Acórdão nº 0000018-49.1985.8.14.0012 do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, 1ª Turma de Direito Público, 06-03-2023

Data de Julgamento06 Março 2023
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
Ano2023
Número do processo0000018-49.1985.8.14.0012
AssuntoDívida Ativa (Execução Fiscal)
Órgão1ª Turma de Direito Público

APELAÇÃO CÍVEL (198) - 0000018-49.1985.8.14.0012

APELANTE: A FAZENDA PUBLICA DO ESTADO DO PARA, ESTADO DO PARÁ
REPRESENTANTE: PROCURADORIA GERAL DO ESTADO DO PARÁ

APELADO: ERNESTO DIAS MOREIRA E OUTROS

RELATOR(A): Desembargadora MARIA ELVINA GEMAQUE TAVEIRA

EMENTA

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE EXECUÇÃO FISCAL. ICMS. REMISSÃO FISCAL. INAPLICABILIDADE DO DECRETO ESTADUAL Nº 1.194/2008. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE ESTRITA (ART. 150, §6º DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL E ART. 172 DO CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL. INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 172 DO CTN. REFORMA DO JULGADO.

1. A concessão de remissão tributária somente é cabível mediante edição de lei específica, sendo inviável a sua instituição por meio de Decreto do Chefe do Poder Executivo Estadual.

2. Portanto, inaplicável o Decreto Estadual nº 1.194/2008 por violação ao princípio da estrita legalidade (art. 150, §6º da Constituição Federal e art. 172 do Código Tributário Nacional.).

3. Recurso conhecido e provido, à unanimidade.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os presentes autos.

ACORDAM os Exmos. Desembargadores que integram a egrégia 1ª Turma de direito público do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, à unanimidade de votos, CONHECER DO RECURSO E DAR-LHE PROVIMENTO, nos termos do voto da relatora.

Julgamento ocorrido na 6ª Sessão Ordinária do Plenário Virtual da 1ª Turma de Direito Público, Tribunal de Justiça do Estado do Pará, no período de 06 a 13 de março de 2023.

ELVINA GEMAQUE TAVEIRA

Desembargadora Relatora

RELATÓRIO

Trata-se de APELAÇÃO CÍVEL interposta pela FAZENDA PUBLICA ESTADUAL contra ERNESTO DIAS MOREIRA E OUTROS, em razão de sentença proferida pelo MM Juízo da 2ª Vara da Comarca de Cametá, que nos autos da AÇÃO DE EXECUÇÃO FISCAL (Proc. 0000018-49.1985.8.14.0012), ajuizada pelo apelante.

A decisão recorrida tem a seguinte parte dispositiva (ID Num. 7250680 - Pág. 1):

(...) Decido:

Sendo a matéria de ordem pública (CPC, art. 598 c/c art. 267, § 3º), deve o juiz verificar de oficio, em qualquer tempo ou grau de jurisdição, se estão presentes os pressupostos processuais que viabilizam o andamento do presente.

No caso vertente, o débito atualizado, conforme se constata através da planilha anexa, obtida através do site oficial do TJDFT, está abaixo do limite previsto no mencionado decreto estadual.

Diante do exposto, julgo extinta esta execução, nos termos do art. 598 c/c art. 267, VI, todos do CPC.

(...)

O Estado do Pará interpôs apelação (ID Num. 7250684 - Pág. 1 a 3), aduzindo que a sentença recorrida merece reforma, poiso juízo não poderia reconhecer a remissão, sem antes intimar a Fazenda Pública. Além do mais, para fins de remissão deve-se considerar a totalidade dos débitos do sujeito passivo.

Ao final, requer seja conhecido e provido o apelo para reformar integralmente a sentença recorrida.

Não foram oferecidas contrarrazões, conforme certidão ID Num. 7250691 - Pág. 1.

Coube-me a relatoria do feito por distribuição.

É o relato do essencial.

VOTO

Presentes os pressupostos de admissibilidade, CONHEÇO DA APELAÇÃO CIVEL, pelo que passo a apreciá-lo.

A questão em análise reside em verificar a possibilidade de aplicação do instituto da remissão dos créditos tributários por meio do Decreto Estadual n° 1194/08.

Entendo que a sentença merece reforma, em razão da remissão do crédito tributário concedida por meio de decreto do Chefe do Poder Executivo Estadual violar a regra prevista no art. 150, §6º da Constituição Federal, que assim dispõe:

§ 6º Qualquer subsídio ou isenção, redução de base de cálculo, concessão de crédito presumido, anistia ou remissão, relativos a impostos, taxas ou contribuições, só poderá ser concedido mediante lei específica, federal, estadual ou municipal, que regule exclusivamente as matérias acima enumeradas ou o correspondente tributo ou contribuição, sem prejuízo do disposto no art. 155, § 2.º, XII, g.

No mesmo sentido, o Código Tributário Nacional, no seu art. 172, assim dispõe:

Art. 172 - A lei pode autorizar a autoridade administrativa a conceder, por despacho fundamentado, remissão total ou parcial do crédito tributário, atendendo:

I - à situação econômica do sujeito passivo;

II - ao erro ou ignorância escusáveis do sujeito passivo, quanto a matéria de fato;

III - à diminuta importância do crédito tributário;

IV - a considerações de equidade, em relação com as características pessoais ou materiais do caso;

V - a condições peculiares a determinada região do território da entidade tributante.

Sendo assim, a concessão de remissão tributária apenas é possível mediante a edição de lei específica, sendo inviável a sua instituição por meio de Decreto Executivo.

Nesse sentido, colaciono julgados de nossa Corte de Justiça:

EMENTA: DIREITO CONSTITUCIONAL. AGRAVO INTERNO. INCONSTITUCIONALIDADE DO DECRETO Nº 1.194 DO GOVERNO DO ESTADO DO PARÁ. APLICAÇÃO DE REMISSÃO. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA ESTRITA LEGALIDADE. PRECEDENTES DO STF. I - Após a vigência das alterações introduzidas ao texto constitucional pela EC nº 03/93, para a concessão de benefícios fiscais de ICMS, são cumulativas as exigências contidas nos arts. 155, § 2º, XII, g, e 150, § 6º, da CF. II ? Decreto Governamental editado em total violação à regra constitucional acima referida, de modo que não pode ser utilizado para fins de aplicação da remissão. III Agravo provido (TJPA - APL: 00045166520058140301 BELÉM, Relator: ROSILEIDE MARIA DA COSTA CUNHA, 2ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA, DJE: 11/05/2018)

EMENTA: EMBARGOS INFRINGENTES. ACÓRDO, NO UNÂNIME, QUE ANULA, DE OFÍCIO, SENTENÇA SOB O ARGUMENTO DE INCONSTITUCIONALIDADE DE DECRETO GOVERNAMENTAL CONCESSÓRIO DE REMISSO. INCONSTITUCIONALIDADE RECONHECIDA. PRECEDENTES DO STF. I - Com a entrada em vigor da alteração introduzida pela EC nº 03/93, ao parágrafo 6º do art. 150 da CF, resta pacificado que a ratificação de convênio emanado do CONFAZ, referentes a favores fiscais para o ICMS, somente poderá ocorrer mediante lei formal, sendo certo que antes da mudança referida, a confirmação poderia ocorrer por intermédio de decreto. II Após a vigência das alterações introduzidas ao texto constitucional pela EC nº 03/93, para a concessão de benefícios fiscais de ICMS, são cumulativas as exigências contidas nos arts. 155, § 2º, XII, g, e 150, § 6º, da CF. III Precedentes do STF. EMBARGOS INFRINGENTES IMPROVIDOS. (TJPA, Acórdão nº 123.717, Relator Des. Roberto Gonçalves de Moura, DJE: 02/09/2013).

Corroborando com esse entendimento, destaco o posicionamento do Superior Tribunal de Justiça:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO RECEBIDOS COMO AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. ENTIDADE DE ORGANIZAÇÃO SOCIAL. ISENÇÃO. INEXISTÊNCIA DE LEI ESPECÍFICA. IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO PELO PODER JUDICIÁRIO. 1. A pacífica jurisprudência da Corte é firme no sentido de que “a outorga de qualquer subsídio, isenção ou crédito presumido, a redução da base de cálculo e a concessão de anistia ou remissão em matéria tributária só podem ser deferidas mediante lei específica” (ADI nº 1.247/PA-MC, Tribunal Pleno, Relator o Ministro Celso de Mello, DJ de 8/9/95). [...] 3. Agravo regimental não provido. (RE 579708 ED, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Primeira Turma, julgado em 04/06/2013, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-165 DIVULG 22-08-2013 PUBLIC 23-08-2013).

Nesse contexto, considerando que em matéria tributária vigora o princípio da legalidade estrita, segundo o qual somente a lei pode versar sobre a matéria, tem-se que a remissão aplicada ao caso não poderia ter sido ratificada e concedida pelo Decreto Governamental nº 1.194/2008, em total afronta ao que determina a Constituição Federal.

Com efeito, ante a inaplicabilidade do Decreto Estadual nº 1194/08, deve a sentença ser anulada, com o prosseguimento da execução.

Ante o exposto, nos termos da fundamentação. CONHEÇO E DOU PROVIMENTO AO RECURSO DE APELAÇÃO, para anular a sentença, determinando a remessa dos autos ao Juízo de origem para a continuidade do processo executório.

É como voto.

P. R. I.

Servirá a presente decisão como mandado/ofício, nos termos da Portaria nº 3731/2015-GP.

Belém (PA), 06 de março de 2023.

ELVINA GEMAQUE TAVEIRA

Desembargadora Relatora

Belém, 14/03/2023

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