Acórdão Nº 0000017-21.2019.8.24.0036 do Primeira Câmara Criminal, 20-02-2020

Número do processo0000017-21.2019.8.24.0036
Data20 Fevereiro 2020
Tribunal de OrigemJaraguá do Sul
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão



ESTADO DE SANTA CATARINA

TRIBUNAL DE JUSTIÇA


Apelação Criminal n. 0000017-21.2019.8.24.0036, de Jaraguá do Sul.

Relatora: Desembargadora Hildemar Meneguzzi de Carvalho

APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME CONTRA A SAÚDE PÚBLICA. TRÁFICO DE DROGAS (ART. 33, CAPUT E §4º, DA LEI N. 11.343/06). PROCEDÊNCIA DA DENÚNCIA.

RECURSO DA DEFESA. PLEITO ABSOLUTÓRIO E DESCLASSIFICATÓRIO. ALEGADA FRAGILIDADE PROBATÓRIA. INOCORRÊNCIA. VERSÃO DEFENSIVA ISOLADA E CARENTE DE COMPROVAÇÃO. AUTORIA E MATERIALIDADE CARACTERIZADAS. APELANTE PRESO EM FLAGRANTE POR TER EM DEPÓSITO SUBSTÂNCIA ENTORPECENTE ILÍCITA. APREENSÃO DE MACONHA E CRACK. PEQUENA QUANTIDADE DE ESTUPEFACIENTE IRRELEVANTE SE COMPARADA À GRAVIDADE CONCRETA DO DELITO. EFICÁCIA COMPROVATIVA DO DEPOIMENTO DOS POLICIAIS ENVOLVIDOS NA OCORRÊNCIA NÃO DERRUÍDA. PRESUNÇÃO DE ATUAÇÃO PROBA DOS AGENTES DE SEGURANÇA PÚBLICA. INTERCEPTAÇÕES TELEFÔNICAS QUE DÃO CONTA DA PERPETRAÇÃO DA CONDUTA DELITUOSA. DESCLASSIFICAÇÃO PARA O DELITO DE PORTE DE DROGAS PARA USO PESSOAL (ART. 28 DA LEI N. 11.343/06). INVIABILIDADE. CONDIÇÃO DE USUÁRIO QUE NÃO AFASTA, POR SI SÓ, A RESPONSABILIZAÇÃO PENAL PELA NARCOTRAFICÂNCIA. ATIVIDADE CRIMINOSA QUE, COMUMENTE, VISA À MANUTENÇÃO DO PRÓPRIO VÍCIO. CONDENAÇÃO MANTIDA.

RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Criminal n. 0000017-21.2019.8.24.0036, da comarca de Jaraguá do Sul 2ª Vara Criminal em que é Apelante Roberto Fagner Alves Silva e Apelado Ministério Público do Estado de Santa Catarina.

A Primeira Câmara Criminal decidiu, por unanimidade, conhecer do recurso e negar-lhe. Custas legais.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Excelentíssimo Senhor Desembargador Carlos Alberto Civinski, com voto, e dele participou o Excelentíssimo Senhor Desembargador Paulo Roberto Sartorato.

Funcionou como representante do Ministério Público, o Excelentíssimo Senhor Procurador de Justiça Lio Marcos Marin.

Florianópolis, 20 de fevereiro de 2020.

Desembargadora Hildemar Meneguzzi de Carvalho

Relatora


RELATÓRIO

Denúncia: o Ministério Público ofereceu denúncia em face de Roberto Fagner Alves Silva, nos autos n. 0000017-21.2019.8.24.0036, dando-o como incurso nas sanções do art. 33, caput, da Lei n. 11.343/06, em razão dos seguintes fatos:

[...] No dia 4 de janeiro de 2019, por volta das 16h10min, no Bairro Tifa Martins, Jaraguá do Sul, os policiais militares abordaram Wesley Santos Raiol portando um torrão de maconha, que havia adquirido do denunciado Roberto Fagner Alves Silva.

Ato contínuo, a guarnição da Polícia Militar se deslocou até a residência do denunciado, situada na Rua Leopoldo Pedro da Silva, 187, Tifa Martins, Jaraguá do Sul, onde Roberto Fagner Alves da Silva mantinha em depósito sem autorização e desacordo com a determinação legal ou regulamentar, 1,5 gramas de crack, fracionadas em seis porções e 23 gramas de maconha, destinadas ao comércio, além de uma faca e uma tábua com resquícios de maconha, um telefone celular e a quantia de R$ 420,00.

Registre-se que a maconha e o crack são consideradas substâncias tóxicas entorpecentes capazes de causar dependência física e/ou psíquica, proibida em todo o Território Nacional, por disposição da Portaria nº 344, de 12.05.1998, da Secretaria de Vigilância Sanitária do Ministério da Saúde, atualizada pela RDC nº 7, de 26/02/2009, estando enquadrada na Lista F1 (Lista das Substâncias Entorpecentes de uso proscrito no Brasil), da mesma Portaria. [...] (fls. 1-3).

Sentença: O Juiz de Direito Samuel Andreis julgou PROCEDENTE a denúncia para "condenar Roberto Fagner Alves Silva ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 1 ano e 8 meses de reclusão, a ser cumprida no regime inicialmente aberto, e ao pagamento de 167 dias-multa, no valor unitário descrito na fundamentação, por infração ao art. 33, caput e § 4º, da Lei 11.343/06. A pena privativa de liberdade fica substituída por restritiva(s) de direitos na forma da fundamentação." (fls. 161-167).

Trânsito em julgado: muito embora não certificado pelo Juízo a quo, verifica-se que a sentença transitou em julgado para o Ministério Público (fls. 178-179).

Recurso de apelação de Roberto Fagner Alves da Silva: a defesa, por meio da Defensoria Pública do Estado de Santa Catarina, sustentou, em síntese, que não há provas que possam sustentar a condenação do apelante, pleiteando por sua absolvição.

Subsidiariamente, pugnou pela desclassificação do crime de tráfico de drogas para o delito de posse de drogas para consumo pessoal, previsto no art. 28 da Lei n. 11.343/06 (fls. 185-191).

Contrarrazões do Ministério Público: a acusação impugnou as razões recursais, postulando o conhecimento do recurso e a manutenção da sentença condenatória (fls. 196-208).

Parecer da Procuradoria-Geral de Justiça: o Excelentíssimo Senhor Procurador de Justiça Dr. Ernani Dutra opinou pelo conhecimento e o desprovimento do recurso (fls. 218-223).

Este é o relatório.


VOTO

Trata-se de recurso de apelação interposto por Roberto Fagner Alves Silva contra a sentença que o condenou ao cumprimento da pena privativa de liberdade fixada em 1 (um) ano e 8 (oito) meses de reclusão, a ser cumprida em regime inicialmente aberto, e ao pagamento da pena de multa fixada em 167 (cento e sessenta e sete) dias-multa, no valor mínimo legal, por reconhecer que praticou o crime descrito no art. 33, caput e § 4º, da Lei n. 11.343/06.

A pena privativa de liberdade foi substituída por 2 (duas) restritivas de direitos, quais sejam: a) multa, no valor de 1 (um) salário mínimo vigente na data da sentença, montante que reverterá oportunamente a uma entidade beneficente; e b) prestação pecuniária no valor de 2 (dois) salários mínimos vigentes na data da sentença, montante que reverterá oportunamente a uma entidade beneficente ou prestação de serviço à comunidade ou à entidade beneficente, que deve ser cumprida à razão de 1 (uma) hora de tarefa por dia de condenação, em local posteriormente definido.

1 - Do juízo de admissibilidade

O recurso preenche os requisitos extrínsecos e intrínsecos de admissibilidade, motivo pelo qual é conhecido.

2 - Do mérito

A defesa postula pela absolvição, sustentando insuficiência probatória nos autos, porque a tese de tráfico, em desfavor do apelante, não passaria de mera especulação. Subsidiariamente, pleiteia a desclassificação para o crime do art. 28 da Lei n. 11.343/06, pois as drogas apreendidas seriam destinadas para consumo próprio.

De pronto, mister tecer algumas considerações acerca do delito previsto no art. 33, caput, da Lei n. 11.343/06, in verbis:

Art. 33 - Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar:

Pena - reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa.

O tráfico de drogas é um crime de ação múltipla ou conteúdo variado, com formas distintas de violação da mesma proibição. Nos termos da doutrina técnica: "para a ocorrência de adequação típica o sujeito deverá praticar qualquer uma das condutas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar" (SILVA, César Dário Mariano. Lei de Drogas Comentada. 2ª ed. São Paulo: APMP Associação Paulista do Ministério Público, 2016, p. 77).

Nos autos, o apelante foi denunciado por "ter em depósito" droga ilícita para fins de comercialização. Quanto às ações nucleares do tipo, a doutrina leciona que ter em depósito implica em "conservar ou manter à sua disposição, sob sua guarda" (MARCÃO, Renato. Tóxicos: Lei 11.343, de 23 de agosto de 2006: Lei de Drogas. 10ª ed. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 98).

Em que pese a tese de defesa - fundada especialmente na fragilidade probatória acerca da configuração do delito -, o cotejo das provas produzidas nos autos permite que se atribua ao apelante, com segurança jurídica, as ações narradas na denúncia.

Segundo o processado, em 4 de janeiro de 2019, por volta das 16h10min, no Bairro Tifa Martins, em Jaraguá do Sul/SC, uma guarnição da Polícia Militar teria abordado o usuário Wesley Santos Raiol com 0,9g (nove decigramas) de maconha, o qual teria comprado o referido entorpecente do apelante Roberto Fagner Alves Silva. Munidos dessa informação, os policiais militares dirigiram-se à residência do recorrente, momento em que constataram que ele mantinha em depósito mais 6 (seis) porções de maconha (22,5g) e 1 (uma) porção de crack (0,9g), para fins de tráfico, além de R$420,00 (quatrocentos e vinte reais) em espécie.

A materialidade está caracterizada pelo Auto de Prisão em Flagrante (fl. 5), Boletim de Ocorrência (fls. 6-11), Auto de Apreensão (fl. 12), Laudo de Constatação Provisória (fl. 13), Laudo Pericial Definitivo n. 9201.19.00127 (fls. 45-47) e prova oral produzida em ambas as fases processuais (mídias audiovisuais de fls. 27 e 116-117).

É pertinente consignar o teor do Auto de Exibição e Apreensão, Laudo Preliminar de Constatação e Laudo Pericial Definitivo, todos juntados aos autos: 1 (uma) porção de substância branco-amarelada, sem embalagens, apresentando massa líquida de 0,9g (nove decigramas), tratando de crack, contendo a substância cocaína ou éster metílico de benzoilecgnonina na sua forma básica; 7 (sete) porções de erva, acondicionadas individualmente em embalagem de plástico verde, apresentando massa bruta de 22,5 (vinete e dois gramas e cinco decigramas) de cannabis sativa (maconha), declarando a presença da substância ativa tetraidrocanabinol (THC); e 1 (uma) porção de erva, acondicionada em embalagem de fita adesiva branca, apresentando a massa bruta de 0,7g (sete decigramas) de cannabis sativa (maconha), declarando a presença da substância...

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