Papel científico da desaposentação

AutorWladimir Novaes Martinez
Ocupação do AutorAdvogado especialista em Direito Previdenciário
Páginas243-249

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O fenômeno jurídico da desaposentação nasceu como cogitação doutrinária; ele se transformou em tese científica, evoluiu ao longo do tempo e graças aos especialistas em Direito Previdenciário; hoje é reconhecido como um instituto técnico.

Com isso ele suscitou aos operadores do direito estudarem alguns conceitos não tão afeitos ao Direito Previdenciário e outros mais que passaram despercebidos ou até ignorados (até porque, então, não eram úteis à proposição).

Instituto técnico

A possibilidade do desfazimento de um ato administrativo perfeito exigiu uma construção doutrinária, erigindo a desaposentação como um instituto técnico.

Nessas condições, poderia e merecia ser considerado diante de um pedido inusitado. Prova convincente disso são cerca de 100 mil ações que tramitam na Justiça Federal (num universo potencial de cerca de 480 mil aposentados trabalhando), as dúvidas que angustiaram os magistrados, as variadas posições assumidas em relação à necessidade de restituição ou não das contribuições e das simulações.

Em 9.12.11, quando o Plenário Virtual do STJ declarou Repercussão Geral, uma espécie de simulação da matéria, a Mais Alta Corte deu a entender que a questão precisava ser disciplinada pelo Congresso Nacional (RE n. 661.256).

A presença de suas características e pressupostos pôs fim às incertezas de poder ser uma mera elucubração doutrinária, como muitas vezes se veem alhures.

Estudo da renúncia

Grossus modo, na previdência social, até então, em matéria de prestações as diver-gências doutrinárias e jurisprudenciais se sediavam na comprovação de convencimento de fatos materiais. Poucas ações tratavam do direito em tese.

Tinha-se assentada uma posição aparentemente insofismável: que um dia todos os segurados queriam a concessão de um benefício.

Obviamente, poucos pensaram na possibilidade contrária. Como também, por sinal, também poucos estudiosos expressaram a sua preocupação com a transformação de uma prestação em outra. Os vários institutos utilizados do dia a dia, verdadeiramente estariam consolidados.

A desaposentação ensejou aos estudiosos meditarem juridicamente na figura da renúncia, que parecia sediar-se apenas no Direito do Trabalho ou no Direito Civil.

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Ela não teria cabimento no Direito Previdenciário; não passava pela ideia das pessoas que alguém quisesse abdicar de um bem tão significativo e buscado (ainda que fosse para trocá-lo por outro de maior valor).

Subjetividade do direito

Quando o Decreto Legislativo n. 4.682/1923 (Lei Eloy Marcondes de Miranda Chaves) criou a contribuição em correspondência com a prestação, o direito subjetivo previdenciário se tornou uma realidade jurídica.

O benefício previdenciário nasceu como direito subjetivo dos segurados, é impenhorável e intransferível. Não sendo um prêmio (como fora para as prestações dos servidores públicos até 1993), e por isso, jamais o INSS cogitou de pôr fim ao benefício desmotivadamente.

Caráter patrimonial

Nestas condições esse direito assume natureza patrimonial. Principalmente o tempo de contribuição, que é intocável e, preenchidos os requisitos legais se torna direito e direito adquirido. Claro, por convenção, um bem intransferível para terceiros.

Disponibilidade de bens

Sendo patrimonial, se fosse disponível - e é -, nada impediria, por parte do aposentado desistir de uma prestação menor para possuir uma maior.

Ato jurídico perfeito

A concessão de um benefício por parte do órgão gestor da previdência social é ato administrativo cercado de cuidados, técnicas, condições, pressupostos e presunções, consistindo num ato jurídico perfeito (obviamente quando a instrução do pedido atender à lei).

Historicamente, diante do espanto da novidade que apresentou no seu dealbar da desaposentação, ela foi tida como contrária ao ato jurídico perfeito, equivocadamente, invocando-se o art. 5º, XXXVI, da Carta Magna. Foi talvez o maior equívoco científico praticado e que agora, em 2013, raramente comparece numa sentença.

Argumentam alguns autores, como um segurado poderia desfazer por vontade própria um ato administrativo regular, legal e legitimamente consumado?

O ato jurídico perfeito não é garantia constitucional da Previdência Social em face do segurado, mas ao contrário; do titular do direito em face da Administração Pública.

Em sã consciência, se esse titular pretender desfazer o que foi legitimamente deferido, convindo apenas examinar tal atitude em face da norma pública...

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