Acórdão Nº 0000082-69.2016.8.24.0020 do Quarta Câmara Criminal, 05-03-2020

Número do processo0000082-69.2016.8.24.0020
Data05 Março 2020
Tribunal de OrigemCriciúma
ÓrgãoQuarta Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão




Apelação Criminal n. 0000082-69.2016.8.24.0020

Relator: Desembargador Sidney Eloy Dalabrida

APELAÇÃO CRIMINAL. RECEPTAÇÃO DOLOSA (ART. 180, CAPUT, DO CÓDIGO PENAL). SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DEFENSIVO.

PRELIMINAR. FLAGRANTE PREPARADO. PROVOCAÇÃO OU INDUZIMENTO À PRÁTICA DA INFRAÇÃO PENAL NÃO VERIFICADOS. AÇÃO POLICIAL LEGÍTIMA. CONDENAÇÃO MANTIDA.

ABSOLVIÇÃO. AUSÊNCIA DE PROVAS. IMPOSSIBILIDADE. AUTORIA E MATERIALIDADE DELITIVAS COMPROVADAS. DEPOIMENTO DA VÍTIMA CORROBORADO PELOS DEMAIS ELEMENTOS DE PROVA. AGENTES QUE EXPUSERAM À VENDA, EM SITE POPULAR DE COMPRA E VENDA DE PRODUTOS, COMPUTADOR OBJETO DE FURTO ANTERIOR. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DA ORIGEM LÍCITA DO BEM. MANUTENÇÃO DO DECISUM.

RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Criminal n. 0000082-69.2016.8.24.0020, da comarca de Criciúma 2ª Vara Criminal em que é Apelante Adriano Roden Melo e outro e Apelado Ministério Público do Estado de Santa Catarina.

A Quarta Câmara Criminal decidiu, por unanimidade, conhecer do recurso, afastar a preliminar, e negar-lhe provimento. Custas legais.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Sr. Desembargador Alexandre d'Ivanenko, com voto, e dele participou o Exmo. Sr. Desembargador Zanini Fornerolli. Funcionou como representante do Ministério Público a Exma. Sra. Dra. Jayne Abdala Bandeira.

Florianópolis, 5 de março de 2020.

Desembargador Sidney Eloy Dalabrida

Relator


RELATÓRIO

Na comarca de Criciúma, o órgão do Ministério Público ofereceu denúncia em face de Maicon Marcineiro dos Santos e Adriano Roden Melo, imputando-lhes a prática do delito capitulado no art. 180, caput, do Código Penal, pois, segundo consta na inicial:

Colhe-se que no dia 07 de janeiro de 2016, por volta das 16h, na Rodovia Luiz Rosso, Bairro Primeira Linha, nesta cidade de Criciúma, próximo ao 28º Grupo de Artilharia e Campanha, o denunciado Maicon Marcineiro dos Santos foi preso em flagrante delito por policiais militares tentando vender (após negociação de fls. 58/62) para o próprio proprietário, Fernando Cardoso Corrêa, o computador IMAC, da marca Apple, modelo ME087, com teclado e mouse, pelo preço de R$ 4.000,00 (quatro mil reais), aparelho este que havia sido furtado da empresa da vítima em 26 de dezembro de 2015 (boletim de ocorrência de fls. 38).

Após tal prisão, foi descoberto, por meio de informações obtidas com o denunciado Maicon, que parte dos bens subtraídos na mencionada ocasião estava na posse do denunciado Adriano Roden Melo e, de fato, em um apartamento deste último, ainda não habitado, foram apreendidos mais quatro computadores, sendo dois da marca Apple e dois da marca LG. Logo após, o denunciado Maicon admitiu que, em sua casa, guardava mais um computador, este da marca Apple, o qual foi, também, devidamente apreendido.

No total, foram os seis computadores até aqui referidos avaliados em R$ 48.000,00 (quarenta e oito mil reais), conforme fls. 44/46.

Desta feita, tem-se que Maicon Marcineiro dos Santos e Adriano Roden Melo receberam/transportaram/ocultavam/guardavam, em proveito próprio ou alheio, os referidos computadores, mesmo sabendo que eram eles produto de crime (fls. 98-100).

Finalizada a instrução, o Magistrado a quo julgou procedente o pedido formulado na denúncia, para condenar os réus, cada qual, ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 1 (um) ano de reclusão, em regime inicial aberto, substituída por uma medida restritiva de direitos, consistente em prestação de serviços à comunidade, além do pagamento de 10 (dez) dias-multa, fixados no mínimo legal, por infração ao art. 180, caput, do CP (fls. 354-367).

Inconformados com a prestação jurisdicional, os réus interpuseram apelação criminal, mediante a qual alegaram, preliminarmente, a ocorrência de flagrante preparado. No mérito, postularam a absolvição, sustentando a insuficiência de provas para embasar a condenação (fls. 394-403).

Apresentadas as contrarrazões (fls. 409-415), a douta Procuradoria-Geral de Justiça, por intermédio do Exmo. Dr. Humberto Francisco Scharf Vieira, manifestou-se pelo conhecimento e não provimento do reclamo (fls. 418-424).

VOTO

Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conhece-se do apelo.

1 Preliminarmente, almeja a defesa a nulidade do processo, porque "o flagrante foi preparado", uma vez que "a vítima em seu depoimento explica que foi a polícia quem lhe orientou a fazer a compra e marcar o encontro com o acusado Maicon" (fl. 395).

Sem razão.

Registre-se que "no flagrante preparado, a polícia provoca o agente a praticar o delito e, ao mesmo tempo, impede a sua consumação, cuidando-se, assim, de crime impossível; ao passo que no flagrante forjado a conduta do agente é criada pela polícia, tratando-se de fato atípico. Hipótese totalmente diversa é a do flagrante esperado, em que a polícia tem notícias de que uma infração penal será cometida e aguarda o momento de sua consumação para executar a prisão" (HC 307.775/GO, rel. Min. Jorge Mussi, j. em 3/3/2015, DJe 11/3/2015).

In casu, constata-se, pela dinâmica dos fatos, que ocorreu na realidade um flagrante esperado, e, portanto, legítimo, pois os policiais apenas auxiliaram a vítima na recuperação dos objetos, conduzindo a transação anteriormente alinhavada entre o ofendido e o réu Maicon.

Com efeito, "não se pode confundir o agente provocador com o funcionário policial que, informado previamente acerca de crime que alguém está praticando ou vai consumar, diligencie prendê-lo em flagrante, pois em tal hipótese a intervenção da autoridade não provocou nem induziu o autor do fato criminoso a cometê-lo" (TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de processo penal. 17. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2017. p. 686).

Assim, diante de legítima operação policial, não há que se falar em provocação ou indução à prática da infração penal por parte dos agentes públicos.

Em caso semelhante, colhe-se:

APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME CONTRA A SAÚDE PÚBLICA. TRÁFICO DE DROGAS (LEI 11.343/2006, ART. 33, CAPUT). SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DA DEFESA. MÉRITO. ABSOLVIÇÃO. FLAGRANTE PREPARADO. NÃO OCORRÊNCIA. ATUAÇÃO POLICIAL LEGÍTIMA. INFORMAÇÃO PRÉVIA RECEBIDA DO SETOR DE INTELIGÊNCIA DA POLÍCIA MILITAR. IDENTIFICAÇÃO DO AGENTE E DO AUTOMÓVEL UTILIZADO PARA A TRANSAÇÃO DE DROGAS. ABORDAGEM QUE CULMINOU NA APREENSÃO DE ENTORPECENTES EM PODER DO AGENTE E OUTRA QUANTIDADE, AINDA MAIOR, GUARDADA EM SUA RESIDÊNCIA, JUNTAMENTE COM BALANÇA DE PRECISÃO. CONDENAÇÃO BASEADA NA PALAVRA FIRME E COERENTE DOS POLICIAIS. AUSÊNCIA DE ALEGAÇÃO CONCRETA DE MÁ-FÉ OU OFERECIMENTO DE CONTRADITA. VERSÃO DEFENSIVA FRÁGIL E INSUFICIENTE. [...] Não há falar em absolvição por flagrante preparado quando a versão da defesa é insuficiente para inquinar os elementos de prova que denotam a atuação legítima da Polícia Militar que efetuou a prisão em flagrante após ter recebido informação do seu setor de inteligência que identificava o traficante e o automóvel por ele utilizado, logrando encontrar, assim, quantidade expressiva de drogas (TJSC, Apelação Criminal n. 0004871-42.2017.8.24.0064, de São José, rel. Des. Carlos Alberto Civinski, j. em 12/4/2018).

Assim, rechaça-se a preliminar.

2 O pleito absolutório, por ausência de provas, não prospera.

A materialidade e autoria delitivas restaram comprovadas por meio do auto de prisão em flagrante (fl. 5), dos boletins de ocorrência (fls. 6-7, 11-16, 38-40 e 41-42), dos termos de reconhecimento e entrega (fls. 10 e 46), bem como da prova oral coligida.

Sobre a dinâmica dos fatos, o ofendido Fernando Cardoso Corrêa contou que foi vítima de furto em dezembro de 2015 e, ao procurar pelos bens surrupiados na internet, encontrou no site Mercado Livre anúncio oferecendo computador semelhante ao seu. Diante dos fatos, foi orientado pela polícia civil para efetivar a transação, oportunidade em que realizaram o flagrante.

Na fase indiciária (fls. 20-21), detalhou:

[...] QUE o declarante confirma o teor do registro do Boletim de Ocorrência n. 06074/15, do dia 28/12/2015; QUE é o sócio-proprietário da empresa Global Print, situada na Rua Conego Anibal Maria de Francia, no bairro Pinheiro, e no dia 26/12/15 ladrões invadiram a loja e furtaram vários computadores, ou seja, 05 (cinco) computadores Imac, 21', modelo ME087, com teclados e mouse, 01 (uma) TV Smart, marca Samsung 40', três (03) computadores marca LG (all in one), com teclados e mouse, além de três servidores e mais computadores Desktop comuns completos (com teclado mouse); QUE além dos computadores, eles levaram duas geladeiras, sendo um frigobar modelo retrô, de cor vermelha, e outra Consul de cor branca; QUE também levaram dois celulares marca Nokia, e também o DVR das câmeras, razão pela qual não foi possível analisar as imagens do circuito interno; QUE no total o prejuízo gira em torno de R$ 100.000,00 (cem mil reais), já que cada IMAC custa mais de 10 mil reais cada, sem contar os servidores que também custam o mesmo valor; QUE segundo informações recebidas alguns computadores estavam sendo oferecidos no site mercado livre; QUE entrou em contato com o rapaz que estava anunciando e negociou com ele, sendo que ele disse que morava no condomínio Carmel; QUE disse que morava em outra cidade e pediu para marcar um local e o rapaz que se identificou como MAICON MARCINEIRO, nome este que estava no anúncio, marcou com o declarante na frente do 28º; QUE quando chegaram ao local o depoente viu um de seus computadores, ou seja, um Imac, modelo ME087, 21" com mouse e teclado; QUE ele estava anunciando o computador por R$ 4.500,00 (quatro mil e quinhentos reais), sendo que ofereceu R$ 4.000,00 (quatro mil reais); QUE em dado momento a polícia chegou no local e disse que estava sabendo da transação, momento em que o declarante informou que tinha sido vítima de furto e que tal computador era seu, demonstrando inclusive seu...

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