Terceirização e trabalho temporário: Lei n. 13.429 e as alterações da Lei n. 13.467/2017

AutorCélio Pereira Oliveira Neto
Páginas411-418

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Ver Nota1

1. Introdução

Antes da Lei n. 13.429, de 31 de março de 2017, não havia norma legal no cenário nacional a tratar da terceirização em geral; apenas regulamentação no que se refere ao trabalho temporário (Lei n. 6.019/74), e aos serviços de vigilância e de transporte de valores (Lei n. 7.102/83).

Todavia, ao juiz não é dado eximir-se de julgar na ausência de regra legal, valendo-se, pois, de outras fontes do direito para a entrega da prestação jurisdicional. Neste cenário, a jurisprudência consolidou-se, por meio da Súmula n. 331 do TST, que entendia por válida a contratação de serviços de vigilância, conservação e limpeza, bem como serviços ligados à atividade-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e subordinação.

O enunciado da Súmula n. 331 acabou por criar uma distinção entre atividade-meio e atividade-fim, vedando que a empresa contratasse junto ao terceiro a realização do seu core business. O problema é que não há clareza na diferenciação e nem uma regra a esclarecer o que é atividade-meio e o que é atividade-fim.

Operações simples já geravam dúvida, do que é exemplo a colheita da laranja no pomar para uma indústria de sucos de laranja, ou a atividade de callcenter em uma empresa de telefonia. E o cenário de insegurança tinha tudo para ser agravado quanto a essa imprecisão de distinção entre atividade-meio e atividade-fim, mormente diante das novas tecnologias e formas de produção atinentes à 4ª Revolução Industrial.

Nesse contexto, em março do corrente ano, foi editada a Lei n. 13.429, que trata de dois temas, que não se confundem. O primeiro é o trabalho temporário e o segundo é a empresa prestadora de serviços a terceiros. Tal se extrai logo do art. 1º da Lei n. 6.019/74 (fruto da Lei n. 13.429) que claramente dispõe: “as relações de trabalho na empresa de trabalho temporário, na empresa de prestação de serviços, e nas respectivas tomadoras regem-se por esta lei”. Destarte, o presente artigo segue a mesma ótica, tratando incialmente do trabalho temporário, para após enfrentar as questões da terceirização em geral.

Antes de iniciar a abordagem do trabalho temporário, por opção didática, observa-se que ao invés de usar a expressão “contratante” de que trata a Lei n. 13.429, visando maior clareza, faz-se a opção neste artigo pelo uso da palavra “tomador”, a fim de designar aquele que toma o serviço, contrata o serviço de outrem.

2. Trabalho temporário

Quando se trata de trabalho temporário, a relação é tripartite, na medida em que, diante da necessidade de mão de obra, a empresa tomadora2 firma contrato com a empresa de trabalho temporário a quem cabe recrutar, selecionar, contratar e colocar o trabalhador temporário à disposição de uma empresa tomadora dos serviços.

A contratação é realizada não só com prazo determinado, mas especialmente com o escopo de que o trabalhador seja inserido em determinada empresa/tomadora, para atender à situação legal também preestabelecida.

Na prática diuturna, de forma lícita, o trabalhador fica sujeito ao comando de serviços por parte do tomador que o dirige na realização dos trabalhos, em atividade produtiva, no objeto da contratação.

2.1. Forma, requisitos e hipóteses de contratação

Consoante se extrai do art. 4º da Lei n. 6.019/74, empresa de trabalho temporário é a pessoa jurídica, obrigatoriamente registrada perante o Ministério do Trabalho e Emprego, que possui a função de colocar trabalhadores à disposição de outras empresas contratantes.

Nota-se que a contratação de serviços ocorre por meio da empresa de trabalho temporário, que a seu turno, não exerce atividade produtiva, apenas faz esta intermediação da contratação de mão de obra.

Nesse contexto, e nos termos do art. 2º da Lei n.
6.019/74, o trabalho temporário é prestado por uma

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pessoa física, contratada por empresa de trabalho temporário, que o coloca à disposição de uma empresa tomadora dos serviços, para atender a necessidade de substituição transitória de pessoal permanente ou à demanda complementar de serviços.

Do contrato entre a empresa de trabalho temporário e a tomadora de serviços, a teor do art. 9º da Lei n. 6.019/74, deve ser consignada a qualificação das partes, o motivo justificador da contratação3, prazo e valor da prestação de serviços, além de disposições sobre segurança e saúde do trabalhador.

O art. 2º da Lei n. 6.019/74 foi modificado, de modo a ampliar as hipóteses de contratação de trabalho temporário. Antes da Lei n. 13.429/17, estava autorizada a contratação para atender a necessidade transitória de substituição de pessoal regular e permanente, ou em razão de acréscimo extraordinário de serviços.

Com a nova lei, manteve-se a primeira possibilidade intocada, e ampliou-se a segunda conjetura. Com efeito, no lugar de acréscimo extraordinário de serviços, o legislador usou a expressão “demanda complementar de serviços”, cuja definição consta do art. 2º, § 2º da Lei n. 6.019/74, como: “oriunda de fatores imprevisíveis ou, quando decorrente de fatores previsíveis, tenha natureza intermitente, periódica ou sazonal”.

Assim, e em apertada síntese, pode ser contratado o trabalho temporário em duas hipóteses. A primeira, que não sofreu qualquer alteração na nova legislação, diz respeito à substituição transitória de pessoal permanente, do que são exemplos: a contratação para substituir empregados somente durante as férias destes; a contratação para substituir temporariamente empregada em licença-mater-nidade; ou a temporária substituição de empregado em decorrência de afastamento previdenciário.

A segunda hipótese, relativa à demanda complementar de serviços, é desdobrada em outras duas: a) a proposição que representa efetiva ampliação do regime diz respeito à contratação decorrente de fatores imprevisíveis, entendidos como tais os gerados por fatos extraordinários (provocados pela natureza ou pela atuação humana) sem que se tenha a capacidade de pressenti-los e de se preparar para que não ocorram, tal como o caso fortuito e a força maior, de que são exemplos fenômenos da natureza (v. g. tempestade, furacões, enchentes) ou fatos humanos (v. g. guerras ou revoluções); b) a outra hipótese diz respeito à contratação decorrente de fatores que, ainda que previsíveis, possuem natureza intermitente, periódica ou sazonal.

No caso, por intermitente entenda-se o trabalho que não é contínuo; por periódico aquele em que a contratação se faz necessária em períodos; e por sazonal aquele que decorre de fatos que ocorrem de acordo com a sazonalidade, de que é exemplo o aumento de demanda em datas festivas.

2.1.1. Greve

O art. 2º, § 1º da Lei n. 6.019/74 é expresso ao vedar a contratação de trabalho temporário para a substituição de trabalhadores em greve. Todavia, tal dispositivo legal, ao final, parece excepcionar a regra, ao enunciar: “salvo nos casos previstos em lei”.

A disposição em tela, faz, pois, remissão à lei que regulamenta o exercício do direito de greve. A Lei n. 7.783/89, a seu turno, em seu art. 9º, dispõe acerca do acordo entre entidades sindicais ou entre empregador e entidade representante dos trabalhadores, para efeito de manutenção de equipes em atividade visando assegurar que a paralisação dos serviços não gere prejuízos irreparáveis4.

Caso não haja acordo, assegura-se ao empregador, nos termos do parágrafo único5, enquanto perdurar a greve, o direito de contratar diretamente os serviços necessários para que não ocorra a deterioração irreversível de bens, máquinas e equipamentos, assim como a manutenção do maquinário e equipamentos, essenciais para a retomada das atividades ao final da greve.

Pois bem, considerando que a norma que regula o exercício do direito de greve prevê hipótese de contratação direta pelo empregador, combinado ao fato de que a Lei
n. 6.019/74, com as alterações da Lei n. 13.429/17, faz remissão aos casos previstos para a contratação de trabalhadores em greve, quer se acreditar ter sido autorizada a contratação de trabalho temporário na hipótese do parágrafo único do art. da Lei n. 7.783/89.

Contudo, em princípio, o mesmo raciocínio não se pode fazer no que tange à contratação de trabalhadores para

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manutenção das atividades essenciais de que trata o art. 10 da Lei n. 7.783/896, na medida em que o dispositivo legal em referência enuncia que cabe ao Estado tomar as medidas necessárias para a manutenção das atividades essenciais.

2.2. Responsabilidades, obrigações e prazos

A teor do art. 9º, § 1º da Lei n. 6.019/74, é da empresa tomadora a responsabilidade por garantir as condições de segurança, higiene e salubridade do trabalhador, tanto quando o trabalho for realizado em suas dependências, quando o for em local por ela designado.

Consoante se extrai do art. 9º, § 2º, a empresa tomadora dos serviços não poderá fazer distinção entre o trabalhador temporário e o empregado da tomadora, devendo prestar o mesmo atendimento médico, ambulatorial e de refeição, nas dependências da empresa ou em local por ela designado.

A remuneração do trabalhador temporário tem de ser idêntica à do empregado da tomadora dos serviços que exerça a mesma atividade, conforme se infere do art. 12 da Lei n. 6.019/74, que não sofreu qualquer alteração com a lei editada em março do corrente ano.

Na forma do art. 10 da Lei n. 6.019/74, o contrato de trabalho temporário pode ser firmado pelo período de cento e oitenta dias (consecutivos ou não), sendo passível de serem acrescidos mais noventa dias (consecutivos ou não), desde que comprovadamente mantidas as mesmas condições que ensejaram a...

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