Acórdão Nº 0000025-68.2018.8.24.0218 do Quarta Câmara Criminal, 07-04-2022

Número do processo0000025-68.2018.8.24.0218
Data07 Abril 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 0000025-68.2018.8.24.0218/SC

RELATOR: Desembargador ALEXANDRE D'IVANENKO

APELANTE: SHEILA RUTH VOLTOLINI (RÉU) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR) APELADO: MARILDA EIRAS KUNZ (ASSISTENTE DE ACUSAÇÃO) APELADO: GRACIELI ALVES (ASSISTENTE DE ACUSAÇÃO)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação criminal interposta pela ré Sheila Ruth Voltolini, inconformada com a sentença (Evento 402) proferida pelo Juízo da Vara Única de Catanduvas nos autos da ação penal n. 0000025-68.2018.8.24.0218, que a condenou ao cumprimento de pena de 1 (um) ano de detenção, em regime inicial aberto, por infração ao disposto no art. 121, § 3º do Código Penal, autorizada a substituição da pena privativa de liberdade por prestação de serviços comunitários (art. 44, I e § 2º, e 46, Código Penal).

Em síntese, a apelante, por meio de sua defensora constituída, argumentou o seguinte nas razões do presente recurso: [a] "a Lei nº 13.964/2019 acresceu ao Código de Processo Penal o art. 28-A que permite ao Ministério Público propor acordo de não persecução penal, cujas condições se aplicam ao caso em tela, eis que, a denúncia trata da prática de infração penal sem violência ou grave ameaça e com pena mínima inferior a 4 (quatro) anos. A inovação legal traz novo instrumento que busca reduzir a litigiosidade em processos criminais, permitindo solução consensual e, portanto, tal benesse não pode ser retirada da Apelante. No caso, o oferecimento da proposta sequer foi analisada pelo Representante do Ministério Público, pois, a lei que o instituiu é posterior ao oferecimento da denúncia. Entretanto, tal óbice não pode servir de empecilho para que o benefício seja proposto à Apelante. E, ao contrário do que entendeu o Juízo singular, nem mesmo o fato da lei ter entrado em vigor após o recebimento da denúncia pode impedir a análise da apresentação da proposta, pois, segundo o direito intertemporal, deve prevalecer a premissa de retroatividade da lei penal mais benéfica"; [b] "não há dúvida de que o acordo de não persecução penal, para além da cláusula extintiva de punibilidade (art. 28-A, §13º) após satisfeitas as condições acordadas e a par de não se tratar de abolitio criminis, traz benefícios não previstos na sistemática anterior, minimizando os efeitos da conduta praticada pelo agente, o que autoriza a aplicação do princípio da retroatividade da lei mais benéfica"; [c] "negar à Apelante o direito de ter seu processo encaminhado ao Ministério Público para análise de oferecimento de proposta de acordo de não persecução penal, implica em evidente nulidade processual, em face da afronta ao princípio da retroatividade da norma mais benéfica"; [d] "deve ser reconhecida a nulidade processual, pelo não encaminhamento dos autos ao Representante do Ministério Público para análise de oferecimento da proposta de acordo de não persecução penal, razão pela qual deve ser provido o presente recurso e determinado o retorno dos autos ao Juízo de Primeiro Grau para verificação de eventual possibilidade de oferecimento do acordo de não persecução penal previsto no art. 28-A do Código Penal, introduzido pela Lei nº 13.964/2019"; [e] "a r. sentença condenatória foi proferida pelo douto Magistrado LEANDRO ERNANI FREITAG, entretanto a instrução processual, inclusive, a própria cautelar de antecipação de provas, foi toda acompanhada e realizada pelo Dr. JOSÉ ADILSON BITTENCOURT JUNIOR. Mister observa que não há nenhuma justificativa nos autos sobre as razões que levaram ao Dr. Leandro proferir a sentença condenatória em substituição ao juiz que instruiu o feito. Assim ocorrendo, observa-se que houve afronta ao princípio da identidade física do juiz, materializado no parágrafo 2º, do artigo 399, do CPP, segundo o qual 'O juiz que presidiu a instrução deverá proferir a sentença'"; [f] "a Ré sempre negou que os fatos ocorreram na forma como narrada na exordial. A Recorrente nunca admitiu os fatos que lhe são injustamente imputados. E, o conjunto probatório não permite o reconhecimento da culpa da Ré, razão pela qual, a r. sentença deve ser integralmente reformada para que a Ré seja absolvida"; [g] "a Recorrente como médica sempre se portou com demonstração de conhecimento sobre o que estava ocorrendo, em momento algum abandou o paciente e as medicações que prescreveu foram corretas e necessitavam aguardar a evolução, o que somente não ocorreu porque o paciente foi retirado, a pedido, do seus cuidados"; [h] "o Dr. Norberto Rauen afirmou em juízo que o uso de corticóide é sim a primeira providência médica que deveria ser tomada, ou seja, a Recorrente agiu corretamente, não ficou aguardando, não foi omissa e agiu dentro das determinações da literatura médica"; [i] "se o medicamento receitado pela Recorrente tem poder antialérgico e usado para quadros de insuficiência respiratória (situação essa citada na r. sentença como um motivo que deveria ter levado atenção à Ré), evidente que esse era o medicamento que deveria ser usado na vítima, como de fato foi. Inclusive, essa é a conclusão que se chega da oitiva do próprio Perito contratado pela Assistente de Acusação"; [j] "não se pode atribuir culpa à Ré pela não utilização da adrenalina, pois, até o momento em que a vítima estava sob os cuidados da Ré, tal não se fazia necessária (vítima estável, monitorada por oxímetro que não acusava queda da oxigenação). Fato este confirmado pelo médico Norberto em seu depoimento"; [k] "ao contrário do que entendeu a r. sentença, o paciente nunca ficou desassistido e a Ré sempre soube o que estava fazendo, pois, monitorava o paciente que já havia sido corretamente medicado e aguardava evolução. Evolução essa que foi prejudicada por seus familiares, que retiraram o paciente dos cuidados médicos, o colocaram em um veículo particular e conduziram o veículo por longo trecho, sem qualquer acompanhamento médico"; [l] "a vítima apresentou os mesmos sintomas durante todo o dia em que esteve no hospital, o que impedia que a Ré reconhecesse a ocorrência de eventual choque anafilático durante o período em que a vítima estava sob sua observação e cuidados. Entretanto, ao ser retirado a vítima desta observação, a irmã da vítima assumiu todo o risco, inclusive, temos neste momento uma quebra do nexo causal, pois, uma nova situação colocou em risco a vítima, qual seja, o transporte até outro hospital, sem monitoração médica"; [m] "restam sérias dúvidas sobre a ocorrência do choque anafilático, pois se assim estava, não chegaria ao hospital de joaçaba deambulando, segurando a receita em mãos, muito menos, o médico plantonista seria perito o suficiente para intubar o paciente com um tubo n.º 8.0 se a garganta já estivesse fechada por edema na 1ª tentativa"; [n] "o conjunto probatório existente nos autos enfraquece a imputação de negligência, porque respalda a conduta médica da Ré que não deixou o paciente desassistido, o medicou de maneira correta para o momento e o manteve em observação para acompanhar a evolução clínica, sendo certo que se de fato tivesse o paciente agravado a situação para o choque anafilático, o mesmo estaria em ambiente hospitalar, com a presença da Ré que poderia ministrar outros medicamentos".

Concluiu requerendo o provimento do recurso, para: "a) seja reconhecida a nulidade processual existente nos autos decorrente do não encaminhamento dos autos ao representante do Ministério Público para análise de oferecimento de proposta de acordo de não persecução penal, o que é direito subjetivo da Recorrente, importante a omissão em cerceamento de defesa e nulidade processual, passível de ser sanada com o encaminhamento dos autos ao Juízo singular para correção; b) alternativamente, que seja reconhecida a nulidade da r. sentença recorrida, ante a afronta ao princípio da identidade física do Juiz, fazendo os autos retornarem ao Juízo de Primeiro Grau para saneamento da nulidade; c) caso não sejam acolhidas as preliminares, que no exame do mérito da presente ação penal, seja totalmente reformada a r. sentença singular para reconhecer a inexistência de prova da conduta ilícita da Recorrente e do nexo causal entre sua conduta e o resultado imputado e, consequentemente, absolver a Recorrente da imputação que lhe foi imposta, pelas razões expostas nesta peça" (Evento 431).

Com as contrarrazões (Eventos 435 e 438), os autos ascenderam a este Tribunal.

Lavrou parecer pela douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. Ernani Dutra, que se manifestou pelo conhecimento e não provimento do recurso (Evento 10 - promoção 1).

Este é o breve relatório que submeto ao Desembargador Revisor.

Documento eletrônico assinado por ALEXANDRE DIVANENKO, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc2g.tjsc.jus.br/eproc/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 1873147v15 e do código CRC dfacee43.Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): ALEXANDRE DIVANENKOData e Hora: 23/2/2022, às 17:10:6





Apelação Criminal Nº 0000025-68.2018.8.24.0218/SC

RELATOR: Desembargador ALEXANDRE D'IVANENKO

APELANTE: SHEILA RUTH VOLTOLINI (RÉU) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR) APELADO: MARILDA EIRAS KUNZ (ASSISTENTE DE ACUSAÇÃO) APELADO: GRACIELI ALVES (ASSISTENTE DE ACUSAÇÃO)

VOTO

Presentes os pressupostos de admissibilidade, o recurso há de ser conhecido.

Como visto dos autos, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina (MPSC), por meio da Promotoria de Justiça da Comarca de Catanduvas, ofereceu denúncia contra SHEILA RUTH VOLTOLINI, imputando-se a prática do crime previsto no art. 121, §§ 3º e 4º, do Código Penal, em razão dos seguintes atos ilícitos narrados na peça acusatória (Evento 154):

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