Troca de benefícios (desaposentação)

AutorCláudia Salles Vilela Vianna
Ocupação do AutorAdvogada, Mestra pela PUC/PR, Conferencista e Consultora Jurídica Empresarial nas Áreas de Direito do Trabalho e Direito Previdenciário, Coordenadora dos cursos de pós-graduação da EMATRA/PR e PUC/PR
Páginas744-754

Page 744

Tema bastante discutido em nossos tribunais, a troca de um benefício por outro (apelidada desaposentação) tem suscitado grandes debates.

É certo que a legislação vigente proíbe a acumulação de benefícios, mas e a troca por uma prestação mais benéfica, com renúncia da primeira prestação, é possível?

A questão tem julgamentos favoráveis aos segurados pelo STJ, conforme ilustra recente decisão proferida pela 5ª Turma, de relatoria da Ministra Laurita Vaz:

"PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. RENÚNCIA AO BENEFÍCIO DEAPOSENTADORIA. POSSIBILIDADE. DIREITO PATRIMONIAL DISPONÍVEL.DEVOLUÇÃO DOS VALORES RECEBIDOS. DESNECESSIDADE. VIABILI-DADE DECOBRANÇA DAS PARCELAS ATRASADAS. APRECIAÇÃO DE DISPOSITIVOSCONSTITUCIONAIS EM ÂMBITO ESPECIAL. INADMISSIBILIDADE. AGRAVOREGIMENTAL DESPROVIDO.

  1. Permanece incólume o entendimento firmado no decisório agravado,no sentido de que, por se tratar de direito patrimonial disponível,o segurado pode renunciar à sua aposentadoria com o propósito de obter benefício mais vantajoso, no regime geral de previdência social ou em regime próprio de previdência, mediante a utilização de seu tempo de contribuição, sendo certo, ainda, que tal renúncia não implica a devolução dos valores percebidos. 2 Nessa linha, sendo possível a opção e desnecessária a devolução, resta legítimo, por extensão, o direito à execução dos valores entre a data de entrada do pedido de aposentadoria, cujo direito foi reconhecido judicialmente, e a data de início do segundo benefício, mais vantajoso, concedido na via administrativa. 3. A via especial, destinada à uniformização da interpretação do direito federal infraconstitucional, não se presta à análise de dispositivos da Constituição da República, ainda que para fins de prequestionamento. 4. Agravo regimental desprovido. (AgRg no REsp 1162432 / RS - Processo n. 2009/0204008-0 - 5ª Turma - Relatora Ministra Laurita Vaz - julgamento em 5.2.2013 - DJe de 15.2.2013)

Em procedimento de recursos repetitivos, o STJ manteve tal entendimento, conforme demonstra a seguinte ementa (REsp 1.334.488/SC, Primeira Seção, Ministro Herman Benjamin, DJe de 14.05.2013):

RECURSO ESPECIAL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DOCPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. DESAPOSENTAÇÃO E REAPOSENTAÇÃO. RENÚNCIA A APOSENTADORIA. CONCESSÃO DE NOVO E POSTERIOR JUBILAMENTO. DEVOLUÇÃO DE VALORES. DESNECESSIDADE.

1. Trata-se de Recursos Especiais com intuito, por parte do INSS, de declarar impossibilidade de renúncia a aposentadoria e, por parte do segurado, de dispensa de devolução de valores recebidos de aposentadoria a que pretende abdicar.

2. A pretensão do segurado consiste em renunciar à aposentadoria concedida para computar período contributivo utilizado, conjuntamente com os salários de contribuição da atividade em que permaneceu trabalhando, para a concessão de posterior e nova aposentação.

3. Os benefícios previdenciários são direitos patrimoniais disponíveis e, portanto, suscetíveis de desistência pelos seus titulares, prescindindo-se da devolução dos valores recebidos da aposentadoria a que o segurado deseja preterir para a concessão de novo e posterior jubilamento. Precedentes do STJ.

4. Ressalva do entendimento pessoal do Relator quanto à necessidade de devolução dos valores para a reaposentação, conforme votos vencidos proferidos no REsp 1.298.391/RS; nos Agravos Regimentais nos REsps 1.321.667/ PR, 1.305.351/RS, 1.321.667/PR, 1.323.464/RS, 1.324.193/PR, 1.324.603/RS, 1.325.300/SC, 1.305.738/RS; e no AgRg no AREsp 103.509/PE.

5. No caso concreto, o Tribunal de origem reconheceu o direito à desaposentação, mas condicionou posterior aposentadoria ao ressarcimento dos valores recebidos do benefício anterior, razão por que deve ser afastada a imposição de devolução.

6. Recurso Especial do INSS não provido, e Recurso Especial do segurado provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do STJ.

O INSS, não satisfeito com as decisões em seu desfavor e compreendendo que a troca de benefícios fere dispositivos constitucionais, interpôs em diversos processos o Recurso Extraordinário. O STF reconheceu repercussão geral no RE 661256 RG/DF (Relator Ministro Ayres Britto, julgamento em 17.11.2011). Com a aposentadoria do relator (Ayres Britto) o processo encontra-se parado, sem qualquer previsão de julgamento.

Page 745

1. Direito à renúncia ao benefício atualmente percebido

Na Constituição Federal e na legislação ordinária atualmente em vigor não há, absolutamente, qualquer proibição a respeito. O Decreto n. 3.048/99, contudo, expressa a impossibilidade de renúncia após o recebimento da aposentadoria, conforme redação dos art. 181-B:

Art.181-B. As aposentadorias por idade, tempo de contribuição e especial concedidas pela previdência social, na forma deste Regulamento, são irreversíveis e irrenunciáveis.

Parágrafo único. O segurado pode desistir do seu pedido de aposentadoria desde que manifeste esta intenção e requeira o arquivamento definitivo do pedido antes da ocorrência do primeiro de um dos seguintes atos:

I - recebimento do primeiro pagamento do benefício; ou

II - saque do respectivo Fundo de Garantia do Tempo de Serviço ou do Programa de Integração Social.

Ocorre que os decretos são atos emanados do Poder Executivo, sem qualquer força normativa. Sua função é tão somente regulamentar, não sendo possível trazer norma proibitiva de direitos, cuja reserva é apenas da lei (CF/88, art. 5º, II).

Não havendo expressa proibição legal quanto à renúncia, a aposentadoria constitui um direito patrimonial disponível, do qual pode dispôr o segurado a qualquer momento, mesmo após o recebimento de meses ou anos de benefício. O Decreto, no art. 181-B, acaba por extrapolar sua função regularmentar, o que não se pode admitir.

Administrativamente, o INSS nega o pedido de troca com argumentos do 181-B do Decreto, mas no Poder Judiciário, ainda que não pacificada totalmente a questão, as decisões tem sido favoráveis ao segurados nesse tópico, conforme ilustram os seguintes julgados:

"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO CONTRIBUIÇÃO/SERVIÇO. RENÚNCIA. CONCESSÃO DE NOVO BENEFÍCIO. COMPUTO DE TEMPO DE SERVIÇO LABORADO APÓS A CONCESSÃO DO PRIMEIRO BENEFÍCIO. POSSIBILIDADE. TERMO INICIAL. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. CUSTAS. 1. É possível a renúncia à aposentadoria para fins de aproveitamento do tempo de contribuição e concessão de novo benefício, seja no mesmo regime ou em regime diverso, uma vez que a aposentadoria constitui direito patrimonial disponível. Precedentes do STJ e desta Corte (AGA 200901000657626, DESEMBARGADORA FEDERAL MONICA SIFUENTES, SEGUNDA TURMA, e-DJF1 DATA 9.9.2011, AGA 200901000670402, JUIZ MARCOS AUGUSTO DE SOUSA (CONV.), PRIMEIRA TURMA, e-DJF1 DATA: 13.7.2010 e AGA 200901000568455, JUIZ RODRIGO NAVARRO DE OLIVEIRA (CONV.), PRIMEIRA TURMA, e-DJF1 DATA 1º.6.2010). 2. O Superior Tribunal de Justiça, ao examinar o tema, firmou o entendimento de que a renúncia à aposentadoria, para fins de concessão de novo benefício, seja no mesmo regime ou em regime diverso, não implica em devolução dos valores percebidos, pois, enquanto esteve aposentado, o segurado fez jus aos seus proventos (RESP 1113682/SC, REL. MINISTRO NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, REL. P/ ACÓRDÃO MINISTRO JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, JULGADO EM 23.2.2010, DJE 26.4.2010 e AGRG NO RESP 1.107.638/PR, QUINTA TURMA, RELATORA MINISTRA LAURITA VAZ, DJE DE 25.5.2009). 3. Assim, é devida a concessão de novo benefício, cujo termo inicial deve ser fixado a partir do requerimento administrativo, e os critérios de cálculo devem observar a legislação vigente à data do novo benefício, compensadas as parcelas recebidas administrativamente, desde então, em decorrência da primeira aposentadoria. 4. (...)."(TRF 1ª Região - AC - 2ª Turma - Relator convocado Juiz Federal Cleberson José Rocha - DJF1 de 15.2.2013 p. 151)

"DIREITO PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVOS LEGAIS. JULGAMENTO DE APELAÇÃO PELO ART. 557 DO CPC. POSSIBILIDADE. APOSENTADORIA. RENÚNCIA. POSSIBILIDADE. NOVO BENEFÍCIO. DEVOLUÇÃO DOS VALORES PERCEBIDOS. 1. (...). 2. Pedidos cumulados para condenar o réu a reconhecer a renúncia do autor ao benefício de aposentadoria de que é titular e, uma vez reconhecido tal direito, condená-lo a recalcular e implantar novo benefício, computando-se as contribuições vertidas após a jubilação. 3. É possível a renúncia ao benefício desde que acompanhada da devolução dos valores recebidos, com o fim de restabelecer as coisas in status quo ante, ou seja, com a anulação do proveito econômico é como se o benefício nunca tivesse existido. Precedentes desta Corte. 4. Sentença reformada, julgando procedente o primeiro pedido, para declarar o direito da parte autora a renunciar à aposentadoria de que é titular, e improcedente o pedido de cálculo e implantação de nova aposentadoria, eis que tal somente é possível mediante a devolução integral dos valores percebidos a título daquele benefício. 5. (...). 6. Recursos desprovidos."(TRF 3ª Região - AC 1656961 - Processo n. 201061140079616 - 10ª Turma - Relator Juiz Baptista Pereira - DJF3 de 13.10.2011 p. 2047)

"PREVIDENCIÁRIO. DECADÊNCIA. DESAPOSENTAÇÃO. RENÚNCIA AO BENEFÍCIO PARA RECEBIMENTO DE NOVA APOSENTADORIA. POSSIBILIDADE. DIREITO DISPONÍVEL. ART. 181-B DO DECRETO N. 3.048/99. NORMA REGULAMENTADORA QUE OBSTACULIZA O DIREITO À DESAPOSENTAÇÃO. ART. 18, § 2º, DA LEI N. 8.213/91. EFEITOS EX NUNC DA RENÚNCIA. DESNECESSIDADE DE DEVOLUÇÃO DOS VALORES PERCEBIDOS A TÍTULO DO BENEFÍCIO ANTERIOR. AUSÊNCIA DE ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA. VIABILIDADE

Page 746

ATUARIAL. EFETIVIDADE SUBSTANTIVA DA TUTELA JURISDICIONAL. 1...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT