Uma dialogia entre os direitos humanos e a ética biocêntria: a terra para além do 'antropoceno

AutorLívia Gaigher Bósio Campello, Raquel Domingues Do Amaral
CargoPós-Doutorado em Direito do Estado pela Universidade de São Paulo (USP)/Doutoranda em Direito pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS)
Páginas35-60
35 | Revista Brasileira de Direito Animal, e-issn: 2317-4552, Salvador, volume 15, n. 01, p.35-60, Jan-Abril 2020
UMA DIALOGIA ENTRE OS DIREITOS HUMANOS E A ÉTICA
BIOCÊNTRIA: A TERRA PARA ALÉM DO “ANTROPOCENO”
A DIALOGIC BETWEEN HUMAN RIGHTS AND THE BIOCENTRIC ETICS: THE EARTH
BEYOND THE ANTHROPOCENE
Recebido: 30.09.2019 Aprovado: 25.02.2020
Lívia Gaigher Bósio Campello
Pós-Doutorado em Direito do Estado pela
Universidade de São Paulo (USP). Professora e
coordenadora do Programa de Mestrado em
Direitos Humanos da Universidade Federal de
Mato Grosso do Sul (UFMS).
EMAIL: liviagaigher@gmail.com
LATTES: http://lattes.cnpq.br/9067637443861868
ORCID: Https://orcid.org/0000-0002-1233-1902
Raquel Domingues Do Amaral
Doutoranda em Direito pela Universidade Federal
de Mato Grosso do Sul (UFMS). Juíza Federal no
Tribunal Regional da Terceira Região.
EMAIL: rdamaral2013@gmail.com
LATTES: http://lattes.cnpq.br/8289393906454567.
ORCID: Https://orcid.org/0000-0002-0102-3031
RESUMO: O presente artigo analisa a necessidade de estabelecer um diálogo entre a
linguagem dos direitos humanos e a ética da ecologia profunda, visando uma mudança do
significado de sujeito de direito para reduzir os efeitos negativos da atividade humana no
meio ambiente na nova época geológica do Antropoceno. Nesse intuito, é estudada a
importância de uma mudança cultural da sociedade através de uma aproximação do homem
com a natureza. Ainda, é analisado o conceito de sujeito de direito e sua relação com a
propriedade, destacando as consequênc ias disso para a relação do ser humano com os seres
não humanos. Por fim, é estudada a possibilidade de uma intertextualidade entre o artigo 225
da Constituição Federal de 1988 com a teoria “Earth Jurisprudence” de Thomas Berry. Em
conclusão, foi ver ificada a necessidade mudança do paradigma jurídico antropocêntrico atual
através de uma ética biocêntrica que busque uma harmonia entre os direitos humanos e os
direitos dos seres não humanos, sendo que, com esse intuito, também concluiu-se que a teoria
Earth Jurisprudence” se harmoniza com o positivismo brasileiro e com os direit os humanos.
Para tanto, utiliza a pesquisa exploratória e descritiva, bibliográfica e documental, com uma
análise de obras, artigos científicos e legislações. O método é dedutivo, partindo de conceitos
universais, buscando-se sua particularização.
PALAVRAS-CHAVE: Antropoceno. Earth Jurisprudence. Ética Bi ocêntrica. Direitos Humanos.
Propriedade Privada.
ABSTRACT: This present paper intends to analyze the necessity to create a dialogue between
the human rights’ language and the deep ecology ethics’ language, with the purpose to
change the legal subject’s meaning to reduce the human activities’ negative effects in the
environment at this new geologic epoch called Anthropocene. For this purpose, we study the
importance of a cultural change in society through a rapprochement of man with nature. We
also analyze the legal subject’s concept and its relation with the property, highlighting its
consequences for the relation between human beings and non-human beings. Finally, we
study the possibility of an intertextuality among 1988 Brazilian Federal Constitution’s article
Lívia Gaigher Bósio Campello e Raquel Domingues Do Amaral
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225 and Thomas Berry’s Earth Jurisprudence’s theory. In conclusion, it was verified the need
to change the current anthropocentric juridical paradigm thro ugh a biocentric ethics, that
seeks an harmony between human rights and the non-human beings’ rights. With this idea, it
was a lso verified that the Earth Jurisprudence’s theory harmonizes with the Brazilian
positivism and the huma n rights. For this, it was used the exploratory and descriptive,
bibliographic and documental research, with an analysis of books, scientific articles and
legislations. The method is deductive, starting from a universal co ncept until its
particularization.
KEYWORDS: Anthropocene. Earth Jurisprudence. Biocentric ethics. Humans Beings Private
Property.
SUMÁRIO: 1 Introdução 2 O “Antropoceno” 3 A Terra, os Humanos, o Tempo e o Lugar 4 O
Ser Humano e o sujeito de direito 5 É possível uma intertextualidade do Direito Fundamental
ao meio ambiente e quilibrado previsto no artigo 225 da Constituição brasileira com a teoria
“Earth Jurisprudence” de Thomas Berry? 6 Conclusão 7 Notas de Referência
1 Introdução
Este artigo pretende abordar a necessidade de se estabelecer uma dialogia entre a
linguagem dos direitos humanos e a linguagem da ética ecológica profunda com a ressignificação
da categoria sujeito de direito, como um caminho para minimizar os efeitos nefastos que as
atividades humanas têm causado ao meio ambiente nesta nova Época que vem sendo
denominada “Antropoceno”.
Nessa linha, busca enfatizar a urgência de uma mudança cultural em nossa sociedade a
partir da reaproximação do ser humano com a Terra e do aprendizado com a visão de mundo dos
povos originários. Pretende-se demonstrar, em breve retrospecto, o conceito de sujeito de direito
no pensamento jurídico ocidental e sua estreita ligação com a evolução do direito de
propriedade, com realce nas dificuldades éticas e filosóficas que essa visão de mundo impõe à
relação do ser humano com os outros seres não humanos. Por fim, vislumbra-se a possiblidade de
uma intertextualidade entre o artigo 225, parágrafo primeiro, incisos I a VII, da Constituição
Federal de 1988 (CF/88), que prevê o direito fundamental ao meio ambiente equilibrado e a
teoria jus filosófica de Thomas Berry denominada Earth Jurisprudence” e desenvolvida pelo
professor Peter D. Burdon, como um caminho hermenêutico para harmonização dos direitos
humanos com a ética ecológica profunda.
Embora a proteção ao meio ambiente em nosso ordenamento fundamente-se no
paradigma jurídico antropocêntrico, pretende-se extrair do enunciado “meio ambiente
ecologicamente equilibrado” no caput artigo 225, da Constituição Federal, bem como das regras
contidas nos incisos I a VII e no parágrafo primeiro do mesmo dispositivo legal o valor
“integridade ecológica” proposto por Peter D. Burdon como vetor valorativo de interpretação das
normas jurídicas que estabeleçam contato com o interesse de proteção ambiental.
O estabelecimento de um eixo axiológico, pautado no conceito de integridade ecológica,
demonstra-se relevante para realçar o dever fundamental de proteção ao meio ambiente fora do
clássico esquema contratual de reciprocidade entre direitos e deveres.
Objetiva-se ainda destacar o dever fundamental de proteção ambiental para além da
titularidade subjetiva, de modo a configurar um direito-dever, objetivo de solidariedade, na linha
proposta por José Casalta Nabais. Um direito-dever que vincula não só a pessoa natural e a
pessoa jurídica de direito privado em seu status de proprietários e usuários dos recursos naturais,
como também o Estado em suas funções de legislar, instituir políticas e prestar jurisdição.

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