Política Nacional de Recursos Hídricos: governança da água e cidadania ambiental

AutorMaria de Fátima Wolkmer - Nicole Freiberger Pimmel
CargoProfessora Permanente do Mestrado em Direito Ambiental da Universidade de Caxias do Sul - Advogada. Mestre em Direito Ambiental pela Universidade de Caxias do Sul
Páginas165-198
Política Nacional de Recursos Hídricos:
governança da água e cidadania ambiental1
National Water Resources Policy: water governance and environmental
citizenship
Maria de Fátima S. Wolkmer
Universidade de Caxias do Sul, Caxias do Sul – RS, Brasil
Nicole Freiberger Pimmel
Universidade de Caxias do Sul, Caxias do Sul – RS, Brasil
Resumo: O artigo aborda a crise ambiental co-
ligada à água. A governança da água no Bra-
sil começa com a PNRH delineada na Lei n.
9.433 de 1997. Neste marco jurídico, a gover-
nança das águas realiza-se com a participação
social, envolvimento e negociação dos interes-
sados tendo como unidade de gestão a bacia
hidrográfica e a descentralização. Dessa for-
ma, a Cidadania tornou-se o eixo estruturante
da governança democrática, o que implica em
conhecimento e espaços efetivos de partici-
pação. Evidencia-se a importância de propor
soluções mais abrangentes, num diálogo inter-
cultural que construa alternativas a crise am-
biental global que pode ser terminal.
Palavras-chave: PNRH. Crise ambiental. Água.
Governança. Cidadania. Bem Viver.
Abstract: The article discusses the environ-
mental crisis related to water. The water gover-
nance in Brazil begins with PNRH outlined in
Law 9.433 to 1997. In this legal framework, the
governance of water is carried out with social
participation, involvement and negotiation with
stakeholders as a unit of the watershed mana-
gement and decentralization. Thus, citizenship
became the structural axis of democratic go-
vernance which implies knowledge, and effec-
tive spaces for participation. High lights the
importance of proposing a more comprehensive
solution, an intercultural dialogue that builds al-
ternative to the global environmental crisis that
can be conclusion.
Keywords: PNRH. Environmental crisis. Wa-
ter. Governance. Citizenship. Living Well.
1 Recebido em: 30/09/2013
Revisado em: 11/11/2013
Aprovado em: 12/11/2013
Doi: http://dx.doi.org/10.5007/2177-7055.2013v34n67p165
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1 Introdução
A água é um patrimônio natural estratégico. Mais do que um recur-
so imprescindível à produção de bens indispensáveis ao desenvolvimento
econômico e social, é um elemento vital para a conservação dos ecos-
sistemas e da vida de todos os seres em nosso planeta. Sem água a Vida
não existe. No entanto, os efeitos alarmantes que a destruição do meio
ambiente está provocando apontam para uma crise epistêmica, na medida
em que, o sentido histórico que vem sendo atribuído ao desenvolvimento
sustentável, na dimensão econômica (crescimento econômico), pode ser
o principal fator dos problemas ambientais. Neste contexto, a água é sem
dúvida um dos recursos naturais mais afetados.
Assim, evidencia-se a crise da água que vem sendo apontada por
muitos como a possível causa das disputadas deste século, cuja escassez
provocaria guerra entre países, da mesma forma que o petróleo tem sido
desde o século passado. Certamente, muitos dos efeitos da crise já são
percebidos na poluição, bem como na quantidade disponível. Dessa for-
ma, a complexidade da crise impõe a análise entrelaçada de diferentes
perspectivas. Por um lado, a partir da perspectiva de mercado cujo ob-
jetivo é consolidar a visão da água como um bem econômico para apro-
priação pelas grandes corporações do setor e, por outro, na perspectiva da
sustentabilidade socioambiental como um elemento central na geopolítica
mundial em função, entre outros, das mudanças climáticas com projeções
inquietantes, no que tange à soberania alimentar dos Estados. O primeiro
imperativo é mudar a cultura do desperdício e o entendimento de que a
água é um recurso inexaurível, ressaltando-se, nesse contexto, a impor-
tância estratégica das águas subterrâneas e a gestão colaborativa, entre
países, quando esses recursos forem transnacionais.
A ONU vem alertando que, em 2025, quase dois terços da popula-
ção mundial viverá em áreas metropolitanas, gerando graves problemas
de abastecimento. Em função disso, a ONU chama a atenção para a re-
levância de uma nova governança global dos bens comuns, que ponha
em prática as recomendações que vêm sendo feitas desde a Rio-92, com
o aporte da sociedade civil e de diferentes etnias e movimentos sociais,
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num pacto global efetivo para suprimento dos bens essências para a con-
tinuidade da vida.
Na América Latina há três formas de governança da água nas suas
políticas ambientais, ou seja, a gestão comunitária (Equador), o controle
social (Venezuela) e a participação social (Brasil). A governança da água
no Brasil começa como construção conceitual, teórica e operacional, com
a Política Nacional de Recursos Hídricos, através da Lei n. 9.433 de 1997.
Nesse contexto, a Cidadania ambiental tornou-se o eixo estruturante
da governança democrática. No entanto, como se sabe, isso implica em
que haja espaços efetivos de participação e conhecimento daqueles que
participam, fruto de um amplo aprendizado social das questões ambien-
tais, a partir de uma visão interdisciplinar. Refletir a governança global
da água, bem como o papel de países como o Brasil é fundamental na
medida em que ele é detentor de 14% das reservas de água e, sem dúvida,
vai exercer um papel fundamental num mundo com escassez de recursos
hídricos. Assim, é imprescindível abordar nosso arcabouço jurídico e sua
eficácia, considerando a água superficial e subterrânea, a partir de uma
visão ecossistêmica.
Apesar da natureza da água que deflue da Constituição de 1988 res-
ta saber se os fundamentos que balizam nossa Política Nacional de Re-
cursos Hídricos promovem a governança democrática e a sustentabilida-
de ambiental. Nesse sentido, é necessário ampliar também a discussão a
partir de outras cosmovisões, confrontar nossos princípios com o Novo
Constitucionalismo para enriquecer o debate, buscando novos paradigmas
para a governança da água por meio do diálogo intercultural, construindo
as soluções necessárias para a sustentabilidade.
2 Governança da Água: fundamentos da Política Nacional de
Recursos Hídricos
No Brasil, a governança como aparato conceitual que abarca uma
nova concepção da água é implementada com a Política Nacional de Re-
cursos Hídricos a partir de 1997. Segundo Jacobi (2012, p. 2), “[...] a go-

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