Trabalho & prazer

AutorAna Magnólia Mendes - Mário César Ferreira
CargoProfessores do Departamento de Psicologia Social e do Trabalho – UnB.

"Só de pensar em vir trabalhar, já fico de mau-humor". Essa afirmação de uma atendente, registrada em um contexto de pesquisa, é bastante representativa das vivências psíquicas que o trabalho assalariado parece ter se transformado ao longo dos anos. Esse "depoimento-pista" autoriza supor que embaixo desse iceberg há muito gelo. E esse "gelo" vai tornando-se gradualmente visível no processo de análise do trabalho na medida em que os sujeitos encontram um espaço de fala para narrar suas vivências em termos de significações pessoais do trabalho. É assim que a face do sofrimento no trabalho vai, aos poucos, desvelando-se nas abordagens da psicodinâmica do trabalhoe da ergonomia da atividade.

A mercantilice do trabalho humano, que o transforma em objeto de compra e venda, impôs uma tensão permanente entre as vivências de prazer e sofrimento no trabalho, tendendo a encapsular a primeira em favor da segunda. Nesse sentido, a invenção histórica do trabalho assalariado no final do século XIX produz um sério prejuízo ao caráter ontológico da atividade de trabalho como veículo de hominização, reduzindo sua função como fonte de prazer dos indivíduos.

No contexto da concorrência globalizada - manifestação do estágio avançado do desenvolvimento capitalista - o prazer em trabalhar encontra pouco espaço de expressão. Os estudos no campo da inter-relação psiquismo e trabalho mostram que a vivência de prazer é percebida pelo sujeito, quando esse sente-se útil, produtivo, reconhecido e valorizado pelo que faz. Do mesmo modo, a vivência de prazer se materializa quando o sujeito constata que é admirado pelos pares e pela hierarquia e que o seu trabalho possibilita-lhe deixar sua "grife pessoal". Nesse contexto, ele sabe que a sua atividade é significativa para a instituição onde trabalha e também para a sociedade.

Mas, a julgar pela conjuntura atual do modo de funcionamento de muitas organizações, a possibilidade de prazer no trabalho tem sido uma vivência escassa em função de concepções, valores e práticas institucionais que se sustentam exclusivamente nos paradigmas da eficiência, produtividade e rentabilidade. Essa mentalidade tecnoprodutivista predominante tem vocação para miopia e não consegue enxergar três condições fundamentais que vêm sendo apontadas pela literatura da área como requisitos fundamentais para constituir-se um cenário favorável para as vivências predominantes de prazer no trabalho. Que condições são essas?

Trata-se, a rigor, de princípios...

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