Acórdão Nº 0000062-12.2019.8.24.0008 do Quinta Câmara Criminal, 11-03-2021

Número do processo0000062-12.2019.8.24.0008
Data11 Março 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 0000062-12.2019.8.24.0008/SC

RELATORA: Desembargadora CINTHIA BEATRIZ DA SILVA BITTENCOURT SCHAEFER

APELANTE: MARCIO RIBEIRO DOS ANJOS (ACUSADO) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

O Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofertou denúncia em face de Márcio Ribeiro dos Anjos, imputando-lhe a prática do crime previsto no art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006, conforme os seguintes fatos narrados na peça acusatória (evento 15 da ação penal):

No dia 7 de janeiro de 2019, segunda-feira, após denúncias que relatavam que o condutor de uma motocicleta RD 135CC de cor azul estaria promovendo o tráfico de drogas nas imediações da Rua Doutor Pedro Zimmermann, Bairro Itoupava Central, no Município de Blumenau, policiais militares que estavam em policiamento ostensivo na região, quando avistaram a motocicleta com aquelas características sendo estacionada no pátio do Posto Zandoná, localizado na altura do nº 2600 da Rua Pedro Zimmermann, nesta cidade, resolveram abordar o piloto, o qual, ao perceber a ação policial, afastou-se da motocicleta e caminhou rapidamente em direção contrária aos policiais. Contudo, os policiais o abordaram e o identificaram como sendo o denunciado e, em revista pessoal realizada, localizaram e apreenderam, nos bolsos das suas vestes, grande quantidade de comprimidos de MDMA e/ou MDA, droga que o denunciado trazia consigo e momentos antes transportou para fins de comercialização (venda, exposição à venda, oferecimento, entrega a consumo e fornecimento), sem autorização e em desacordo com determinação legal e regulamentar. Na sequência, o denunciado informou aos policiais que possuía mais entorpecentes no interior da sua residência, localizada na Rua Carlos Henrique Mulhmann, nº 89, Bairro Velha Grande, no Município de Blumenau/SC, tendo, então, os policiais se dirigido até o local, onde localizaram e apreenderam, mais comprimidos e fragmentos de MDMA e/ou MDA.

A droga apreendida, somada e periciada, consistiu em 579 comprimidos de MDMA e/ou MDA e diversos fragmentos de comprimidos de MDMA e/ou MDA, acondicionados em embalagem de plástico (conforme Auto de Constatação nº 0004/2019 de fl. 16).

O réu foi notificado (evento 27 da ação penal) e apresentou defesa preliminar (evento 30 da ação penal).

Recebida a defesa e, não sendo o caso de absolvição sumária, a denúncia foi recebida e designada audiência de instrução (evento 34 da ação penal).

Na instrução foram inquiridas as testemunhas arroladas pela acusação e pela defesa, bem como o réu foi interrogado (evento 128 da ação penal).

Encerrada a instrução processual e apresentadas as alegações finais (eventos 151 e 155 da ação penal), sobreveio a sentença (evento 157 da ação penal) com o seguinte dispositivo:

Ante o exposto, julgo procedente o pedido contido na denúncia para condenar Márcio Ribeiro dos Anjos, filho de Cacilda Oliveira dos Anjos e de Néri Ribeiro dos Anjos, à pena privativa de liberdade de 5 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão, a ser cumprida em regime inicialmente fechado, sem prejuízo do pagamento de 583 (quinhentos e oitenta e três) dias-multa (pena principal), no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época do fato, devidamente corrigido até o efetivo pagamento, por infração ao art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006 c/c art. 61, I , e art. 65, III, "d", ambos do Código Penal.

Inconformado o réu interpôs recurso de apelação (evento 165 da ação penal). Em suas razões pugna por absolvição, sob argumento de insuficiência probatória acerca de sua atuação na mercancia de drogas, pois apenas não passou de "mula". De forma subsidiária, requer afastamento do aumento da pena em razão da natureza da substância entorpecente ou ajuste na fração para 1/6 (um sexto); afastamento do agravamento decorrente da reincidência; diminuição da pena de multa; aplicação da causa de diminuição de pena prevista no art. 33, § 4º, da Lei de Drogas; fixação de regime inicial mais brando. Nos pedidos finais, acrescentou pleito para restituição dos valores e aparelho celular apreendidos, bem como pelo reconhecimento do seu direito de recorrer em liberdade até o trânsito em julgado de todos os recursos (evento 177 da ação penal).

Apresentadas as contrarrazões (evento 191 da ação penal), os autos ascenderam a este Tribunal de Justiça.

Lavrou parecer pela Douta Procuradoria-Geral de Justiça a Exma. Sra. Dra. Jayne Abdala Bandeira, manifestando-se pelo conhecimento e desprovimento do recurso (evento 12).

VOTO

Presentes os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso.

Como sumariado, trata-se de recurso de apelação criminal interposto pelo réu Márcio Ribeiro dos Anjos, o qual busca a reforma da sentença proferida pelo MM. Juiz de Direito da 3ª Vara Criminal da Comarca de Blumenau que condenou-o à pena privativa de liberdade de 5 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão, a ser cumprida em regime inicialmente fechado, sem prejuízo do pagamento de 583 (quinhentos e oitenta e três) dias-multa (pena principal), no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época do fato, devidamente corrigido até o efetivo pagamento, por infração ao art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006 c/c art. 61, I , e art. 65, III, "d", ambos do Código Penal.

O apelante pugna por absolvição, sob argumento de insuficiência probatória acerca de sua atuação na mercancia de drogas, pois apenas não passou de "mula".

Adianto, razão não lhe assiste.

Dispõe o art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006:

Art. 33. Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar:Pena - reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa.

Verifica-se, então, que o dispositivo legal traz diversos núcleos verbais, nascendo um tipo misto alternativo, de conduta múltipla ou conteúdo variado, ou seja, a prática de várias condutas previstas no tipo, num mesmo contexto fático, ensejará um único crime.

Por outro lado, a prática de qualquer uma das dezoito condutas é suficiente para configurar o crime, não se exigindo o flagrante da venda ou entrega da substância.

Sobre o tema Guilherme de Souza Nucci discorre:

Todas as dezoito condutas, cujo objeto é a droga, que não deixa de ser substância (matéria que possui propriedades específicas) entorpecente (algo tóxico que provoca alterações psíquicas e analgésicas) ou que determine (provoque necessariamente) dependência (sujeição) física (estado mórbido provocador de alteração do organismo) ou psíquica (estado mórbido provocador de alteração mental, gerando sensação de bem-estar). Todas condutas passam a ter, em conjunto, o complemento ainda que gratuitamente (sem cobrança de qualquer preço ou valor). Logo, é indiferente haver ou não lucro, ou mesmo o intuito de lucro. (Leis Penais e Processuais Penais Comentadas. São Paulo: Revista dos Tribunais, 4a ed., 2009. p. 346).

Rogério Sanches Cunha, Ronaldo Batista Pinto e Renee de Ó Souza não destoam:

[...] Consuma-se o crime com a prática de qualquer um dos núcleos trazidos pelo tipo, não se exigindo efetivo ato de tráfico (RJTJSP 70/371). Isso porque é muito comum a prática de diversas condutas típicas em transações envolvendo determinada quantidade de drogas. Normalmente, o mesmo grupo importa, prepara, fabrica, transporta, vende, etc. As condutas são independentes e, obviamente, a punição pela prática de uma delas não pressupõe que outras também tenham sido praticadas. Caso comprovado, por exemplo, que um lote de cocaína estava sendo transportado para em seguida ser vendido, consuma-se o crime, independentemente de qualquer conduta relativa ao fim último do tráfico, que é o comércio. Da mesma forma, comprovada a transação para aquisição de droga que posteriormente seria revendida, consuma-se o tráfico ainda que haja a entrega da substância por intervenção policial. (Leis penais especiais: comentadas / Coordenadores Rogério Sanches Cunha, Ronaldo Batista Pinto e Renee de Ó Souza - 3ª ed. rev., atual. e ampl. - Salvador: Ed. JusPodivm, 2020, pág. 1738).

Deste modo, ao contrário do que sustenta o apelante, as provas colacionadas ao processo demonstram que sua conduta se enquadra na prática do crime descrito no art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006 acima transcrito.

A materialidade delitiva está comprovada por meio do do auto de prisão em flagrante n. 299.19.00022 (evento 1, auto de prisão em flagrante 1, da ação penal), do boletim de ocorrência n. 00299.2019.000102 (evento 1, auto de prisão em flagrante 2-3, da ação penal), do auto de exibição e apreensão (evento 1, auto de prisão em flagrante 4, da ação penal), do auto de constatação n. 0004/2019 (evento 1, auto de prisão em flagrante 16, da ação penal), do laudo pericial de identificação de drogas psicotrópicas n. 9200.19.00471 (evento 76 da ação penal) e da prova oral colhida em ambas as etapas procedimentais.

A autoria, da mesma forma, encontra-se demonstrada e recai no apelante.

Por ocasião da lavratura do auto de prisão em flagrante, o policial militar Ivan Richter indicou que receberam informações acerca de comercialização de drogas no bairro Itoupava Central por indivíduo que utilizava uma motocicleta RD 135, de cor azul. Ao avistarem veículo com tais características num posto de combustíveis se aproximaram para efetuar abordagem e verificaram que o réu demonstrou nervosismo, além de ele acelerar o passo em direção ao banheiro do estabelecimento. Efetuaram busca pessoal e na posse do acusado encontraram cerca de 500 comprimidos de ecstasy e ao o indagarem este confirmou que possuia mais entorpecente em sua residência. Se dirigiram ao local indicaram e apreenderam mais drogas. Além do entorpecente, apreenderam telefone celular e R$ 155,00...

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