Teoria da corrupção

AutorCalil Simão
Ocupação do AutorDoutorando em Direito pela Universidade de Coimbra (PT). Mestre em Direito
Páginas35-43

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1 Do poder

O léxico Aurélio define a palavra “poder” como sendo o verbete que designa uma faculdade, possibilidade, autorização, ou, ainda, um meio, uma força ou capacidade, entre outros atributos. Tal vocábulo é derivado do verbo latino “posse”¸ tendo sido empregado no mundo jurídico como símbolo de capacidade e força1. É corriqueiramente utilizado como verbo e também como substantivo. Como verbo, é empregado no sentido de autorização ou faculdade. Como substantivo, o vocábulo é empregado para indicar o dominador ou o detentor de posse.

Entretanto, sua utilização como verbo ou substantivo sempre importa em indicar uma posição de competência. Poder também sempre indica uma posição de subordinação, já que a ideia de poder conduz à ideia de sucumbência.

Em cada ramo do saber o conceito de poder recebe um significado distinto, contudo, é um conceito que tem origem na competência. Em vista disso, a sociologia também o define como sendo a habilidade de impor vontades.

Max Weber nos assinala que “poder significa la probabilidad de imponer la propia voluntad, dentro de una relación social, aun contra toda resistencia y cualquiera que sea el fundamento de esa probabilidad”2.

É bem verdade que, de maneira geral, poder representa um fenômeno social decorrente de uma relação entre pessoas, especialmente favorecido pelo elemento força. Força nas suas mais variadas formas: força política, força econômica e força psicológica, por exemplo.

No Direito, especialmente no Direito Público, a expressão poder designa o órgão ou a instituição investida de soberania. Soberania, portanto, é a manifestação do poder do Estado. É apenas uma modalidade de poder, consistindo este um conceito amplo, gênero do qual soberania é espécie.

Enfim, para a Teoria do Estado, o termo poder traduz um “veículo instrumental através do qual se alcança uma ordem social que, representando uma idéia conceitual de direito, busca finalisticamente o bem comum”3.

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2 Da corrupção

O poder, portanto, representa uma necessidade humana. Contudo, como bem afirmou o cientista político Lord Acton: “o poder tende a corromper – e o poder absoluto corrompe absolutamente”. Isso significa que o Poder é necessário, mas também perigoso. Esse equilíbrio é uma busca constante de qualquer sociedade moderna.

A autoridade política, nas sociedades humanas, em função apenas e tão somente de sua existência, tende a danificar as relações entre seres inicialmente dotados de igualdade.

É importante frisar, também, que é impossível falar em improbidade administrativa sem conhecer exatamente o conceito de corrupção.

Em razão disso, iniciamos nosso estudo dimensionando a teoria da corrupção, e nesse mister nos valemos das lições de Patrick Dobel (The Corruption of a State)4, entre outros tantos sociólogos e políticos que marcaram época.

Tudo começou no fim da pré-história e começo da história, mais especificamente no período denominado de Mesolítico, quando o homem, ao desenvolver técnicas de produção, sente a necessidade de se agrupar para atingir um objetivo maior.

Já neste período a necessidade de uma pessoa na gerência da coletividade é percebida. Surge, então, a figura do Administrador. Posteriormente o administrador foi ganhando roupagem distinta, bem como suas atribuições foram crescendo cada vez mais.

Uns seres humanos, como é natural no mundo da evolução das espécies, evoluíram mais rapidamente que outros. Essas pessoas foram se destacando entre seus pares até culminar no que se chamou de líderes. Ser líder era ter uma grande parcela de responsabilidade, mas também, de poder. O termo “poder” surge para representar um estado de superioridade ou força.

Rapidamente o poder foi se revelando como um atributo de dominação, ou seja, quem detinha o poder era considerado uma autoridade dominante. Com o passar dos tempos o poder foi ganhando contornos interessantes. Chegou-se até a se sustentar uma multiplicidade de poderes, pois de um lado tínhamos a Igreja, de outro os Reis, e, ainda, a Nobreza.

Todos, a bem da verdade, queriam o poder. Mas quem conferia o poder? A quem pertencia o poder? A busca a essas respostas levaram a grandes debates intelectuais, e, até mesmo, a importantes conflitos físicos.

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É realmente fácil de perceber que poder também pode significar vantagens ou benefícios. Algumas pessoas entenderam assim e passaram a utilizar o poder para alcançá-los.

O termo corrupção, desse modo, passou a significar o ato de desvirtuamento ou de degradamento de uma regra socialmente ativa. Ou seja, o conceito de corrupção só existe porque existe um conceito antônimo. Eis a situação de fato que representa o termo honestidade. Um ser honesto é um ser decente, que age ou se omite conforme a regra geral ensina.

Patrick Dobel afirma que a corrupção dos Estados e a corrupção dos indivíduos andam lado a lado. Defende o autor que a corrupção do indivíduo e do Estado não poderiam ser combatidas isoladamente. Realmente, a corrupção do Estado representa a corrupção dos indivíduos que o compõem. É o que passaremos a analisar a seguir.

Sobre o tema, transcrevemos uma passagem da obra de Rui Barbosa:

A corrupção gravemente perniciosa é a que assume o caráter subagudo, crônico, impalpável, poupando cuidadosamente a legalidade, mas sentindo-se em toda a parte por uma espécie de impressão olfativa, e insinuando-se penetrantemente por ação fisiológica no organismo, onde vai determinar diáteses irremediáveis. Quando sai do poder um governo dos que cultivam esse gênero de corrupção, a herança de interesses ilegítimos que ele semeou, tem deitado no solo raízes reprodutivas, que consumirão os mais estrênuos esforços e as mais heróicas intenções do seu sucessor, em longo, ingrato e muitas vezes improfícuo trabalho de escalrachar.5Aponta corretamente o autor citado que a corrupção perigosa é aquela que se desenvolve em um ambiente aparentemente saudável, pois assume caráter subagudo e impalpável, com vestes de legalidade quando, na verdade, está fisiologicamente impregnada no organismo, contaminando todas as suas ações.

2. 1 Corrupção social

A corrupção, é um fenômeno social. Se o Estado é corrupto é porque a socie-dade também o é. O Estado, portanto, representa a sociedade em seus mais variados aspectos, inclusive nos aspectos negativos. Isso também significa que os elementos da corrupção variam entre as...

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