Ação rescisória

AutorLeonardo Tibo Barbosa Lima
Páginas406-429
406 Leonardo Tibo Barbosa Lima
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Ação Rescisória
16.1 CONCEITO, NATUREZA JURÍDICA E FINALIDADE
A ação rescisória é uma ação autônoma, que tramita em sede de processo de conhecimento, com rito especial.
Sua finalidade é rescindir a coisa julgada, isto é, desconstituir uma decisão de mérito proferida em outro processo,
contra a qual já não caiba recurso. Ela difere, portanto, do recurso, uma vez que este é um meio de impugnação
(decorrente da extensão do direito de ação do autor ou de defesa do réu) incidental (dentro do mesmo processo)
cuja sentença ainda não transitou em julgado.
16.2 FUNDAMENTO
O ordenamento jurídico tem como um de seus pilares a segurança jurídica (art. 5º, caput , da CF), razão
pela qual a Constituição protege o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada (art. 5º, XXXVI).
É desejável, portanto, em nome da segurança jurídica, que as decisões judiciais sejam cumpridas e mantidas
estáveis. Entretanto, há decisões que contêm certos tipos de vícios que, uma vez preservadas, colocariam em
risco a própria segurança jurídica. É o caso, por exemplo, de uma sentença proferida por um Juiz Militar, que
condenasse um empregador a pagar horas extras a seu empregado. Uma decisão dessa natureza, proferida por um
Juiz absolutamente incompetente, colocaria em risco a organização da jurisdição nacional, o que justifica a sua
rescisão.
Com efeito, as decisões judiciais podem conter vícios de existência (impedem a própria constituição da
decisão), de validade (embora constituída, a decisão fere normas cogentes de ordem pública) e de eficácia (a
decisão está validamente constituída, mas ainda não pode produzir todos os seus efeitos).
Por exemplo: uma sentença proferida por alguém que não seja Juiz é inexistente; se o Juiz for absolutamente
incompetente, como no exemplo citado no parágrafo anterior, ela será inválida; caso o Juiz seja competente, mas
não tenha determinado a remessa necessária, em caso de decisão judicial desfavorável a ente público (art. 496 do
CPC), a sentença será ineficaz.
As decisões inexistentes e ineficazes não transitam em julgado. A primeira, porque sequer pode ser
considerada uma decisão judicial e, a segunda, porque a falta de eficácia impede que o próprio prazo recursal seja
deflagrado.(707) Por isso, esses vícios podem ser objeto de saneamento por quaisquer meios, como recurso, exceção
(707) A sentença prolatada que, embora existente e válida, não tiver chegado ao conhecimento da parte, quanto a ela é ineficaz. O prazo
para o recurso terá início no momento em que a parte for intimada da sentença.
Lições de Direito Processual do Trabalho Teoria e Prática 407
de pré-executividade, mera petição ou até mesmo de ofício pelo Juiz. É o que dispõe o CPC: os atos de disposição de
direitos, praticados pelas partes ou por outros participantes do processo e homologados pelo juízo, bem como os atos
homologatórios praticados no curso da execução, estão sujeitos à anulação, nos termos da lei” (art. 966, § 4º).
Já as decisões inválidas, muito embora eivadas de vícios, transitam em julgado após o decurso do prazo para
interposição de recurso. Em outras palavras, a decisão permanece, presumidamente, válida, e deve ser cumprida,
a não ser que seja desconstituída pela ação rescisória.
Entretanto, nem todos os vícios de validade autorizam o ajuizamento da ação rescisória, senão aqueles
descritos no rol taxativo do art. 966 do CPC, o qual será objeto de exame neste capítulo. O fundamento para
o ajuizamento da ação rescisória é, pois, a existência de um vício de validade descrito no art. 966 do CPC. O
cabimento dessa ação no Processo do Trabalho está autorizado pelo art. 836, da CLT, pelo que fica superada a
16.3 OBJETO
As ações rescisórias visam a desconstituir acordos e decisões judiciais, estas podendo ser sentenças (de Juízes
do Trabalho) ou acórdãos (de Tribunais). Despachos e decisões interlocutórias, portanto, não podem ser objeto
de ação rescisória.
No entanto, nem toda sentença ou acórdão podem ser rescindidos, senão aqueles que possuam decisão
de mérito e que tenham transitado em julgado, ou seja, as decisões que fizerem coisa julgada material. Por isso,
v. g., a decisão que considera preclusa a oportunidade de impugnação da sentença de liquidação não está sujeita
ao corte rescisório.(709)
O mesmo acontece em relação aos acordos. Estes podem ser extrajudiciais ou judiciais. Apenas os acordos
judiciais, surgidos durante o processo e homologados pelo Juiz, é que podem ser objeto de ação rescisória.
Sem embargo, o CPC de 2015 estabeleceu exceção, pela qual, desde que configurada uma das hipóteses do
art. 966, uma sentença transitada em julgado, sem julgamento de mérito, poderá ser rescindida quando impedir
(art. 966, § 2º): a) nova propositura da demanda;(710) b) a admissibilidade do recurso correspondente.(711)
Via de regra, a rescisão se faz em relação às questões que constam da decisão rescindenda, mais propriamente
em sua parte dispositiva. Todavia, existem questões processuais que, a despeito de não constarem da conclusão
da sentença ou do acórdão, podem dar ensejo à ação rescisória, desde que tenham servido de base para a decisão
de mérito.
Por isso, pode acontecer de uma decisão perfeita, sem vícios aparentes, ser rescindida, por estar fundamentada
em questões processuais viciadas.
Questões processuais são aquelas que dizem respeito ao procedimento, que não fazem coisa julgada. O defeito
das questões processuais é comumente chamado de error in procedendo. Se uma questão processual viciada tiver
servido de pressuposto de validade de uma sentença de mérito, esta pode ser rescindida (Súmula n. 412(712) do
(708) Súmula do STF n. 338: Não cabe ação rescisória no âmbito da Justiça do Trabalho.
(709) Orientação Jurisprudencial da SDI-II n. 134. Ação Rescisória. Decisão que declara preclusa a oportunidade de impugnação da
sentença de liquidação. Produção de coisa julgada formal. Irrescindibilidade. A decisão proferida em embargos à execução ou em agravo
de petição que apenas declara preclusa a oportunidade de impugnação da sentença de liquidação não é rescindível, em virtude de produzir
tão somente coisa julgada formal.
(710) Enunciado n. 85 do FNPT: “[...] A decisão rescindenda que extingue o processo sem resolução de mérito por acolhimento da coisa
julgada, apesar de possuir conteúdo meramente processual, comporta corte rescisório, pois impede a propositura de nova demanda.
(711) Enunciado n. 86 do FNPT: “[...] A decisão do TST que nega provimento ao agravo de instrumento interposto contra decisão do
Regional que não conheceu do recurso de revista é rescindível, ainda que não examine o mérito, uma vez que impede a admissibilidade do
recurso correspondente.
(712) Súmula do TST n. 412. “Ação rescisória. Regência pelo CPC de 1973. Sentença de mérito. Questão processual. “Sob a égide do CPC
de 1973, pode uma questão processual ser objeto de rescisão desde que consista em pressuposto de validade de uma sentença de mérito.
(ex-OJ n. 46 da SBDI-2 — inserida em 20.09.2000).

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