Técnicas em gestão estratégica de pessoas e os artifícios utilizados para a discriminação da mulher no momento da contratação: análise dos procedimentos de seleção adotados pelas empresas diante dos institutos protetivos do direito do trabalho brasileiro

AutorMaria Cecília Máximo Teodoro/Márcio Túlio Viana/Cleber Lúcio De Almeida/Sabrina Colares Nogueira
Páginas236-243

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Apresentação

Este trabalho inicialmente objetiva analisar o processo de seleção e contratação que indiretamente promove a exclusão da mulher no mercado de trabalho, buscando compreender possíveis intercepções dessas práticas com as leis trabalhistas de cunho protetivo. Para tanto, adianta-se a ética pouco inclusiva adotada por grande parte das empresas, ao passo em que se toma a hipótese de que as técnicas em Gestão Estratégica de Pessoas têm sido manipuladas em prol do empresariado, que dadas às vedações legais à discriminação, visando baratear os custos do negócio, de maneira dissimulada pretere as mulheres nos espaços empresariais, entendendo que a mão de obra feminina possui altos encargos trabalhistas. Apesar de nos últimos 30 anos ter-se notícia do avultoso e progressivo ingresso da mulher no mercado de trabalho, percebe-se que estas ainda obtêm salários em valores que chegam a 30% menos se comparados aos percebidos por homens ocupantes dos mesmos cargos. É nesse contexto, desejando fomentar debate sobre o tema e contribuir para o enfrentamento das lesões sistemáticas aos direitos das mulheres, que se pretende a partir do estudo das práticas de Gestão de Pessoas (questionários, dinâmicas de contratação, entre outros) avaliar lacunas que devem ser sanadas pelo ordenamento jurídico vigente. Para isso, lança-se mão de ampla pesquisa doutrinária e legislativa sobre o tema. A teleologia da ciência trabalhista ganha especial destaque, em momento em que se observa a necessidade em garantir proteções específicas às mulheres, na medida em que faticamente se desigualam dos homens, sem com isso, fazer com que o empresariado mantenha sua ética pouco inclusiva em função dos encargos. Os princípios de Igual-dade e Não Discriminação serão amplamente investigados, apontando-se que nessa releitura principiológica, juntamente à interdisciplinariedade que o tema requer, podem estar caminhos para coibir a discriminação e promover o acesso ao trabalho digno e de qualidade às mulheres.

1. Introdução

Mesmo que nos últimos 30 anos se tenha notícia da crescente abertura e acolhida do mercado para com as mulheres, ainda assim existem grandiosas disparidades salariais quando comparadas as mesmas atividades desempenhadas por homens e mulheres. No Brasil, essas disparidades se amostram ainda mais avultosas e alertam para um sistema pernicioso, pelo qual as normas protetivas são burladas pelas empresas, que em grande medida têm adotado posturas pouco inclusivas, entendendo que dadas às desigualdades formais garantidas as mulheres, tais como intervalos diferenciados, faltas justificadas, e licença-maternidade, os encargos trabalhistas advindos da mão de obra da mulher seriam demasiadamente caros, e por isso, impossíveis de serem arcados por empresas que desejam ser competitivas.

Disso, tem-se verificado algumas dissimulações nas técnicas em Gestão Estratégica de Pessoas, sobretudo nos processos de seleção e recrutamento, pelos quais as

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mulheres, principalmente mães, ou as que desejam constituir família, são induzidas a erro e preteridas para a maioria dos cargos de alto nível, e até mesmo são impedidas de acessar o mercado de trabalho formal.

Nesse panorama, tenta-se problematizar esse cenário excludente, buscando nos estudos do Direito do Trabalho brasileiro, sua principiologia e as abordagens teórico-conceituais possíveis no paradigma do Estado Democrático de Direito, assim como as possíveis articulações da questão trazida à baila com os estudos em Gestão Estratégica de Pessoas, fazer apontamentos sobre possíveis caminhos para a promoção de um mercado de trabalho mais inclusivo e que coadune com a pluralidade da sociedade contemporânea.

A interdisciplinaridade e uma abordagem afastada de perspectivas estreitas, se fazem o norte do presente estudo, na medida em que nos parece que a atual legislação trabalhista ao contrário de proteger as mulheres, talvez tenha as afastado de um futuro inclusivo. Contudo, isto não parece querer dizer sobre um Direito do Trabalho não protetivo ou que ignore as diferenças entre homens e mulheres, sejam elas biológicas ou estruturais. Em verdade, talvez na aproximação ou até mesmo equiparação das garantias trabalhistas entre homens e mulheres possa residir a potência necessária para a consolidação de uma sociedade mais justa e inclusiva, equiparação sempre para cima, é preciso dizer. Para tanto, em sede de conclusão exalta-se a necessidade de um Direito do Trabalho sensível à dinâmica social, e que na efetivação de seus princípios se consolide enquanto uma ciência de justiça social, pela qual a mulher possa viabilizar sua vida digna e qualificada.

2. Entendendo a gestão estratégica de pessoas

Ao adentramos no estudo sobre as possíveis manipulações das técnicas em gestão estratégica nos processos de seleção e recrutamento, em que se observa a manutenção de um vicioso processo de exclusão da mulher dos altos cargos corporativos e do próprio mercado de trabalho formal, antes de mais nada é preciso fazer alguns apontamentos sobre a seara do conhecimento em Gestão de Pessoas e as próprias técnicas advindas de sua forma estratégica.

A Gestão de Pessoas pode ser entendida como o controle e coordenação do trabalho das outras pessoas, em qualquer tipo de empreendimento, formal ou não, objetivando gerar produtos e/ou serviços (SILVEIRA; FILHO, 2013).

Ainda nessa abordagem, Silveira e Filho (2013) nos indicam algumas técnicas em Gestão de Pessoas que são comumente utilizadas em grandes empresas, essas técnicas:

  1. reconhecem a influência do ambiente externo sobre a dinâmica organizacional; b) reconhecem o impacto da competição entre organizações e as mudanças no mercado de trabalho; c) enfocam objetivos de longo prazo; d) valorizam o processo decisório e a escolha de alternativas; e) levam em consideração a relevância dos indivíduos nas organizações e não somente os altos executivos;

  2. buscam integrar as estratégias corporativas com as estratégias funcionais de cada área da empresa;

  3. buscam evidenciar as formas pelas quais a gestão de pessoas pode contribuir para o desempenho organizacional. (SILVEIRA; FILHO, 2013, p. 75.)

Essas técnicas devem ser compreendidas como uma ligação em que as pessoas e organizações buscam atingir e combinar seus interesses nas inter-relações pessoas-organizações-sociedade (LUCENA, 1999). Nessa esteira, com o passar dos anos e as mudanças na dinâmica social, inclusive dos próprios meios de produção, a Gestão de Pessoas inicia uma perspectiva estratégica, onde se alinham as técnicas de Gestão de Pessoas às estratégias de negócios da organização, visando um futuro de lucro e competitividade empresarial.

A Gestão Estratégia de Pessoas debruça-se sobre os ambientes internos e externos do corpo empresarial, os analisa e, a partir da situação encontrada, cria estratégias para tomadas de decisões no presente e que afetarão de forma positiva o futuro das empresas, significando lucro (SILVEIRA; FILHO, 2013).

Existem níveis hierárquicos na gestão e planejamento estratégico empresarial, destacando-se o seu nível corporativista, o nível da unidade de negócio, assim como as áreas ou processos funcionais. Esses níveis devem estar alinhados para a garantia de coerência e competitividade dentro da empresa (SILVEIRA; FILHO, 2013, p. 7). É nesse alinhamento que surgem técnicas na dinâmica empresarial, as quais entendemos que muitas das vezes têm sido deturpadas em busca de um lucro à custo social, como no caso da exclusão da mulher do ambiente empresarial.

Nesse sentido, é necessário esforço para a compreensão dos procedimentos da Gestão Estratégica de Pessoas, na medida em que se tenta verificar a correlação das fissuras dos instrumentos atualmente disponíveis com a visível manutenção da exclusão da mulher do mercado de trabalho formal, e principalmente, dos cargos considerados de alto nível nas grandes corporações.

Dentro da organização empresarial são diversas as funções que competem às disciplinas teóricas e práticas da Gestão Estratégica de Pessoas, dentre as quais, destacam-se a análise de cargos e atividades, organograma de cargos, plano de cargos e salários, incentivos e benefícios e comunicados. Além disso, ressaltam-se as técnicas que são especialmente caras à investigação que se pretende neste estudo, isto é, recrutamento e seleção, admissão, integração, orientação, treinamento, e desenvolvimento de pessoas dentro do corpo empresarial (CHIAVENATO, 1999).

Tem-se aqui a necessidade em analisar os procedimentos de recrutamento e seleção adotados pelas empresas diante dos institutos protetivos do Direito Laboral brasileiro, afinal, o acesso da mulher no mercado de trabalho, ainda que crescente, tem se mostrado dirimido pela manutenção do baixo ingresso nos altos cargos, ou ainda na própria exclusão do trabalho formal. É uma inclusão excluída, sempre a margem.

2.1. Os processos de recrutamento e seleção e a discriminação indireta

Das técnicas da Gestão Estratégica de Pessoas, iremos adentrar nos processos de seleção e recrutamento, os quais, nos parecem ser dentre as demais técnicas, os principais

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obstáculos para a definitiva e qualificada inclusão da mulher no meio empresarial.

O processo de recrutamento refere-se a busca por colaboradores internos que se adequam ao novo perfil procurado para preenchimento da vaga aberta. Já a seleção trata-se de um processo...

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