Acórdão Nº 0000079-36.2015.8.24.0025 do Terceira Câmara Criminal, 26-01-2021

Número do processo0000079-36.2015.8.24.0025
Data26 Janeiro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Criminal Nº 0000079-36.2015.8.24.0025/SCPROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 0000079-36.2015.8.24.0025/SC



RELATOR: Desembargador ERNANI GUETTEN DE ALMEIDA


APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR) APELANTE: MARCIO LUCIANO (RÉU) ADVOGADO: RODRIGO ANDRÉ DOS SANTOS (OAB SC018692) APELADO: OS MESMOS ASSISTENTE DE ACUSAÇÃO: ROSA MALKOWSKY DAROLT (INTERESSADO) ADVOGADO: CHRISTIAN EISING OENNING ADVOGADO: RODRIGO OENNING OFENDIDO: LETICIA MALKOWSKY BRAZ (OFENDIDO) OFENDIDO: ALEXANDRO DA SILVA (OFENDIDO) ADVOGADO: MARCELO GEISER DURAN OFENDIDO: BERNADETE SCHMITT (OFENDIDO)


RELATÓRIO


O representante do Ministério Público, com atribuição para atuar perante a Vara Criminal da comarca de Gaspar, ofereceu denúncia em desfavor de Marcio Luciano como incurso nos arts. 302, caput, c/c art. 303, caput (por duas vezes) e art. 306, §1º, II, todos da Lei n. 9.503/97, em razão dos seguintes fatos narrados na exordial acusatória, in verbis (evento 30):
Na noite de 24 de agosto de 2014, o denunciado MARCIO LUCIANO conduziu, em via pública, o veículo Ford/Fiesta, cor azul, placa MAE 9295 (V2), com capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool, pois se apresentava com forte hálito etílico e sonolência.
Assim, ao se deslocar pela Rodovia Federal BR 470, no sentido Blumenau a Navegantes, na altura do Km 41,5, por volta das 21h10min, o denunciado MARCIO LUCIANO, de forma imprudente1 , porque optou por dirigir mesmo estando deveras cansado e após ingerir aproximadamente 5 (cinco) latas de cerveja, cochilou ao volante e perdeu o controle do automotor, vindo a invadir a pista contrária e chocar-se contra o veículo GM/Celta, cor prata, placa MID 2825 (V2), que seguia regularmente sua trajetória.
A colisão provocou lesões corporais no motorista e na passageira do veículo GM/Celta, Alexandro da Silva2 e Bernadete Schmitt3 , bem como o óbito da também passageira Letícia Malkowsky Braz.
Concluída a instrução do feito, a denúncia foi julgada parcialmente procedente para, in litteris (evento 155):
a) Absolver o acusado Márcio Luciano, com fundamento no art. 386, VII, do Código de Processo Penal quanto ao crime de embriaguez ao volante (CTB, art. 306);
b) Condenar o acusado Márcio Luciano, às penas de 3 (três) anos, 2 (dois) meses e 12 (doze) dias de detenção, em regime inicialmente aberto, e de 3 (três) meses e 6 (seis) dias de suspensão do direito de dirigir veículo automotor, por infração aos arts. 302, caput, e 303, caput, do Código de Trânsito Brasileiro, este por duas vezes, todos em concurso formal (CP, art. 70, caput), observada a substituição da pena corporal por restritiva de direitos, conforme consta na fundamentação desta sentença.
Inconformados com a prestação jurisdicional entregue, a defesa e o Ministério Público interpuseram recurso de apelação.
Em suas razões, a defesa sustenta estar ausente condição de procedibilidade para ação penal no que tange aos crimes de lesão corporal culposa, pois ausente a representação das vítimas no prazo legal, motivo pelo qual há de ser declarada extinta a punibilidade do apelante em razão da decadência. Pretende, ainda, a absolvição de Márcio Luciano em relação aos delitos pelos quais restou condenado (arts. 302, caput, e 303, caput, do CTB), por entender que que as provas angariadas nos autos não são suficientes para atestar sua culpa (evento 09).
Por sua vez, o Órgão Ministerial pugna pela condenação de Márcio Luciano também em relação ao delito de embriaguez ao volante (art. 306, caput, do CTB), nos termos da exordial acusatória (evento 161).
Contra-arrazoados os recursos (eventos 167 de primeiro grau, 12 e 15), a Douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer do Exmo. Sr. Rui Arno Richter, manifestou-se pelo conhecimento de ambos, dando provimento apenas aquele interposto pelo Ministério Público (evento 18).
Este é o relatório

VOTO


Trata-se de recursos interpostos pela defesa e pelo Ministério Público contra sentença que, julgando parcialmente procedente a denúncia, condenou Márcio Luciano à pena privativa de liberdade de 3 (três) anos, 2 (dois) meses e 12 (doze) dias de detenção, em regime inicialmente aberto, substituída por prestação pecuniária e de serviços à comunidade, além de 3 (três) meses e 6 (seis) dias de suspensão do direito de dirigir veículo automotor, por infração aos arts. 302, caput, e 303, caput, este por duas vezes, do CTB, e o absolveu do delito previsto no art. 306, caput, do CTB.
Os recursos, como próprio e tempestivos, devem ser conhecidos.
Do recurso defensivo:
Ab initio, como matéria prejudicial de mérito, a defesa sustenta que as vítimas Alexandre e Bernadete não realizaram a devida representação no prazo legal, de modo que a ação penal relativa aos crimes de lesão corporal não preencheria seu pressuposto de procedibilidade, nos termos do art. 291 do Código de Trânsito Brasileiro.
Sem razão.
Segundo Guilherme de Souza Nucci, em Código de Processo Penal comentado. 12ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013, p. 142: "Forma de representação: não exige rigorismo formal, ou seja, um termo específico em que a vítima declare expressamente o desejo de representar contra o autor da infração penal. Basta que, das declarações prestadas no inquérito, por exemplo, fique bem claro o seu objetivo de dar início à ação penal, legitimando o Ministério Público a agir".
In casu, como bem destacado na sentença (evento 155), "Os ofendidos evidenciaram a intenção de representar o réu criminalmente pelo crime, ora apurado, quando se submeteram ao exame de lesões corporais (fls. 35 e 36), em 18/11/2014 e 12/12/2014, bem como ao fornecer, voluntariamente, cópia de seus exames e prontuários médicos da época da ocorrência (fls. 56-102), ocasiões em que não havia transcorrido o prazo decadencial".
Assim, é cediço ser inexigível maiores formalidades à representação dos ofendidos, uma vez que evidentemente demonstrado o interesse no prosseguimento da persecutio criminis.
Para arrematar, "doutrina e jurisprudência são uniformes no sentido de que a representação do ofendido nas ações penais públicas condicionadas prescinde de qualquer formalidade, sendo suficiente a demonstração do interesse da vítima em autorizar a persecução criminal" (STJ, HC 253.555/SP, Rel. Ministro Jorge Mussi, Quinta Turma, julgado em 11/12/2012, DJe 01/02/2013).
De outro norte, Márcio Luciano pretende sua absolvição dos delitos pelas quais restou condenado (arts. 302, caput, e 303, caput, da Lei n. 9.503/97).
No entanto, igualmente sem razão.
Infere-se dos autos que, no dia 24 de agosto de 2014, o apelante conduzia, na Rodovia Federal BR 470, no sentido Blumenau a Navegantes, o veículo Ford/Fiesta, cor azul, placas MAE 9295, ocasião em que, na altura do Km 41,5, por volta das 21h10min, embriagado, perdeu o controle da direção, invadiu a pista contrária e atingiu o veículo GM/Celta, cor prata, placas MID 2825, que seguia regularmente sua trajetória, tendo causado lesões corporais no motorista e na passageira do veículo GM/Celta, Alexandro da Silva e Bernadete Schmitt, bem como o óbito da também passageira Letícia Malkowsky Braz.
A materialidade delitiva encontra suporte no boletim de ocorrência (evento 1), no boletim de acidente de trânsito (evento 1), pelo laudo pericial cadavérico (evento 1), no laudo de lesões corporais (evento 1), em toda prova oral angariada durante a persecução criminal.
A autoria, da mesma forma, é certa e recai sobre o apelante.
Apesar do apelante ter usufruído do seu direito constitucional de permanecer em silêncio em ambas as fases processuais, importante mencionar que sua responsabilidade criminal encontra alicerce nas demais provas orais angariadas nos autos.
Nesse sentido, a vítima Alexandre da Silva declarou na fase pré-processual (evento 1 - fl. 25):
"[...] que no dia 24/08/2014, por volta das 21:40min, o declarante saiu de sua residência juntamente com sua namorada Letícia Malkowsky Braz e uma amiga da família chamada Bernadete Schmitt com destino Belchior Alto, neste município, utilizando um GM/Celta, placas MID-2826; que o declarante utilizou a BR-470 como via de acesso ao destino; que após percorrer cerca de 700 metros, o declarante visualizou um veículo Ford/Fiesta modelo antigo, perdendo a direção e em alta velocidade; que devido sua alta velocidade o veículo Ford/Fiesta invadiu sua preferencial, vindo a chocar-se contra seu carro; que o choque entre os carros foi tão violente que sua namorada Letícia Malkowsky Braz ficou presa nas ferragens e Dona Bernadete devido ao choque sofreu um traumatismo craniano médio; que o declarante não ficou preso nas ferragens, e por esse motivo conseguiu sair do veículo quebrando o vidro lateral esquerdo; que o declarante solicitou a populares que acionassem o corpo de bombeiros para que realizassem o atendimento; que o declarante sofreu lesões no braço direito e na altura da clavícula esquerda sofreu uma fratura; que sua namorada além de ficar presa nas ferragens veio a falecer cerca de 03 horas após ter dado entrada no hospital [...]"
Sob o crivo do contraditório, ressaltou:
"[...] que, naquela noite, depois de um domingo de trabalho, foi levar um funcionário para casa, sendo que Letícia o acompanhava para fazer-lhe companhia. O depoente era o motorista do automóvel, Letícia ocupava o banco ao seu lado e a vítima Bernadete sentava, no banco traseiro, atrás dela. Na segunda curva do trajeto, viu um carro transitando em alta velocidade, trafegando em sentido oposto ao do declarante, portanto, vindo em sua direção, fazendo uma curva. Ao observar esta cena, teve a impressão que aquele condutor trafegava pela contramão de direção, ou seja, pela pista de rolamento ocupada pelo depoente. Em razão disso, o declarante desviou o automóvel para o...

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