Os usos sociais do conceito de cultura: a legitimação de patrimônios por representações

AutorWillian Eduardo Righini de Souza - Giulia Crippa
CargoGraduado em Ciências da Informação e Documentação pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto - USP. Mestrando em Ciência da Informação pela Escola de Comunicação e Artes ? USP - Doutora em História Social pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas - USP. Professora Doutora do curso de Ciências da Informação e ...
Páginas199-218
DOI:10.5007/1984-8951.2011v12n101p219
Cad. de Pesq. Interdisc. em Ci-s. Hum-s., Florianópolis, v.12, n.101, p.199 -218, ago/dez 2011
Os usos sociais do conceito de cultura:
a legitimação de patrimônios por representações
The social uses of the concept of culture:
the legitimation of heritages by representations
Willian Eduardo Righini de Souza
1, Giulia Crippa2
RESUMO
O objetivo deste artigo é apresentar e discutir um estudo de caso sobre como as
noções de cultura utilizadas pelos moradores de uma pequena cidade do interior do
Estado de São Paulo, Santa Rosa de Viterbo, influenciam e participam da formação
e legitimação de patrimônios culturais locais. Observando a polissemia desta
palavra, realizaram-se entrevistas para verificar as representações sociais de
determinado grupo de habitantes sobre o que é considerado cultura e pode ser
entendido como patrimônio nesta cidade. A partir de dois exemplos, que são a
Banda Sinfônica e a Semana Universitária, discutimos como uma mesma definição
de cultura pode produzir efeitos diferentes dependendo dos sujeitos sociais e dos
ambientes nos quais ela é utilizada.
Palavras-chave: Cultura. Patrimônio cultural. Memória social.
ABSTRACT
The aim of this paper is to present and discuss a case study on how the notions of
culture used by residents of a small town of São Paulo State, Santa Rosa de Viterbo,
influence and participate of the formation and legitimation of local cultural heritage.
Noting the polysemy of this word, interviews were conducted to verify the social
representations of a determined group of inhabitants about what is considered
culture and can be understood as heritage in this city. From two examples, which are
the Symphonic Band and the University Week, we discuss how the same definition of
culture can produce different effects depending on the social subjects and the
environments in which it is used.
Keywords: Culture. Cultural heritage. Social memory.
1Graduado em Ciências da Informação e Documentação pela Faculdade de Filosofia, Ciências e
Letras de Ribeirão Preto - USP. Mestrando em Ciência da Informação pela Escola de Comunicação e
Artes USP.
2Doutora em História Social pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas - USP.
Professora Doutora do curso de Ciências da Informação e Documentação da Faculdade de Filosofia,
Ciências e Letras de Ribeirão Preto e do programa de pós-graduação em Ciência da Informação da
Escola de Comunicação e Artes - USP.
Esta obra foi licenciada com uma Licença Creative Commons - Atribuição 3.0 Não Adaptada.
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Cad. de Pesq. Interdisc. em Ci-s. Hum-s., Florianópolis, v.12, n.101, p.199 -218, ago/dez 2011
1 INTRODUÇÃO
Como identificar um patrimônio cultural? Por que alguns bens são
reconhecidos como símbolos de uma cidade e outros não? Como são justificados e
legitimados os seus valores? Muitas vezes, a concepção de que sua relevância é
evidente e inerente à sua materialidade acaba por ocultar o processo que explica
sua seleção e as percepções e representações sociais.
No Brasil, durante praticamente todo o século XX, a determinação do que era
ou não patrimônio nacional ficou a cargo de especialistas e técnicos do Instituto do
Patrimônio Histórico e Artístico nacional (IPHAN) que, primeiro, verificavam quais
eram os valores históricos e artísticos/ estéticos de uma obra para, depois, definirem
se esta deveria ser vista como memorável para a história da nação. O resultado foi a
preservação maciça de obras de origem portuguesa e religiosa católica do s séculos
XVI, XVII e XVIII (FONSECA, 2005).
Uma mudança de perspectiva iniciou-se em 1975 com a criação do Centro
Nacional de Referência Cultural
3 (CNRC) e a presidência do IPHAN por Aloísio
Magalhães entre 1978 e 1982, que ao questionarem as políticas até então vigentes
ampliaram as noções de bem e patrimônio cultural, culminando em uma nova
definição na Constituição Federal de 1988, marcada pelo reconhecimento dos
diferentes grupos que formam a sociedade brasileira e suas práticas:
Art. 216. Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza
material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de
referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos
formadores da sociedade brasileira (...) (BRASIL, 1988).
A partir de então, cada vez mais, os responsáveis por essas políticas têm
considerado, além das características arquitetônicas, estilísticas, artísticas etc., o
olhar da população sobre um bem, possibilitando que entre os patrimônios culturais
se incluam desde pinturas corporais a pratos típicos.
De modo geral, essa transformação reflete os diferentes usos da ideia de
cultura pelas instituições do setor. Antes da criação do CNRC e a presidência de
Aloísio Magalhães, as obras tombadas se referiam principalmente à cultura erudita e
3 O CNRC desenvolveu projetos culturais em áreas que, na época, eram pouco exploradas em âmbito
federal: artesanato; levantamentos socioculturais; história da tecnologia e da ciência no Brasil e
levantamento de documentação sobre o Brasil.

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