Acórdão Nº 0000067-03.2003.8.24.0038 do Quarta Câmara de Direito Comercial, 25-10-2022

Número do processo0000067-03.2003.8.24.0038
Data25 Outubro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0000067-03.2003.8.24.0038/SC

RELATORA: Desembargadora JANICE GOULART GARCIA UBIALLI

APELANTE: VITOR LUIZ POSSENTI APELADO: ICELDA GIACOMOSSI APELADO: EZALTASSAO CONFECCOES LTDA

RELATÓRIO

Cuida-se de apelação cível interposta por VITOR LUIZ POSSENTI da sentença proferida nos autos da "Ação Declaratória de Anulação de Escritura Pública de Hipoteca c/c Ação de Cancelamento de Registro Imobiliário c/c Inexistência de Débito c/c Danos Morais" n. 0000067-03.2003.8.24.0038, ajuizada contra ICELDA GIACOMOSSI. O decisório recorrido contou com a seguinte parte dispositiva (doc 354, evento 239):

Ante o exposto, com fundamento no art. 487, I, do Código de Processo Civil:

a) JULGO PROCEDENTE o pedido formulado por Icelda Ostrovski e Exaltação Confecções Ltda. em face de Vitor Luiz Possenti e Espólio de Ruben Ostrovski e, em consequência, DECLARO a nulidade da escritura pública de confissão de dívida com garantia hipotecária representada pelo imóvel matriculado sob o nº 7.118, registrada no livro 588, folha 057 (p. 18-19), ambos averbados no Registro de Imóveis da 3ª Circunscrição da Comarca de Joinville/SC;

Oficie-se ao respectivo Cartório para as providências devidas.

b) JULGO IMPROCEDENTE o pedido de indenização por danos morais formulado por Icelda Ostrovski e Exaltação Confecções Ltda. em face de Vitor Luiz Possenti e Espólio de Ruben Ostrovski.

Em virtude da sucumbência, condeno o réu Vítor ao pagamento, por inteiro, das custas processuais e dos honorários advocatícios em favor dos procuradores das autoras e do corréu, fixados, por equidade, consoante o grau de zelo profissional e a natureza da demanda, em 20% do montante atualizado da causa, sendo metade deste para cada procurador, ex vi do disposto no art. 85, § 2º, do CPC.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

A parte autora opôs embargos declaratórios em face do pronunciamento judicial (doc 357, evento 244), os quais foram rejeitados (doc 369, evento 258).

Em suas razões recursais, o réu apelante sustenta, em síntese, que: a) "a requerente diz haver agiotagem por parte de empresas que em nada tem relação com os presentes autos"; b) "toda a sua prova material se circunscreve à empresas que nada tem a ver com a confissão de dívida que pretende não pagar"; c) "a requerente não tem nos autos qualquer indicação de prova de irregularidade na confissão de dívida que assinou em cartório oficial"; d) a apelada pretende "ver anulada a escritura pública de confissão de dívida com garantia hipotecária e fidejussória firme em apenas dois argumentos", quais sejam, "a existência de agiotagem que diz ter havido na tomada de empréstimo da quantia de R$ 5.000,00 da empresa ECAD Consultoria" e "a divergência na data da procuração que lhe outorgou seu ex-marido Ruben Ostrovski exatamente para assinar a escritura pública"; e) "não há qualquer prova material, mínima que seja, que indique que o dinheiro recebido pela requerente inclui cobrança de juros abusivos, caracterizando-se a agiotagem"; f) "as negociações travadas pelas partes demandantes foram todas resolvidas junto ao tabelião oficial Octávio Henrique Loyola Lobo, que lavrou a escritura pública de hipoteca"; g) "tendo previsão de recebimento sempre próximo, o negócio que propôs ao demandado - oferecer seu imóvel para levantar importante quantia e dar injeção financeira na sua facção era factível e assim realizou"; h) em relação ao depoimento prestado em juízo pela informante Maria Aparecida da Silva, "não há nada do que ela informou que pode por um segundo só se comprovar"; i) a testemunha Giana Cunha "tentou provar que o Sr. Vitor Luiz Possenti ameaçava de morte a autora, apesar de em nenhum momento ter conseguido provar o nexo entre as ameaças que diz terem existido e a dívida que assumiu" e tampouco disse "que a requerente assinou uma escritura pública de confissão de dívida porque estava em dívida com agiota", nem "que o requerido cobrou juros extorsivos da requerente e muito menos que as discussões - inventadas - de fato se tratavam de cobrança de dívida abusiva"; j) o depoente Elio Crispim "nunca esteve presente quando os fatos mentirosos que narra aconteceram" e "afirma que não sabe nada sobre o contrato firmado junto ao tabelionato"; k) reitera as alegações apresentadas pelo tabelião, igualmente citado nos autos, de que 'o demandado emprestou o dinheiro para a autora com o intuito de que a mesma pudesse resolver em um pequeno espaço de tempo débitos urgentes que à angustiavam'; l) "o magistrado a quo entendeu que o requerido [...] não produziu a prova que lhe cabia, nos termos do artigo 373, II, do CPC", porém "este douto julgador já tinha negado à requerente a inversão do ônus da prova porque imporia ao requerido a condição de produzir prova negativa"; m) "a requerente é que deveria produzir as provas necessárias a sustentar suas afirmações na inicial", todavia "não há qualquer prova produzida pela requente que demonstre que esta foi fraudada por agiotagem"; n) "a requerida era conhecida da sua família e o requerido também possuía empresa de confecção, e isto os aproximou. E foi a pedido de sua cunhada que acabou cedendo o empréstimo à requerente"; o) "o que se tem, isso sim, é uma declaração de vontade firmada em contrato público perante o tabelião competente, com declaração de recebimento da quantia de R$63.000,00 e datas fixas para devolver este dinheiro sem juros ou correção, mas em curto prazo, tratando-se, evidentemente, de dinheiro para fluxo de caixa, aliás como fartamente confirmado pelas testemunhas"; p) "a única prova que existe nos autos seriam as testemunhas ouvidas, sendo que até pouco tempo não era possível discutir contratos com base apenas testemunhal quando estes contratos superavam 10 vezes o salário mínimo"; q) em razão do exposto, postula o provimento do reclamo "para reconhecer a regularidade da escritura pública de confissão de dívida, mormente porque traduz o negócio jurídico efetivamente existente" e, por conseguinte, cassar "a sentença que julgou procedente a demanda" com "a condenação da apelada ao pagamento de custas e honorários advocatícios". Pugna, ainda, pelo recebimento do apelo no duplo efeito (doc 376, evento 264).

Com as contrarrazões (doc 383, evento 269), os autos ascenderam a esta Corte.

A Exma. Desa. Rejane Andersen determinou a redistribuição do feito por prevenção (evento 19) diante da informação prestada pela Diretoria de Cadastro e Distribuição Processual de que "o estudo da prevenção indicou como possível processo conexo ou relacionado o seguinte recurso/ação: 0038098-19.2008.8.24.0038, distribuído à vaga 5 da Quarta Câmara de Direito Comercial no sistema SAJ (Gab. 04 - 4ª Câmara de Direito Comercial no eproc)" (evento 17).

VOTO

O reclamo, adianta-se, não pode ser conhecido pelas razões que passo a expor a seguir.

No caso dos autos, a parte autora pretende seja reconhecida a nulidade da escritura pública de confissão de dívida com garantia hipotecária e fidejussória firmada em 13-3-1999 em favor do réu sob o argumento de que foi pressionada pelo réu apelante, inclusive com ameaças de morte, a assinar escritura pública com confissão de dívida em nome de sua microempresa Exaltação Confecções Ltda. no importe de R$ 63.051,80, resultante de empréstimo com ele contraído, a ser pago em oito parcelas de R$ 7.685,00 representadas por notas promissórias. Narra a autora apelada que o valor efetivamente tomado para o incremento de suas atividades comerciais foi de R$ 5.000,00, e não o montante expresso nas notas promissórias, e que como o débito estava vencido há mais 30 dias, o apelante - ao qual imputa a prática de agiotagem -, justificando o parcelamento do valor, exigiu da autora os aceites em branco nas notas promissórias sob a alegação de agilizar a escritura de confissão de dívida formalizada em cartório. Ainda, postula a condenação do apelante ao pagamento de danos morais em razão das humilhações, ameaças, coações, pressões psicológicas e de todos os constrangimentos a que foi submetida. É o que se dessume da peça inicial (evento 185, docs 4-16, grifos no original):

A autora pessoa simples e sem recursos financeiros, porém, reconhecidamente trabalhadora, constituiu com muito esforço, uma microempresa de confecções, adquirindo para tanto, maquinário usado e em conseqüência, enfrentando todos os desafios de ordem financeira.

Ocorreu que toda receita da microempresa, formada por cheques pré-datados, eram em seguida descontados por empresas ditas como Factoring, sob pena de deixar de levar adiante suas atividades comerciais.

A Autora como uma verdadeira malabarista procurou equilibrar-se mas mesmo assim, embora lutando muito, foi levada a presenciar o funeral de seu comércio, tudo isso, em razão da insensibilidade e ganância dos agiotas, entre os quais, o primeiro requerido.

Sabe-se contudo que a taxa para desconto praticada pelo mercado negro da agiotagem é imposta pelos mesmos, tendo como parâmetro desta, o grau de necessidade do pedinte, que nesse caso, chegava a casa de 6 a 10% ao mês antecipados...

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