Acórdão Nº 0000073-68.2020.8.24.0020 do Segunda Câmara Criminal, 24-03-2020

Número do processo0000073-68.2020.8.24.0020
Data24 Março 2020
Tribunal de OrigemCriciúma
ÓrgãoSegunda Câmara Criminal
Classe processualAgravo de Execução Penal
Tipo de documentoAcórdão




Agravo de Execução Penal n. 0000073-68.2020.8.24.0020, de Criciúma

Relator: Desembargador Norival Acácio Engel

AGRAVO EM EXECUÇÃO PENAL. INSURGÊNCIA DEFENSIVA CONTRA DECISÃO QUE, APÓS A DECLINAÇÃO DE COMPETÊNCIA, REVISOU A DECISÃO QUE HAVIA CONCEDIDO O BENEFÍCIO DA PRISÃO DOMICILIAR COM FUNDAMENTO NO ENUNCIADO N. 56, DA SÚMULA VINCULANTE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, E CIENTIFICOU O APENADO SOBRE A POSSIBILIDADE DE REVOGAÇÃO DO BENEFÍCIO.

PLEITO DE MANUTENÇÃO DA PRISÃO DOMICILIAR COM MONITORAMENTO ELETRÔNICO (TORNOZELEIRA), NOS TERMOS DA SÚMULA VINCULANTE N. 56, DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. IMPOSSIBILIDADE. NÃO PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS PREVISTOS NO ART. 117 E 146-B, INCISOS II E IV, AMBOS DA LEI DE EXECUÇÃO PENAL. VEDAÇÃO DA PROGRESSÃO POR SALTO. ALEGAÇÃO DE PRECLUSÃO "PRO JUDICATO" E OFENSA A DIREITO ADQUIRIDO. INSUBSISTÊNCIA. MAGISTRADO DO LOCAL DE CUMPRIMENTO DA PENA DO REEDUCANDO COMPETENTE PARA DECIDIR SOBRE OS INCIDENTES DA EXECUÇÃO (LEP, ART. 65). ADEMAIS, PRESÍDIO REGIONAL DE CRICIÚMA QUE OFERECE CONDIÇÕES AO CUMPRIMENTO DE PENA NO REGIME SEMIABERTO, ENQUADRANDO-SE NO CONCEITO DE ESTABELECIMENTO PENAL SIMILAR (LEI 7.210/84, ART. 91). INTERPRETAÇÃO DA SÚMULA VINCULANTE N. 56 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. PRETENSÃO AFASTADA.

RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Execução Penal n. 0000073-68.2020.8.24.0020, da comarca de Criciúma Vara de Execuções Penais em que é Agravante Edipo Luis Ferreira da Silva e Agravado Ministério Público do Estado de Santa Catarina.

A Segunda Câmara Criminal decidiu, por meio eletrônico, por votação unânime, conhecer do Reclamo e negar-lhe provimento. Custas legais.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pela Exma. Sra. Desa. Salete Silva Sommariva, com voto, e dele participou o Exmo. Sr. Des. Sérgio Rizelo. Funcionou como Representante do Ministério Público a Exma. Sra. Dra. Cristiane Rosália Maestri Böell.

Florianópolis, 24 de março de 2020.

Desembargador Norival Acácio Engel

Relator

RELATÓRIO

Trata-se de Agravo em Execução Penal, interposto por Édipo Luis Ferreira da Silva, em face de decisão proferida pela Juíza de Direito da Vara de Execuções Penais da Comarca de Criciúma, que revogou o benefício da prisão domiciliar, concedida anteriormente em observância ao Enunciado n. 56, da Súmula Vinculante do Supremo Tribunal Federal, após a mudança de domicílio do réu e a alteração de competência do Juízo (fls. 500-503).

Busca a Defesa, em síntese, a reforma da decisão a fim de que lhe seja concedida prisão domiciliar com monitoramento eletrônico, argumentando inicialmente que o apenado "adquiriu o direito de cumprimento da reprimenda imposta em regime domiciliar por decisão proferida pelo Magistrado responsável pela execução penal da Comarca de Araranguá" e, por esse motivo, a decisão proferida pela Autoridade Judiciária de Criciúma, que revogou a benesse, mostra-se incompatível com a anterior (preclusão pro judicato).

Além disso, alega que a realidade do sistema carcerário catarinense, em especial, a ausência de vaga para cumprimento da pena em regime semiaberto, por si só, autoriza a concessão de prisão domiciliar ao reeducando, nos moldes do Enunciado n. 56, da Súmula Vinculante do Supremo Tribunal Federal.

Aduz, por fim, que a "ampliação da aquisição do número de tornozeleiras eletrônicas, de rigor que casos como do presente recurso, sejam contemplados com esta maneira menos gravosa de cumprimento de pena a fim de desafogar o sistema prisional que possui números galopantes paulatinamente", razão pela qual requer o restabelecimento da prisão domiciliar, mediante monitoração eletrônica.

Apresentadas as Contrarrazões (fls. 22-25) e mantida a decisão Agravada (fl. 26), os autos ascenderam ao Segundo Grau, oportunidade em que a Douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra do Exmo. Sr. Dr. Luiz Ricardo Pereira Cavalcanti, manifestou-se pelo conhecimento e não provimento da insurgência (fls. 37-41).

Este é o relatório.

VOTO

Presentes os pressupostos de admissibilidade, o recurso deve ser conhecido.

Todavia, no mérito, a insurgência não comporta acolhimento.

Extrai-se dos autos que o Agravante Édipo Luis Ferreira da Silva foi condenado ao cumprimento da pena de 6 (seis) anos, 7 (sete) meses e 22 (vinte e dois) dias de reclusão pelo cometimento de crimes comuns e de 12 (doze) anos pelo cometimento de delito hediondo, encontrando-se atualmente em regime semiaberto.

Na Comarca de Araranguá, o Magistrado de primeiro grau deferiu o pedido de prisão domiciliar, mediante uso de tornozeleira eletrônica, diante da situação do sistema carcerário da Unidade Prisional local, que não atendia as condições estabelecidas na Súmula Vinculante n. 56, do Supremo Tribunal Federal.

Contudo, após a declinação de competência para a Comarca Criciúma, em razão de o Apenado ter mudado seu domicílio para aquele Município, a Autoridade Judiciária atuante naquele Juízo determinou a cientificação do Reeducando de que sua prisão especial seria revogada e, em consequência, ingressaria no Presídio Regional, por entender que a mencionada Unidade Prisional possui ala compatível com o regime semiaberto.

Ao final, possibilitou ao Apenado manifestar-se sobre o desejo de permanecer em Criciúma ou de retornar à Comarca de Araranguá, a fim de prosseguir o resgate da pena.

Inicialmente, ressalta-se que, dentre as finalidades da sanção penal, encontra-se a retribuição ao condenado por um injusto praticado e a gradativa readaptação daquele ao meio social.

Como maneira de melhor assegurar a realização desses fins, o Direito Penal brasileiro consagrou a forma progressiva para o resgate das penas privativas de liberdade, de modo a garantir a gradual reinserção social do apenado.

É, inclusive, o que preveem o art. 33, § 2º, do Código Penal e o art. 112 da Lei de Execução Penal:

Art. 33. [...] § 2º - As penas privativas de liberdade deverão ser executadas em forma progressiva, segundo o mérito do condenado, observados os seguintes critérios e ressalvadas as hipóteses de transferência a regime mais rigoroso: [...].

Art. 112. A pena privativa de liberdade será executada em forma progressiva com a transferência para regime menos rigoroso, a ser determinada pelo juiz, quando o preso tiver cumprido ao menos um sexto da pena no regime anterior e ostentar bom comportamento carcerário, comprovado pelo diretor do estabelecimento, respeitadas as normas que vedam a progressão.

Com base nas citadas disposições de lei e nas finalidades da sanção penal, doutrina e jurisprudência têm rechaçado a possibilidade da denominada ''progressão por salto", ou seja, a transferência imediata do apenado do regime fechado para o aberto, sem a sua passagem pelo regime intermediário.

A respeito do tema, é o Enunciado n. 491 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça: "É inadmissível a chamada progressão per saltum de regime prisional".

Pelas mesmas razões, não se mostra viável ao condenado que cumpre pena em regime semiaberto iniciar seu cumprimento diretamente na modalidade aberta sem que tenha resgatado, naquele, as condições exigidas à progressão.

Além disso, acerca da prisão domiciliar, imperioso destacar as disposições do art. 117 da Lei de Execução Penal:

Art. 117. Somente se admitirá o recolhimento do beneficiário de regime aberto em residência particular quando se tratar de:

I - condenado maior de setenta anos;

II - condenado acometido de doença grave;

III - condenada com filho menor ou deficiente físico ou mental;

IV - condenada gestante.

Destaca-se que as situações mencionadas no referido dispositivo legal são taxativas, haja vista se tratar de medida excepcional, aplicada a condenados que se encontram em situações peculiares, o que não se coaduna com a condição do Agravante.

Sobre o assunto, leciona Julio Fabbrini Mirabete que "a enumeração legal é taxativa e não exemplificativa, não podendo o julgador estender o alcance da prisão domiciliar às hipóteses não previstas na lei, admitindo-se apenas, na jurisprudência, como já mencionado, que se coloque nessa situação, excepcionalmente, o condenado que deva cumprir a pena em regime aberto quando inexiste casa do albergado ou estabelecimento similar." (in Execução penal. 11. ed. São Paulo: Atlas, 2007, p. 480).

Assim, resta claro que para fazer jus ao benefício é necessário que o Apenado esteja cumprindo a reprimenda em regime aberto, e se enquadrar em uma das condições descritas no artigo supra, ou seja, ser maior de setenta anos, estar acometido de moléstia grave, ter filho menor ou com necessidades especiais ou estar gestante.

É de se reconhecer que a jurisprudência tem ampliado a abrangência do recolhimento domiciliar, até mesmo aos condenados que cumprem pena em regimes semiaberto e fechado, em caso de doença extremamente grave, porém essa não é a hipótese dos autos.

Ressalta-se, ainda, que os Tribunais Superiores têm admitido, em casos excepcionais, a concessão do referido benefício aos apenados que cumprem pena em regime semiaberto, quando a Administração Penitenciária não dispõe de vagas em Colônias Penais Agrícolas ou Industriais ao resgate do regime intermediário.

Nesse norte, tem-se o Enunciado 56 da Súmula Vinculante do Supremo Tribunal Federal, assim dispõe: "A falta de estabelecimento penal adequado não autoriza a manutenção do condenado em regime prisional mais gravoso, devendo-se observar, nesta hipótese, os parâmetros fixados no Recurso Extraordinário (RE) 641320".

Seguindo o entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal, consoante se observa, por exemplo, na Reclamação Constitucional n. 25.054, de relatoria do Ministro Luíz Roberto Barroso, julgado em 19-9-2016, o uso de liberdade eletronicamente monitorada apenas deve ser concedida aos apenados em regime semiaberto que, além de demonstrarem bom comportamento, tenham antecipada sua saída pelo juízo...

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