Verdade Real e Verdade Formal

AutorManoel Antonio Teixeira Filho
Páginas32-35

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Comentário

A busca da verdade constitui, em todos os tempos, grande preocupação da maioria dos filósofos; alguns deles, diante da dificuldade em apreendê-la, chegaram até mesmo a descrer da sua existência. Agostinho, o Mestre do Ocidente, por exemplo, quando envolvido pelos erros do maniqueísmo, na informação de Johannes Hirschberger (História da filosofia da Idade Média. São Paulo: Herder, 1966. p. 33), pôs-se, inclusive, a duvidar da verdade. Já outros, como o notável Sócrates (Platão. In: Fédon), foram condenados à morte por amá-la e defendê-la. Segundo Bertold Brecht (Galileu Galilei), ela é filha do tempo; não da autoridade.

Não apenas à religião, à filosofia e à arte, contudo, interessa a verdade, mas também à ciência em geral, e em particular à jurídica, dentre cujos ramos sobressai o processual.

Daí por que o conceito de verdade varia, necessariamente, segundo a óptica sob a qual se procura defini-la: filosófica, religiosa, jurídica, científica, etc.

O interesse do Direito pela verdade reside, entre outros motivos, em que, uma vez demonstrada nos autos, ela tem eficácia para constranger o julgador a decidir em consonância com o que espelha ou parece espelhar (CPC, art. 131); isso significa, portanto, que a verdade, consubstanciada na prova dos autos, vincula a formação do convencimento do juiz, no tocante aos fatos da causa.

No próprio âmbito da ciência processual, entretanto, o conceito de verdade não é unitário; fraciona-se, para tornar-se, no mínimo, dicotômico, porquanto aqui se proclama a existência de uma verdade real (ou substancial) e de outra, formal (ou processual).

Real é a que se pode denominar de verdade em si, vale dizer, aquilo que efetivamente aconteceu no mundo sensível; formal é a que se estabelece nos autos, como resultado da atividade probatória desenvolvida pelas partes. Nem sempre, todavia, a verdade formal corresponde à real, o que é sobremaneira lamentável e atentatório à respeitabilidade do processo como instituição jurídica e como instrumento estatal de composição dos conflitos intersubjetivos de interesses.

Observa Lopes da Costa (Apud Antônio Lamarca. Ação na justiça do trabalho. Rio de Janeiro: Edições Trabalhistas, 1968. p. 115), com percuciência, que a investigação da verdade não se reduz a um problema de lógica, pois também o é político; e conclui: “a

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verdade, que no processo se apura, pode coincidir com a verdade real, mas também pode desta afastar-se, sem embargo de ser como verdade proclamada”.

A causa desse descompasso entre ambas só pode ser atribuída à incúria, à negligência da parte, que não quis ou não soube (não pôde é inadmissível, em face da ampla possibilidade legal) trazer a juízo a verdade real. Admitamos, e. g., que o empregado tenha, realmente, trabalhado em jornada excedente à ordinária, ou no período noturno, postulando, em decorrência, os direitos que destes fatos derivam. Esta seria, na hipótese, a verdade real. Para que ela seja reconhecida pela sentença (e, como consectário, para que o empregado tenha acolhida a sua pretensão), contudo...

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