção e Extinção do Contrato de Trabalho
nos termos da legislação previdenciária, conforme o art. 475 consolidado. A Convenção n. 102, de 1952, da OIT,
cuida da matéria, que é o objeto do RPS (arts. 43 a 50).
Essa aposentadoria é devida ao segurado da Previdência Social, esteja ou não em gozo de auxílio-doença,
considerado incapaz para o serviço e insuscetível de reabilitação para desempenhar atividade que lhe garanta a
subsistência, devendo o benefício ser pago enquanto permanecer nessa condição (art. 43, da RPS).
No retorno, poderá ser dispensado, respondendo o empregador pelo ônus da dispensa imotivada (§ 1º do
art. 475 da CLT). Caso tenha admitido um empregado substituto, e este devidamente cientificado das condições
em que a substituição se originou, a volta do primitivo empregado ensejará a dispensa do último sem qualquer
indenização (§ 2º), exceto o direito a haver os depósitos existentes em sua conta vinculada de FGTS.
De acordo com a lei previdenciária, o prazo máximo de suspensão é de cinco anos (art. 47, I, da Lei
n. 8.213/1991), ficando o aposentado obrigado a, até completar 55 anos de idade, submeter-se a exames
médicos periódicos, tratamento adequado e /ou processo de reabilitação (art. 101 da Lei n. 8.213/1991, c/c
o art. 46 do RPS).
1.2.3. Serviço Militar e Encargo Público
O art. 472 consolidado remete à Lei n. 4.375, de 17.08.1964, cujos arts. 60 e segs. cuidam da matéria relativa
ao serviço militar.
O art. 472 da CLT possui a seguinte redação:
Art. 472. O afastamento do empregado em virtude das exigências do serviço militar, ou de outro encargo público, não
constituirá motivo para alteração ou rescisão do contrato de trabalho por parte do empregador.
§ 1º Para que o empregado tenha direito a voltar a exercer o cargo do qual se afastou em virtude de exigências do
serviço militar ou de encargo público, é indispensável que notifique o empregador dessa intenção, por telegrama ou carta
registrada, dentro do prazo máximo de 30 (trinta) dias, contados da data em que se verificar a respectiva baixa ou a ter-
minação do encargo a que estava obrigado.
§ 2º Nos contratos por prazo determinado, o tempo de afastamento, se assim acordarem as partes interessadas, não
será computado na contagem do prazo para a respectiva terminação.
§ 3º Ocorrendo motivo relevante de interesse para a segurança nacional, poderá a autoridade competente solicitar o
afastamento do empregado do serviço ou do local de trabalho, sem que se configure a suspensão do contrato de trabalho.
§ 4º O afastamento a que se refere o parágrafo anterior será solicitado pela autoridade competente diretamente ao
empregador, em representação fundamentada com audiência da Procuradoria Regional do Trabalho, que providenciará
desde logo a instauração do competente inquérito administrativo.
§ 5º Durante os primeiros 90 (noventa) dias desse afastamento, o empregado continuará percebendo sua remu-
neração.
O que ocorre é que, em nosso país, a prestação do serviço militar é obrigatória (art. 143, caput, da Constitui-
ção), o que torna necessário garantir ao trabalhador que, em cumprido esse dever, poderá retornar a sua atividade
normal. A esse fim, a Lei n. 4.375/1964 (art. 60, caput) atendeu o § 1º do art. 472 da CLT, ao garantir o retorno
do trabalhador, salvo se, quando da incorporação ou matrícula, houver declarado que não pretende retornar. Na
França, verifica-se semelhante situação, mas o empregador pode opor-se ao direito de reintegração do emprega-
do(276). Ocorrendo o engajamento do convocado, este perderá o direito de retornar ao emprego (§ 2º do art. 60 da
Trata-se do exercício de atividades específicas desempenhadas nas Forças Armadas (Marinha, Exército e Aeronáuti-
ca) e compreende, na mobilização, todos os encargos relacionados com a defesa nacional, sendo obrigatório a todos os
brasileiros nascidos entre 1º de janeiro e 31 de dezembro do ano em que completarem dezoito anos de idade.
O empregado que se afastar do trabalho em virtude das exigências do serviço militar não pode ter alterado
ou rescindido seu contrato de trabalho, desde que o responsável pela organização militar em que for incorporado
(276) Cf. JAVILLIER, Jean-Claude. Manual de direito do trabalho. Trad. Rita Asdine Bozaciyan. São Paulo: LTr, 1988. p. 101.

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