Uma ponderação entre inflação legislativa e justificações consequencialistas
Autor | Marcos Paulo Secioso |
Páginas | 243-269 |
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CAPÍTULO 10
Uma ponderação entre infl ação
legislativa e justifi cações
consequencialistas
Marcos Paulo Secioso
1. ENTRE OS PARADIGMAS
CAUSALISTA E FINALISTA
Os refl exos da tensão entre os paradigmas causa lista e fi na lista se espraiam por
diversos campos do saber e não poderia ser diferente no Direito e na prática de-
cisória. De um lado, milita a busca por expl icações, por causas, por parâmetros
que deram origem à situação presente para que, na aplicação do conhecimento
e sentimento em busca de Justiça, se alcance a melhor reparação possível de
eventual lesão detectada. Por outro, não há que se olvidar da estabilização das
relações, do futuro que aguarda e os refl exos das deci sões tomadas no presente.
Na vontade de atender ao causalismo e ao fi nalismo, posiciona-se quem
tem o poder de decisão e, não raras vezes, com um problema a resolver: qual
paradigma privilegiar quando não há como ser atendidos os dois senhores
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REFLEXÕES SOBRE DIREITO E ECONOMIA
do tempo (passado-presente/presente-futuro), pois a demanda da justa repa-
ração das causas está em conflito com os prognósticos de uma decisão que
necessita levar Justiça e valorização das relações para a lém do hoje?
Nesse dilema, há que se discutir “a aceitabilidade de justificações conse-
quencialistas no direito a parti r de uma tensão entre a orientação decisória
para o passado, que caracteriza tradicionalmente o raciocínio jurídico”11
em contraposição ao “foco de raciocínios preocupados com os efeitos de
possíveis alternativas de decisão”.12
Há, sem dúvida, um forte viés causalista na subsunção, na aplicação da
norma ao caso concreto, eis que esta presume uma articulação na qual, ve-
rificada uma situação passada, busca-se uma norma passada (vigente desde
sua edição no passado), para garantir a solução da demanda posta ao po-
der decisório. Entretanto, não há como afirmar que a regulação, através da
edição de normas, é puramente causalista, já que a própria norma poderá
empreender esforço para antever resultados e ponderá-los, garantindo um
viés finalista em sua força normativa.
Outra perspectiva para a mesma questão cinge-se à divi são entre retri-
butivistas e utilitaristas no que diz respeito à aplicação das sanções.
Defensor do retributivismo, Kant alça a punição a um imperativo ca-
tegórico, pois “sua imposição independe dos seus efeitos serem bons ou
ruins, é uma exigência moral”.13 Em total despreocupação consequencia-
lista, Kant entende que a punição não deve servir para promover um bem
para o criminoso ou para a sociedade, ou seja, “as consequências da puni-
ção não interessam a Kant”.14 Eis que a pessoa não deve servir como meio
para outros propósitos e uma pessoa deve receber o que for correspondente
às suas ações passadas; seu merecimento é consequência direta do que fez.
11. LEAL, Fer nando. Consequen cialismo, racion alidade e decis ão jurídica: o que a teori a da decisão
e a teoria dos jogos podem ofe recer. Rio de Janeiro: FGV, 2018, p. 1.
12. STRUCHINER; C HRISMANN, 2014, p. 147.
13. Ibidem, p. 147.
14. Ibidem, p. 148.
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