Acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo - PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL (Processo 0008910-43.2003.8.08.0024), 16/03/2018

Data16 Março 2018
Número do processo0008910-43.2003.8.08.0024
Data de publicação11 Abril 2018
Tribunal de OrigemVITÓRIA - 5ª VARA CRIMINAL
Classe processualApelação

PENAL/PROCESSO PENAL. APELAÇÕES CRIMINAIS.

1. DA PRELIMINAR DE NÃO CONHECIMENTO DO RECURSO DO MP PELA APRESENTAÇÃO SIMULTÂNEA DE EMBARGOS DE DECLARAÇÃO E APELAÇÃO / POSTERIOR APRESENTAÇÃO DE RAZÕES DA APELAÇÃO FORA DO PRAZO DE CINCO DIAS PARA RATIFICAÇÃO DO APELO. EXTEMPORANIEDADE. PRELIMINAR ACOLHIDA PARA NÃO CONHECER DO RECURSO DA ACUSAÇÃO.

1.1. De acordo com o princípio da singularidade, unicidade ou unirrecorribilidade recursal, em regra, não é possível a interposição simultânea de dois recursos contra uma mesma decisão judicial, de forma que, a rigor, não se conhece do segundo recurso (preclusão consumativa). Hipótese em que, após o julgamento dos embargos opostos pela acusação concomitantemente com o recurso de apelação, as razões recursais do apelo foram ofertadas no prazo do art. 600 caput do CPP (8 dias), mas fora do prazo estabelecido pelo art. 593 caput do mesmo diploma para interposição/ratificação do recurso (5 dias), o qual, caso observado, poderia suprir o vício, mas não foi o que ocorreu.

1.2. Ainda que se admita a interposição concomitante dos embargos e do apelo pela mesma parte, especialmente considerando que se tratam de recursos com funções distintas, haveria necessidade de ratificação no prazo de 5 (cinco) dias, pois o resultado dos embargos prejudicou a acusação, na medida em que, além de suprir a omissão quanto à determinação de confisco, supriu omissão relacionada à causa de aumento de pena pleiteada, afastando sua incidência, e, por isso, alterou os fundamentos da sentença e sua conclusão.

1.3. O Juízo de admissibilidade efetivado pelo julgador de origem, com base no qual foi determinada a intimação do MP para apresentar razões recursais, não vincula este órgão ad quem , que compete proferir juízo definitivo da admissibilidade dos recursos de sua competência, antes de apreciar o mérito.

1.4. Verificada a extemporaneidade do apelo criminal da acusação, não se conhece do recurso do MP.

2. DA PRELIMINAR SUSCITADA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO DE SEGUNDA INSTÂNCIA DE NÃO CONHECIMENTO DO RECURSO DE CORRÉ ABSOLVIDA NA ORIGEM COM BASE NO ART. 386, VII, DO CPP. INTERESSE RECURSAL EM ALTERAR O FUNDAMENTO QUE MOTIVOU A ABSOLVIÇÃO E EM RAZÃO DO SEQUESTRO DE BEM DE PROPRIEDADE DA CORRÉ. PRELIMINAR REJEITADA.

2.1. A apelante GIANNINI CORREIA NOGUEIRA recorreu da sentença que lhe absolveu com fulcro no art. 386, VII, do CPP (por não existir prova suficiente para a condenação), objetivando que seja reconhecido que o fato não constitui infração penal ou que ela não concorreu para infração penal (art. 386, III ou IV do CPP).

2.2. A parte possui interesse recursal em alterar o fundamento que motivou sua absolvição, de ausência de provas, para atipicidade da conduta que lhe foi imputada ou negativa de autoria, coautoria ou participação, que confere mais certeza quando ao não cometimento do fato delituoso narrado na denúncia.

2.3. No caso de ficar comprovado que a corré/apelante não concorreu para infração penal, por exemplo, a sentença repercute na esfera cível, nos moldes do art. 935, parte final, do Código Civil.

2.4. O interesse recursal também se faz presente contra a decisão de sequestro de imóvel, constante do bojo da sentença condenatória, que, embora em nome do marido da corré/apelante, também corréu/apelante, pertencia ao casal. Aferir se o bem foi adquirido ou não com recursos públicos desviados diz respeito ao mérito recursal.

2.5. Preliminar rejeitada.

3. DA REQUERIDA INSTAURAÇÃO DE INCIDENTE DE INSANIDADE MENTAL PARA A ACUSADA ANA MARÍZIA CRUZ NOGUEIRA. CORRÉ IDOSA E PORTADORA DE DOENÇA NEURODEGENERATIVA DE NATUREZA IRREVERSÍVEL EM ESTÁGIO AVANÇADO. SUSPENSÃO DO PROCESSO.

3.1. A corré/apelante ANA MARÍZIA CRUZ NOGUEIRA pugna pela instauração de incidente de insanidade mental (art. 149 e seg. CPP), juntando documentação médica que indica doença de Alzheimer em estágio avançado.

3.2. A doença de Alzheimer, neurodegenerativa, que atinge, sobretudo, pessoas com mais de sessenta e cinco anos de idade (e a Sra. ANA MARÍZIA conta hoje com 74 anos), possui natureza irreversível. Registre-se, por oportuno, que tal quadro de saúde somente foi noticiado nos autos quatro anos depois da data da sentença condenatória. Na ocasião, o laudo médico mais recente indicava avanço do quadro, com grave comprometimento da memória recente.

3.3. Nas suas razões recursais, protocoladas em 11/11/2015, a apelante não mencionou a enfermidade em questão, limitando-se a afirmar que, à época dos fatos, possuía arritmia cardíaca, hipertensão arterial, prolapso da válvula mitral e hipotiroidismo, o que já havia sido considerado para deferimento de prisão preventiva domiciliar.

3.4. Não se questionou, durante toda instrução, a integridade (higidez) mental da referida acusada, a qual, ao tempo dos fatos delituosos, era inteiramente capaz de entender o caráter ilícito dos fatos e de determinar-se de acordo com esse entendimento (não se aplicando a corré/apelante o disposto no art. 26, do CP).

3.5. Não haveria óbice de que o referido pleito, em caso de manutenção da condenação de primeira instância fosse submetido ao Juízo da Execução Penal, que, nos moldes do art. 682 do CPP, caso comprovada a doença por perícia médica oficial, determinaria a internação do sentenciado com doença mental superveniente em estabelecimento hospitalar adequado, onde fosse possível a sua custódia. Arts. 183 e 66, V, d, da Lei 7.210/84 (Lei de Execução Penal).

3.6. Não haveria que se cogitar, nesse caso, em cerceamento de defesa da corré/apelante, pela não instauração do incidente nesta fase, pois a enfermidade neurodegenerativa em estado avançado alegada (que possui natureza irreversível), surgiu após exercidos todos os meios legais de defesa, sendo esta a última instância para análise fático-probatória, após a qual, eventualmente confirmada a condenação, já seria possível o pleito ao juiz da execução.

3.7. Contudo, o precário estado de saúde da corré/apelante, já idosa, está bem demonstrado nos autos, por laudos médicos, exames e inclusive por fotografias, estando ela com doença neurodegenerativa em estágio avançado e se alimentando por meio de sonda.

3.8. O art. 184 do CPP dispõe que: Salvo o caso de exame de corpo de delito, o juiz ou a autoridade policial negará a perícia requerida pelas partes, quando não for necessária ao esclarecimento da verdade.

3.9. Considerando que está devidamente comprovado nos autos que sobreveio doença mental à corré/apelante, inclusive de natureza irreversível, entendo desnecessária, inclusive, a instauração do incidente pleiteado, impondo-se, desde logo, a suspensão do processo somente em relação à corré/apelante ANA MARÍZIA CRUZ NOGUEIRA, com fulcro no art. 152 do CPP, sendo também desnecessária medida de segurança, diante do quadro identificado nos autos, em que a acusada não oferece nenhum risco, ao contrário está recebendo cuidados médicos em uma casa de repouso.

3.10. Pelo exposto, indeferido o pedido de instauração de incidente de insanidade mental e determinada a suspensão do processo em relação à corré/apelante ANA MARÍZIA CRUZ NOGUEIRA.

4. DA PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA PELA INCOMPETÊNCIA DO JUÍZO DE PRIMEIRO GRAU EM RAZÃO DA PRERROGATIVA DE FORO DO CORRÉU PROCURADOR DO ESTADO. ART. 122, §7º, DA CONSTITUIÇÃO ESTADUAL. PEDIDOS DE SUSPENSÃO DA TRAMITAÇÃO DA PRESENTE DEMANDA EM RAZÃO DA ADI 2820/ES SUBMETIDA AO STF.

4.1. Prevê o §7º, do art. 122, da Constituição do Estado do Espírito Santo (acrescentado pela Emenda à Constituição Estadual n.º 35/2001), que: Os membros integrantes da Procuradoria Geral do Estado e da Procuradoria Geral da Assembleia Legislativa serão julgados e processados perante o Tribunal de Justiça.

4.2. O Juízo de origem, em decisão proferida nos idos de 2010, enfrentou a referida preliminar de incompetência absoluta do Juízo de primeiro grau, rejeitando-a, declarando incidentalmente a inconstitucionalidade do referido dispositivo da Constituição Estadual, o que foi reiterado na sentença.

4.3. A matéria, nos idos de 2003, foi submetida ao Supremo Tribunal Federal pela via do controle concentrado ou direta, por iniciativa do Governador do Estado à época, porém, até a presente data, ainda não houve manifestação do Pretório Excelso sobre a questão (ADI 2820/ES).

4.4. Este Tribunal, pela via incidental ou difusa, já se manifestou sobre a inconstitucionalidade do referido dispositivo, tanto sob o aspecto material (ausência de simetria da prerrogativa em relação à Constituição Federal), quanto formal (não observada a iniciativa do Governador do Estado).

4.5. A questão foi enfrentada pelo plenário deste E. Tribunal, sob a relatoria do E. Desemb. Ronaldo Gonçalves de Souza, nos autos do processo tombado sob o nº 100.05.003720-7, que, de forma unânime, além de declarar a inconstitucionalidade, também indeferiu o pedido de sobrestamento dos autos enquanto o Pretório Excelso não se manifeste nos autos da ADI 2820/ES.

4.6. No referido julgamento, foi assentado que a jurisprudência do STF é pacífica no sentido de que somente se deve suspender o curso da demanda estadual que vise ao controle concentrado de constitucionalidade. Todavia, tanto o controle feito pelo plenário deste Tribunal em 2006, quanto o ora em exame, são incidentais e não concentrados.

4.7. Ademais, não há motivo relevante para afastar o entendimento adotado pelo Plenário desta Corte, que declarou a inconstitucionalidade do §7º, do art. 122, da Constituição Estadual (CE), e provocar novo pronunciamento. Deve ser aplicado ao caso o §3º do art. 167, do RITJEES, que prevê: § 3º - A decisão que declarar a inconstitucionalidade ou rejeitar a arguição será de aplicação vinculativa. De acordo com o art. 949, parágrafo único, do CPC/2015, os órgãos fracionários dos tribunais não submeterão ao plenário ou ao órgão...

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