The influence of patriarchal ideology in defining children's toys/A influencia da ideologia patriarcal na definicao dos brinquedos infantis.

Autorde Oliveira Nascimento, Antonia Camila

Introducao

O presente trabalho tem como objetivo analisar a expressao da ideologia patriarcal nos brinquedos infantis, levando em consideracao os determinantes materiais e ideologicos nesses brinquedos, que contribuem para a cristalizacao dos significados dominantes sobre os generos (feminino e masculino). Acreditamos que os sujeitos sao ideologicamente cerceados desde a infancia, "treinados" desde cedo para assumirem papeis sociais de acordo com sexo. Dessa forma, as representacoes ideologicas dominantes presentes nos brinquedos possibilitam usos que se destinam a instituir significados para que as criancas reproduzam os papeis socialmente estabelecidos.

Enquanto a crianca se apropria e usa os brinquedos disponibilizados e referendados pelos adultos, ela esta acionando valores socialmente definidos como o que e masculino e feminino, ao mesmo tempo em que dramatiza as proprias vivencias de genero, ou seja, introjeta facetas de uma cultura que separa homens e mulheres, atribuindo-lhes valores sociais dominantes.

Considerando a influencia dos brinquedos como fator significante na reproducao da ideologia patriarcal na infancia, a presente pesquisa permitiu analisar a influencia dos brinquedos nesta estruturacao, tendo em vista que papeis de genero e comportamentos estao, de forma simbolica, materializadas neles, criando valores socialmente aceitos como verdades "absolutas".

Em nossa pesquisa adotamos o materialismo historico dialetico, uma vez que ele possibilitou compreender o objeto numa relacao profundamente ligada a divisao de classes e a forma particular como a classe dominante difunde suas ideias, tornando-as universais. Dai a importancia desse metodo, posto que busca nao somente conhecer a realidade, mas compreende-la para transforma-la. Nesse sentido, nossa pesquisa e pautada numa perspectiva de totalidade no trato com o objeto numa dimensao dialetica do conhecimento, vislumbrando a apreensao da realidade "para alem da aparencia e da causalidade dos fenomenos, em suas intimas conexoes internas, nas quais se autodeterminam" (CISNE, 2013, p. 37).

Para a realizacao desse estudo, utilizamos a abordagem qualitativa, tendo em vista que ela constitui uma relacao dinamica entre o mundo objetivo e a subjetividade do sujeito, formando um vinculo indissociavel entre ambos que nao pode ser traduzido em numeros.

Para a coleta dos dados, utilizamos como instrumento entrevistas com roteiro de perguntas semiestruturadas, que proporcionaram as entrevistadas falarem livremente a respeito do tema abordado. As cinco entrevistadas foram escolhidas aleatoriamente, obedecendo apenas ao criterio de serem maes que estavam comprando brinquedos para seus filhos. As informacoes obtidas foram registradas por meio de gravacao, com livre consentimento da entrevistada e assinatura de termo de consentimento livre esclarecido. Tambem utilizamos a pesquisa de imagem, na qual tivemos a oportunidade de fotografar departamentos de brinquedos infantis em algumas lojas (Americanas e Ri Happy) no West Shopping, localizado na cidade de Mossoro (RN). Dessa forma, o intuito era fazer uma analise comparativa de como os brinquedos estao organizados e divididos entre "brinquedos de menina e brinquedos de meninos". A analise desse conteudo coletado na pesquisa nos possibilitou desvelar a ideologia subjacente que orienta as representacoes simbolicas e materiais expressas nos brinquedos.

Nesse estudo, procuramos analisar a expressao da ideologia patriarcal presente nos brinquedos infantis, que contribuem para a cristalizacao dos significados dominantes sobre os generos (feminino e masculino). Relacionamos, desse modo, a educacao sexista com os brinquedos infantis, procurando mostrar que estes assumem, na socializacao das criancas, um papel na reproducao das desigualdades nas relacoes sociais entre homens e mulheres. Fizemos, ainda, uma analise reflexiva das falas das entrevistadas, procurando mostrar a percepcao destas acerca dos brinquedos, possibilitando desvendar, por meio dos discursos, as representacoes ideologicas que sustentam e afirmam facetas de uma cultura que separa homens e mulheres.

Por fim, fizemos uma analise interpretativa das imagens fotograficas coletadas na pesquisa de campo no intuito de mostrar as representacoes ideologicas e materiais presentes nos brinquedos infantis.

  1. Brinquedos infantis: a reproducao da ideologia patriarcal

    Os brinquedos disponibilizados e referenciados pelos adultos para as criancas sao carregados de valores e preconceitos da cultura patriarcal. Por exemplo, os pais nao permitem que seus filhos brinquem com brinquedos que nao sejam "adequados" ao seu genero e proibem que os meninos brinquem com bonecas. Incorporam, assim, no cotidiano das criancas, os brinquedos que sao destinados as meninas e aqueles destinados aos meninos, simbolizando os papeis hierarquicos entre homem e mulher, nos quais o masculino exerce a dominacao sobre o feminino.

    Nessa perspectiva, "desde a infancia meninas e meninos recebem uma educacao sexista" (CISNE, 2012, p. 160). Educacao sexista e entendida, aqui, nao apenas como aquela que diferencia homens e mulheres, mas que transforma diferencas em desigualdades sociais naturalizadas como algo definido biologicamente pelos sexos. No tocante aos brinquedos, estes sao assimilados aos papeis conservadores de genero estabelecidos pelo patriarcado, como "casinhas", jogos de panela, pratos, vassouras e bonecas similares a bebes reais, que expressam atividades reprodutivas, exercidas majoritariamente por mulheres. Ja os brinquedos para meninos, por sua vez, estao associados ao espaco publico e nao mantem nenhuma relacao com a paternidade, tampouco com as atividades domesticas. Nesse sentido, os brinquedos possuem uma carga ideologica patriarcal que assume, na socializacao das criancas, um papel na reproducao das desigualdades nas relacoes sociais entre homens e mulheres.

  2. A educacao sexista e os brinquedos infantis

    A desigualdade entre homens e mulheres, historicamente naturalizada nas relacoes sociais, encontra na educacao sexista um suporte ideologico para sua reproducao cotidiana. Um fio condutor que possibilita a construcao desse arranjo assimetrico entre os sexos reside nas explicacoes presumidas nos supostos determinantes biologicos. Ou melhor, na essencia do que e considerado "feminino" e "masculino", que justifica e determina, a luz dos pensamentos sexistas, as "habilidades, qualidades, profissoes, brinquedos ou espaco ditos de homem ou de mulher" (CISNE; BRETTAS, 2009, p. 61). Nesse sentido, utilizam-se dos determinantes biologicos, em seus aspectos fisicos, psiquicos e comportamentais para justificar diferentes habilidades sociais, talentos e aptidoes para impor um lugar de genero na sociedade patriarcal-capitalista.

    Questionar essa dicotomia que separa homens e mulheres, atribuindo papeis de acordo com o sexo, e perceber que as representacoes do "feminino e do masculino" nao sao determinadas biologicamente, mas pelas relacoes sociais. Nesse sentido, a educacao de meninos e meninas tem um papel basilar na formacao de valores e da cultura de genero, construidos essencialmente por meio de instituicoes como familia, igreja e escola. Como nos apontam Cisne e Brettas (2009, p. 61): "essas instituicoes alimentam um conjunto de valores conservadores sobre o comportamento de homens e mulheres--engendrado por meio da educacao familiar, religiosa e escolar [...]".

    E na familia que se inicia a "domesticacao" de meninas e meninos, e assim vao sendo desenhados os papeis do que e ser homem ou mulher, nomeados a partir de supostas diferencas biologicas. Assim, determinam um lugar como referencia, na cultura hegemonica patriarcal, que cria relacoes materiais e representacoes simbolicas do lugar do homem e da mulher na sociedade, imputando posicoes que estes devem assumir de acordo com o sexo, afirmando a suposta "diferenca natural" para estabelecer atribuicoes e deveres, consideradas "femininas ou masculinas". Nesses contornos, a familia e a primeira instituicao que nos coloca em contato com o mundo e, por meio dela, apreendemos a primeira forma de classificar e conceber o mundo. Conforme nos aponta Moreno (1999, p. 14):

    A partir do momento em que nascemos, comecamos a receber essa influencia social que condicionara nossa maneira de ver e de estar no mundo. Com a linguagem, aprendemos a primeira forma de dividir nosso universo em categorias. As palavras denominam as coisas, mas tambem fazem com que as agrupemos de uma determinada maneira em nosso pensamento. Antes mesmo de as criancas nascerem, os pais ja definem o que e "coisas de menina" e o que e "coisa de menino" por meio do enxoval, da selecao da cor do quarto e das roupas do bebe. Conforme a crianca vai crescendo, "aprende com as primeiras palavras que existe uma 'mamae' e um 'papai'; logo aprendera que existem 'meninas' e 'meninos'" (MORENO, 1999, p. 14), concebendo como natural a sua essencia "feminina" ou "masculina". De acordo com Chaui (1984, p. 134):

    Ora, a familia e organizada por relacoes de autoridade, de papeis distribuidos por sexo e idade, de deveres, obrigacoes e direitos, definidos tanto pelo sacramento do matrimonio quanto pelo casamento civil. E nesse contexto que a familia realizara a repressao sexual [...]. Consolidam-se as imagens sexuais-sociais da mulher como mae e do homem como pai. Consolidacao que se realiza tanto pela repressao negativa (as proibicoes do sexo nao-procriativo, o vicio) quanto pela positiva. Nesta, a mulher e construida como um ser fragil, sensivel e dependente, numa curiosa inversao dos valores desses atributos. Em outros termos, a ideologia patriarcal estabelece e elege a familia como uma ancora que sustenta o status quo das relacoes dominantes de sexo. Desde a infancia, os pais ensinam as criancas como elas devem se comportar, o que e "certo" e "errado" e o que e "proibido" ou permitido". Quando os filhos nao conseguem atender a tais criterios, eles se sentem culpados. Nesse sentido...

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