Tratados
Autor | Carlos Roberto Husek |
Ocupação do Autor | Desembargador do TRT da 2ª Região Professor da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Membro da Academia Paulista de Direito, Membro da Comunidade de Juristas da Língua Portuguesa |
Páginas | 86-117 |
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Tratado é o acordo formal concluído entre os sujeitos de Direito Internacional Público destinado a produzir efeitos jurídicos na órbita internacional.
É a manifestação de vontades de tais entes. Um ato jurídico formal que envolve pelo menos duas vontades.
Antigamente, somente o Estado soberano tinha capacidade de promover tratados com os seus coirmãos. Aos poucos, tal característica foi sendo desvinculada da exclusiva figura do Estado, para abranger as entidades internacionais64; porém, sem fazer concessões ao indivíduo, que não tem essa capacidade, ou mesmo às empresas públicas e privadas, ainda que multinacionais65.
Observa-se, dos conceitos acima descritos, que os tratados são efetuados mediante acordos, isto é, ato jurídico exarado de cada um dos interessados,
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formando um ato complexo. Não prescindem de forma escrita, conforme a Convenção de Havana de 1928 e a de Viena de 196966, muito embora admita Grandino Rodas o tratado oral: "A exteriorização de vontades concordantes, mais comumente através de forma escrita, mas também através da oral ou comportamento passivo, manifesta o objeto e a finalidade do tratado"67. Sob
certo aspecto - mormente dada a imprecisão dos vocábulos utilizados - há que se dar razão ao eminente doutrinador, uma vez que a Convenção de Viena menciona a existência de acordos não escritos, ainda que não amparados pela Convenção dos Tratados.
Entendemos, entretanto, dada a notória dificuldade de execução de eventuais acordos orais, que a regra expressa no art. 3º convencional prestigia a relação, Iato sensu, internacional, ainda que não escrita, para afirmar o próprio Direito Internacional como regra e princípio protetor: Art. 3º "O fato de que a presente Convenção não se aplica a acordos internacionais concluídos entre Estados e outros sujeitos de direito internacional ou a acordos inter-nacionais que não sejam concluídos por escrito, não prejudicará: a) o valor jurídico desses acordos; b) a aplicação a esses acordos de quaisquer regras enunciadas na presente Convenção às quais estariam submetidos em virtude do direito internacional, independentemente da referida Convenção; c) a aplicação da Convenção às relações entre Estados reguladas em acordos internacionais, em que sejam partes outros sujeitos de direito internacional."
Os acordos internacionais, ainda que não formalmente estabelecidos, valem, de algum modo, como possibilidade de efetiva negociação. A sociedade internacional vive de tratos, de negociação, em todas as áreas da atividade humana, que no mínimo se apresentam como fatos juridicamente apreciáveis. Entretanto, a Convenção de Viena de 1969 só entrou em vigor em 1980.
Os tratados, por fim, são concluídos pelos Estados e, de conformidade com a própria Convenção, a contrario sensu de seu art. 3º, pelos demais entes de Direito Internacional (exceção dos particulares), embora não abrangidos pela codificação específica representada na Convenção de Viena.
Outra convenção foi feita em Viena em 1986, sobre o Direito dos Tratados, que incluiu as organizações internacionais, aplicando-a para regrar a feitura de tratados entre Estados e organizações internacionais e tratados apenas entre as próprias organizações internacionais (art. 1º), o que é um considerável avanço.
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Há, também, a Convenção de Viena de 1978, sobre a sucessão de Estados em respeito a tratados.
Temos aí os documentos básicos sobre tratados: Convenções de Viena de 1969, de 1978 e de 1986.
Tratado é o nome que se consagra na literatura jurídica. Porém, outros são usados, sem qualquer rigor científico, como: convenção, capitulação, carta, pacto, modus vivendi, ato, estatuto, declaração, protocolo, acordo, ajuste, compromisso, convênio, memorando, regulamento, concordata etc.
A verdade é que a variedade de nomes não guarda relação com o teor substancial do tratado, visto que pode ele referir-se a uma gama imensa de assuntos.
Algumas tentativas têm sido feitas no sentido de vincular os termos ao tipo de tratado, sem êxito. Contudo, a prática, muitas vezes, leva-nos a fixar nomes mais aplicáveis a um ou a outro caso. Alguns exemplos sobressaem:
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compromisso arbitral, que é o tratado em que os Estados submetem à arbitragem certo litígio em que são partes; b) acordo de sede, que significa um tratado bilateral em que uma das partes é organização internacional e a outra um Estado, feito para a instalação física daquela no território deste;
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carta, normalmente reservado para os tratados institucionais, como a Carta da ONU, a Carta da OIT, a Carta da OEA, etc.; d) concordata, nome normalmente reservado ao tratado bilateral em que uma das partes é a Santa Sé, tendo por objeto as relações entre a Igreja Católica local e um Estado.
Como se observa, não há qualquer lógica: apenas a prática e a adaptação do nomen iuris à noção de compromisso de teor científico.
O critério para a classificação é mais utilitário do que de regime jurídico claro e diferenciador. No entanto, nessa matéria de Direito Internacional, como em outras, a doutrina vai aos poucos se fixando e justificando determinadas classificações, influenciando e sendo influenciada pelos fatos, tornando, assim, o entendimento menos variado.
Aliás, a necessidade de se classificar os fenômenos do mundo é vital para a compreensão do ser humano. A inteligência, o mais das vezes, somente consegue absorver os fatos e proporcionar soluções quando este é o desafio, repartindo-os, dividindo-os, classificando-os, enfim, em grandes quadros e ramos específicos - a única forma que temos, simples mortais, de entender a
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realidade. A intuição, para a maioria dos ocidentais pelo menos, conta pouco e pouco serve para o estudo científico. Outro não é o caminho para o estudo dos tratados, ora vislumbrando critérios formais, ora critérios materiais.
Os primeiros dizem respeito à forma de apresentação dos tratados, e os segundos, à substância destes.
Em relação à forma, podem ser vistos quanto ao número de partes e quanto ao procedimento. Em relação ao critério material, temos os tratadoscontratos, os tratados normativos e, dentro destes, ainda, os tratados especiais. Vamos especificá-los:
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Quanto à forma:
a.1) Número de partes - O tratado pode ser bilateral ou multilateral. Bilateral se somente dois são os partícipes, e multilateral nos demais casos. Alguns falam em tratados plurilaterais para especificar tratados compostos de poucos Estados - três, por exemplo -, sem clareza, no entanto, porque o prefixo "pluri" pode também aplicar-se quando dois são os Estados68.
Aqui, há que se ter em mente a noção anterior de "parte" em Direito, como centro de interesses, o que significa que um tratado bilateral pode possuir de um lado um Estado e de outro uma organização internacional, composta de vários Estados, ou, ainda, ser concluído entre duas organizações internacionais69, envolvendo, naturalmente, muitos Estados de cada lado. Em todos esses casos, existirão duas partes e o tratado será bilateral70.
a.2) Procedimento - É uma distinção do tratado segundo o procedimento adotado para sua conclusão. Existem tratados que necessitam de aprovação legislativa e carta de ratificação; outros, não. A ratificação será mais bem explicada quando descrevermos no item 5 o procedimento do texto convencional71. Não se trata da ratificação constitucional interna do país, por meio do órgão próprio (Legislativo) e em obediência às regras imperativas emanadas do próprio
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Estado72, mesmo porque o procedimento, sob esse aspecto, varia de Estado para Estado, mas o que qualifica essa classificação é o ato que ocorre na sociedade internacional, como fato dentro dessa sociedade.
Quem celebra os tratados internacionais pelo Brasil é o presidente da República (art. 84, VIII, da CF), isto é, o Poder Executivo. O andamento interno que resulta na expressão da vontade do Estado brasileiro pelo Executivo, na verdade, tem importância relativa para o Direito Internacional, visto que se trata de legislação nacional.
a.2.1) Tratados solenes ou em devida forma - São aqueles que passam pelas seguintes fases: negociação, assinatura ou adoção, aprovação legislativa por parte do Estado interessado e, finalmente, ratificação ou adesão.
Se o tratado for bilateral, a negociação é iniciada usualmente mediante o envio de uma nota diplomática para o território de uma das partes. Se for negociação coletiva, principia no seio de uma organização internacional ou de uma conferência diplomática.
Após iniciada a negociação e discutidas suas cláusulas amplamente, os Estados participantes voltam-se para seus órgãos internos, buscando a aprovação do Parlamento73.
Finalmente aprovado, o Estado procura manifestar sua vontade mediante a ratificação ou adesão.
a.2.2) Acordos de forma simplificada - São também conhecidos como...
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