Terra, territória e América Latina: o desafio de cultivar a esperança

AutorGilberto de Souza Marques
CargoDoutor pelo Programa de Pós-Graduação de Ciências Sociais em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (CPDA/UFRRJ)
Páginas439-446
DOI: https://doi.org/10.1590/1982-02592021v24n3e83160
EDITORIAL
439
R. Katál., Florianópolis, v.24, n. 3, p. 439-442, set./dez. 2021 ISSN 1982-0259
Este é um artigo publicado em acesso aberto (Open Access) sob a licença Creative Commons Attribution Non-
Commercial, que permite uso, distribuição e reprodução em qualquer meio, sem restrições desde que sem fins
comerciais e que o trabalho original seja corretamente citado.
Terra, território e América Latina: o desafio de cultivar
a esperança
Gilberto de Souza Marques1
https://orcid.org/0000-0003-0400-1337
1Universidade Federal do Pará, Instituto de Ciências Sociais Aplicadas, Programa de Pós-graduação em Economia, PA, Brasil
Enquanto este número da Revista Katálysis já estava sendo elaborado, algo acontecia em
Jacareacanga, Sudoeste do Pará, fronteira com Amazonas e Mato Grosso. No dia 26 de maio de 2021 um
áudio começou a circular nas redes sociais locais e logo alcançou outras regiões: “Chegaram na minha
casa. Vão queimar tudo aqui. Um grupo muito grande”. A voz era de Maria Leusa Munduruku, liderança
indígena, que, para defender o território de seu povo, enfrenta madeireiros, fazendeiros e, recentemente,
principalmente garimpeiros ilegais. A casa de sua família foi queimada. Tiros foram disparados, mas
Maria Leusa conseguiu se proteger.
Antes de rumar para a aldeia, os garimpeiros já haviam enfrentado a polícia federal que estava no
município para combater garimpo ilegal de ouro. Tentaram expulsar o contingente da PF e Ibama que
estava na cidade. Em 2020, em Jacareacanga havia sido promovido o “dia do fogo”, em que proprietários
rurais e grileiros organizaram para tocar fogo em grande quantidade na floresta.
Em Roraima, entre 10 de maio e meados de junho de 2021, indígenas da Terra Yanomami sofreram
pelo menos 23 ataques de garimpeiros, que usaram bombas de gás, fuzis e outros armamentos.
Os atentados em Jacarecanga e Roraima são a expressão do momento político que o Brasil atravessa,
onde o Presidente da República estimula grileiros e garimpeiros a destruírem as florestas e seus povos.
Em 2020, o Pantanal sofreu com incêndios muito intensos, fazendo com que se levem vários
anos para que o bioma se recupere. Foi a maior ocorrência de incêndios desde que o Instituto Nacional
de Pesquisas Espaciais (INPE) começou a fazer esse monitoramento em 1998.
Desde a primeira metade dos anos 2000, os dados sobre o desmatamento na Amazônia brasileira
vinham se reduzindo, mas a partir de 2013, seguindo a crise político-econômica do Brasil, essa dinâmica
se inverteu. Isso evidencia o caráter predatório-especulativo em torno do desmatamento: historicamente,
cresce em momentos de instabilidade ou de possibilidade de transição política.
Quase todos os meses do primeiro semestre de 2021 registraram algum recorde de desmatamento
na Amazônia em relação aos meses dos anos anteriores. Segundo o INPE (2021), entre janeiro e 25 junho
desse ano, o desmatamento na Amazônia Legal (região Norte mais Mato Grosso e Maranhão) foi o
maior dos últimos 6 anos, equivalendo a duas cidades de São Paulo.
De acordo com o Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (IMAZON, 2021),
apenas em junho de 2021 o desmatamento na região (926 km2) foi quase três vezes a área da cidade
de Fortaleza. Nos onze meses anteriores, incluindo junho, o desmatamento acumulado (8.381 km2)
se expandiu 51%. O mais preocupante é que a comparação é com períodos que já sofreram expansão.

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT