Termo de ajustamento de conduta

AutorRaimundo Simão de Melo
Ocupação do AutorAdvogado e Consultor Jurídico
Páginas105-165

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1. Considerações preliminares

O Termo de Ajuste de Conduta (TAC), regulado pelo § 6º do art. 5º da Lei n.
7.347/85 (acrescentado pela Lei n. 8.078/90 — CDC), tem a sua origem no art. 55, parágrafo único da Lei n. 7.244/84 — Lei de Pequenas Causas — que conferiu ao acordo extrajudicial, celebrado entre as partes e referendado pelo Ministério Público, natureza de título executivo extrajudicial.

Esse instrumento propicia maior agilidade e efetividade dos negócios jurídicos relativos aos direitos e interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos, notadamente no que respeita às relações de consumo, evitando a ação judicial de conhecimento quando os interessados estiverem de acordo quanto à solução extrajudicial do conflito1.

Se a sua utilização é importante nas relações de consumo, maior ainda tem- -se mostrado no âmbito das relações de trabalhos, como se constata pela experiência diária, pois aqui a conflitualidade é grande por conta do desrespeito aos direitos dos trabalhadores.

Ao Ministério Público do Trabalho, como instituição indispensável à função jurisdicional trabalhista, incumbem as atribuições cometidas pela Constituição Federal (art. 127 e seguintes), de defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis da sociedade. À sua disposição, para o cumprimento dessas importantes atribuições, colocaram-se instrumentos necessários e eficazes, como o Inquérito Civil, a Ação Civil Pública, o Termo de Ajuste de Conduta, entre outros, também no âmbito trabalhista (arts. 129, inciso III, da CF; 5º, §§ 6º e 8º, da Lei n. 7.347/85; 83, inciso III, e 84, inciso II, da Lei Complementar n. 75/93).

2. Finalidade

Com a criação do Termo de Ajuste de Conduta, o Inquérito Civil passou a ter dupla função:

  1. a obtenção de elementos de convicção para o ajuizamento da Ação Civil Pública;

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  2. a busca de assinatura de ajuste de conduta, com extraordinário e rápido benefício para a coletividade.

    A ação civil correspondente fica como remédio último, pois, por mais rápida que seja a sua tramitação, o resultado, além de duvidoso, será mais demorado, considerando-se que o Poder Judiciário trabalhista, a exemplo dos demais ramos do Judiciário, é lento e caro.

    Desse modo, quando não se obtém a concessão de uma liminar de cunho preventivo, em certos casos, a ação chega a perder o seu objeto, pela ineficácia do provimento que vier a ser dado, depois de certo tempo. Imagine-se a hipótese, não rara, de determinada empresa que não cumpre as normas mínimas de segurança e medicina do trabalho, acarretando, com isso, inúmeros acidentes de trabalho e, mesmo diante da demonstração do perigo iminente, o juiz não acolhe pedido liminar de interdição da atividade, remetendo a sua análise para o julgamento final da ação. Até lá, muitos trabalhadores já morreram ou ficaram inválidos, com prejuízos, agora, irreparáveis. Daí a inestimável importância do ajuste de conduta extrajudicial, pelo qual se obtém a solução imediata, consensual e não onerosa da questão.

    Outra vantagem é que o cumprimento do compromisso assumido será de maior aceitação pelo inquirido, em comparação com uma decisão judicial imposta pelo Poder Estatal.

    A finalidade principal do Termo de Ajuste de Conduta é, pois, buscar o cumprimento da ordem jurídica de forma espontânea, simples, barata e rápida, sem custo para o Estado, além de contribuir para o desafogo do moroso Judiciário.

    Na abalizada lição de Celso Fiorillo, Marcelo Abelha e Rosa Maria Andrade Nery, “ao contrário do que se possa imaginar, o compromisso de ajustamento de conduta não se configura como óbice ao princípio do pleno acesso à Justiça, mas, ao contrário, uma forma de efetivá-la. A nosso ver, o compromisso de ajustamento de conduta, como o próprio nome sugere, é um meio de efetivação da tutela dos direitos coletivos, à medida que evita o ingresso em juízo (e, portanto, todos os reveses que isso possa significar à tutela efetiva) para que se consiga o ajuste de conduta, por exemplo, de uma empresa poluidora às exigências legais”2.

    Com efeito, o Ministério Público, estrutura compatível com a defesa de direitos difusos e coletivos, deve evitar o dano ou o litígio, antecipando, via desse instrumento, a adequação da conduta dos infratores à lei porque outra importante finalidade a ser cumprida pelo compromisso de ajustamento de conduta é a de prevenir o litígio. A composição prévia desobstrui as vias judiciais, severamente congestionadas, e a força de título executivo extrajudicial, que a lei lhe atribui, permite reduzir consideravelmente a duração e o ônus da demanda, uma vez que elimina a fase do conhecimento3.

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    Com relação aos interesses e direitos trabalhistas, apresenta-se o Termo de Ajuste de Conduta como importante instrumento de efetivação do Direito do Trabalho, sendo indiscutível, por exemplo, a necessidade de efetividade da defesa do meio ambiente e da saúde do trabalhador porque o bem em discussão é a própria vida, que não pode esperar por demoradas soluções advindas do Poder Judiciário, muitas vezes desfavoráveis por incompreensão dos novos institutos processuais.

    No Inquérito Civil n. MPT n. 08145-0258/99-9 (PRT da 15ª Região), sob a presidência do Procurador do Trabalho Ronaldo José de Lira, foi tomado um compromisso de ajustamento de conduta que bem ilustra a sua importância e finalidade na área laboral4.

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    O ajustamento de conduta cumpre importante papel até mesmo na busca de feitura de leis, como ocorreu no Estado de São Paulo, no setor da agroindústria da cana em relação aos alojamentos dos trabalhadores. Foi aprovada a Lei n.
    13.559/09, cujo art. 2º diz que “Todas as pessoas jurídicas e físicas que mantêm no Estado empregados rurais contratados para trabalhos em tempo determinado ou indeterminado e que tenham trabalhadores residindo em alojamentos ou moradias deverão, obrigatoriamente, requerer à Secretaria da Saúde do Estado autorização para a utilização do local para esta finalidade”, obrigando, assim, a Secretaria Estadual de Saúde a fazer a vistoria prévia desses alojamentos destinados à moradia dos trabalhadores rurais.

    A proposta dessa lei surgiu a partir de acordos firmados pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) com Prefeituras do interior de São Paulo. Os termos de compromisso, assinados por várias Prefeituras do interior do Estado, chamaram a atenção para o problema das irregularidades nas moradias rurais, por falta de condições de higiene e segurança dos moradores, pelo que as Secretarias Municipais de Saúde, por meio das Vigilâncias Sanitárias, se comprometeram a fiscalizar as condições sanitárias desses alojamentos e moradias rurais de cortadores de cana, antes de conceder a autorização de funcionamento.

    O procurador do trabalho Mário Antônio Gomes, que tomou os ajustamentos de conduta, expôs o seu conteúdo em palestra perante a Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa, tendo o deputado Simão Pedro (PT) se inspirado nas soluções e apresentado projeto que se transformou em lei, a qual obriga o Poder Público a observar, durante a vistoria, os requisitos constantes das Portarias e normas regulamentadoras dos Ministérios da Saúde e do Trabalho, bem como as demais normas legais específicas relacionadas aos alojamentos.

2.1. O termo de ajuste de conduta como implementador do diálogo social

É importante ressaltar que esse novo instrumento de defesa dos direitos e interesses metaindividuais trabalhistas tem, na prática, servido também para implementar o diálogo social entre empregados e empregadores o que, na esfera trabalhista, é muito bem-vindo no momento em que passa o nosso sistema de relações de trabalho por transformações que requerem, como estrutura de susten-

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tação, o desenvolvimento da negociação coletiva como instrumento democrático entre capital e trabalho.

Na verdade, a maioria das denúncias de irregularidades trabalhistas perante o Ministério Público é feita pelos sindicatos profissionais, que, assim, são chamados a acompanhar as investigações e...

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