Trabalho do menor

AutorGeorgenor de Sousa Franco Filho
Ocupação do AutorDesembargador do Trabalho de carreira do Tribunal Regional do Trabalho da 8ª Região
Páginas315-321

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1. Distinção

Inicialmente, é importante firmar um indispensável esclarecimento, qual a de que devemos entender por trabalho do menor, tanto trabalho infantil, que é o praticado por criança com idade inferior a doze anos, como o trabalho do adolescente, que é aquele prestado por pessoa entre doze e dezoito anos de idade.

2. Escorço histórico

Segundo a OIT, el trabajo infantil es pura y simplemente la causa principal de la explotación y abuso de los niños en el mundo de hoy1. Não é, de outro lado, novidade a sua prática. Encontramos notícias no Código de Hamurabi, e o menor trabalhador era desprotegido no Egito antigo, na Grécia e em Roma, e nas corporações de ofício da Idade Média.

A sua proteção começou em França, com a lei de 1841, fixando idade mínima para admissão. Depois, surgiram diplomas legislativos na Bélgica, Alemanha, Suíça, Áustria, Países Baixos, Portugal e Rússia.

No Brasil, historicamente, o Decreto-lei n. 1.313, de 1890, propunha medidas de proteção, mas nunca foi regulamentado. O Decreto n. 17.943-A, de 12.10.1927, o nosso primeiro Código de Menores, proibia trabalho para os menores de doze anos, e, a partir de 1932, o limite foi ampliado para quatorze anos de idade, mantido pelas Constituições de 1934, 1937 e 1946, com a de 1967, retornando ao limite mínimo de doze anos.

A Constituição de 1988 fixou-o, inicialmente, em quatorze anos, salvo na condição de aprendiz, tendo a EC n. 20, de 15.12.1998, ampliado para dezesseis anos (art. 7º, XXXIII), sendo, em consequência, derrogados todos os dispositivos infraconstitucionais que adotavam a regra dos doze anos de idade, proibido o trabalho noturno, insalubre e perigoso, por força de norma constitucional, e também o trabalho penoso, consoante o art. 67, II, do ECA2. De outro lado, os maiores de quatorze anos são segurados facultativos da Previdência Social, ex vi do art. 14 da Lei n. 8.212, de 24.07.1991, cuja redação não foi alterada pela Lei n. 9.732, de 11.12.1998.

3. Panorama internacional

Considera-se criança o menor de dezesseis anos. Muitos desses menores que são encontrados no imenso campo dos trabalhadores infantis, um quase campo de concentração, um gueto odioso de sofrimento. Com efeito, de acordo com o informe da OIT, elaborado para a 86ª Reunião da Conferência Internacional do Trabalho, realizada em

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Genebra, de 2 a 18 de junho de 1998, 120 milhões de crianças de cinco a quatorze anos trabalham, especialmente na África, Ásia e América Latina3, em um mundo onde existem 37 milhões de desempregados e 1.300 milhões de pobres, segundo o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD).

A situação é alarmante. Em Bangladesh, até crianças de cinco a sete anos trabalham no serviço doméstico4, e, no Líbano, a idade mínima básica é de oito anos para crianças que efetuam trabalhos ligeiros não especificados5.

No Brasil, levantamento realizado pela Fundação IBGE, em 1990, revelou a existência de 7,5 milhões de crianças e adolescentes trabalhando6.

A OIT, pelo seu papel altamente relevante no trato das questões sociais, tem dedicado diversas convenções internacionais do trabalho a esse tema. Assim, as Convenções ns. 5/1919 (idade mínima (quatorze anos) para admissão em trabalho na indústria), 6/1919 (trabalho noturno dos menores (dezoito anos) na indústria), 7/1920 (idade mínima (quatorze anos) para admissão no trabalho marítimo), 10/1921 (idade mínima (quatorze anos) para admissão no trabalho agrícola), 15/1921 (idade mínima (dezoito anos) para admissão como paioleiro e foguistas), 16/1921 (exame médico obrigatório para menores (dezoito anos) no trabalho marítimo), 33/1932 (idade mínima (quinze anos) para admissão em trabalhos não industriais), 58/1936, revisora da Convenção n.7, (idade mínima (quinze anos) para admissão para o trabalho marítimo), 60/1937, revisora da Convenção n. 33, (idade mínima (quinze anos) para admissão em trabalhos não industriais, 77/1946 (exame médico obrigatório de menor (dezoito anos) para admissão em emprego na indústria), 112/1959 (idade mínima (quinze anos) para admissão no trabalho de pesca), 117/1962 (genérica, sobre política social), 123/1965 (idade mínima (dezesseis anos) para admissão em trabalho subterrâneo nas minas), 124/1965 (exame médico de aptidão de menores (21 anos) para o trabalho subterrâneo nas minas), além da 29/1930 (sobre trabalho forçado), 115/1960 (sobre proteção contra radiações ionizantes) e 138/1973 (sobre idade mínima para admissão a emprego), que não fixa idade, deixando essa obrigação aos Estados ratificantes, mas que deve ser assegurado completo desenvolvimento físico e mental dos menores (art. I).

Na 86ª Conferência Internacional do Trabalho, o tema trabalho infantil foi levado em primeira discussão, com vistas a adoção de novas normas internacionais de trabalho tendentes à ação imediata que permita pôr fim à exploração de crianças ocupadas em atividades e trabalhos perigosos7.

Nessa Conferência, em Genebra, terminou a Marcha Global contra o Trabalho Infantil, que sete mil Organizações Não Governamentais (ONGs) de 99 países iniciaram em fevereiro de 1998, com três grandes ramos, cruzando o planeta, saindo de Manila (Filipinas), da Cidade do Cabo (África do Sul) e de São Paulo (Brasil), objetivando protestar contra essa atividade e pressionar os países a (1) ratificarem e cumprirem as convenções internacionais sobre trabalho infantil e direitos da criança, (2) aumentarem investimentos em educação, e (3) a criarem códigos de conduta para empregadores.

4. Programas de sustentação econômica

Dentre as formas que têm sido buscadas para minimizar o problema do trabalho infantil, têm ganhado lugar de destaque os programas de sustentação econômica, ou de renda mínima, ou, ainda, de bolsa-escola.

Tem sido observada

la importancia que se da últimamente a unas políticas y programas que proporcionan ingresos de sustitución e incentivos económicos con miras a solventar el problema de la pobreza y atender la necesidad de los niños pobres de ganar dinero. Esta estrategia de ofrecimento de incentivos económicos concuerda con la mentalidad actual, que prefiere los incentivos, más que las sanciones, como instrumento para eliminar práticas viciosas 8 .

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Existem algumas dificuldades com programas dessa natureza, que, segundo a OIT, podem ser:

  1. problemas de corrupção;

  2. possibilidade de os beneficiários acabarem dependendo apenas do programa;

  3. desinteresse das famílias pobres pela escolarização dos menores;

  4. possibilidade das crianças trabalharem para obter benefícios de algum programa de incentivo;

  5. adultos se esforçarem menos para trabalhar; e,

  6. limitação temporal do programa com o retorno ulterior dos menores ao mundo do trabalho9.

Atualmente, encontramos cerca de 51 organizações (a maioria ONGs) em dezoito países que se preocupam com a implementação desses programas de sustentação econômica10, e são identificadas algumas experiências frutuosas, apesar de muitas dificuldades.

Pelo menos dois exemplos exitosos dessa experiência são encontrados no Brasil. No sul, no Estado do Paraná, o projeto Da rua para a escola ganhou o Prêmio Criança e Paz, da Unicef, implantado em cerca de sessenta...

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