Acórdão Nº 0000092-18.2014.8.24.0139 do Quinta Câmara de Direito Civil, 18-02-2020

Número do processo0000092-18.2014.8.24.0139
Data18 Fevereiro 2020
Tribunal de OrigemPorto Belo
ÓrgãoQuinta Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão




Apelação Cível n. 0000092-18.2014.8.24.0139, de Porto Belo

Relatora: Desembargadora Cláudia Lambert de Faria

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE USUCAPIÃO URBANA. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA.

INSURGÊNCIA DA DEMANDANTE.

REQUISITOS PARA AQUISIÇÃO DA PROPRIEDADE POR USUCAPIÃO ESPECIAL. ART. 1.239, DO CC. ANÁLISE DAS CONDIÇÕES PREVISTAS NO ART. 1.238, DO CC, EM RAZÃO POSSIBILIDADE DO JULGADOR, DE OFÍCIO E, EM OBSERVÂNCIA AO PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE, ADEQUAR O EXAME DA PRETENSÃO, INDEPENDENTEMENTE DA MODALIDADE ELEITA.

RAZÕES DA APELAÇÃO QUE INFORMAM QUE O EX- COMPANHEIRO DA AUTORA PERMITIU QUE ESTA RESIDISSE NO IMÓVEL, POR ATO DE MERA TOLERÂNCIA. PERMISSÃO DE USO QUE NÃO INDUZ POSSE. ART. 1.208 DO CÓDIGO CIVIL. MERA DETENÇÃO DA POSSE QUE AFASTA O ANIMUS DOMINI. REQUISITOS DA PRESCRIÇÃO AQUISITIVA NÃO PREENCHIDOS. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DA TRANSMUDAÇÃO DA DETENÇÃO PARA A POSSE AD USUCAPIONEM. ÔNUS QUE COMPETIA À AUTORA, A TEOR DO ART. 373, I, DO CPC.

AÇÃO DE RESCISÃO DO CONTRATO DE COMPRA E VENDA FIRMADO ENTRE EX-COMPANHEIRO E A REQUERIDA. POSSE DA REQUERENTE QUE NÃO PODE SER CONSIDERADA MANSA.

AQUISIÇÃO DO IMÓVEL, ATRAVÉS DE UM CONTRATO DE COMPRA E VENDA (FORMA DERIVADA) PELO EX-CONVIVENTE E PELA LEGÍTIMA PROPRIETÁRIA. INEXISTÊNCIA DE SENTENÇA DISSOLVENDO A UNIÃO ESTÁVEL. BEM QUE, EM TESE, FOI ADQUIRIDO DURANTE A UNIÃO. DEMANDANTE QUE TAMBÉM TERIA DIREITO AO IMÓVEL, EM DECORRÊNCIA DA APLICAÇÃO DO REGIME DA COMUNHÃO PARCIAL DE BENS E TERIA LEGITIMIDADE PARA PROMOVER OUTRAS MEDIDAS JUDICIAIS PARA OBTER A TRANSFERÊNCIA DO DOMÍNIO. AQUISIÇÃO DERIVADA DA PROPRIEDADE QUE OBSTA A USUCAPIÃO.

SENTENÇA MANTIDA.

HONORÁRIOS RECURSAIS INCABÍVEIS.

RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0000092-18.2014.8.24.0139, da comarca de Porto Belo 2ª Vara em que é/são Apelante Eliete Cristina Bonilha e Apelada Dalva Aparecida Garcia de Moraes.

A Quinta Câmara de Direito Civil decidiu, por votação unânime, conhecer do recurso e negar-lhe provimento. Custas legais.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Excelentíssimo Desembargador Luiz Cézar Medeiros e dele participou, com voto, o Excelentíssimo Desembargador Ricardo Fontes.

Florianópolis, 18 de fevereiro de 2020.

Desembargadora Cláudia Lambert de Faria

Relatora


RELATÓRIO

ELIETE CRISTINA BONILHA ajuizou ação de usucapião em face de DALVA APARECIDA GARCIA DE MORAES, aduzindo, em síntese, que exerce a posse mansa e pacífica, desde maio de 2008, de um imóvel urbano, localizado na Rua João Manoel Jaques, 843, lote 4, Condomínio Residencial Hannah, bairro Perequê, Porto Belo.

Relatou que o bem integra condomínio residencial de sobrados geminados e está construído sobre um terreno registrado no Ofício de Registro de Imóveis da Comarca de Porto Belo/SC, sob o n. 17.905, de propriedade da requerida.

Sustentou que estabeleceu no local a sua moradia, juntamente com suas filhas e com animus domini, destacando que é o único imóvel que possui, razão pela qual requereu o reconhecimento, por sentença, da aquisição da propriedade através da usucapião. Juntou documentos (fls. 08/79).

Pela decisão de fls. 80/81, foi deferida provisoriamente a justiça gratuita, determinada a intimação da requerente para emendar a inicial, a citação dos confinantes; a intimação das Fazendas Públicas; a intimação, por edital, de eventuais interessados ausentes e, ainda, a intimação do Ministério Público.

A autora, através da petição de fl. 84, acostou novos documentos (fls. 85/91).

O benefício da justiça gratuita foi deferido (fl. 92).

O município de Porto Belo informou não possuir interesse no referido imóvel, não se opondo ao pedido (fl. 103).

A requerida apresentou contestação (fls. 121/130) e impugnou a concessão do benefício da justiça gratuita à demandante.

No mérito, alegou que a posse da requerente se deu através de contrato de compra e venda, celebrado entre a ré e o Sr. Fábio Alexandre, que era, na ocasião, companheiro da demandante. Relatou, ainda, que aludido negócio é objeto de discussão nos autos da ação de rescisão contratual n. 139.09.001980-3.

Desse modo, afirmou que a posse da pleiteante não é mansa e pacífica, uma vez que é de conhecimento desta que o imóvel reclamado é objeto de litígio entre seu ex-companheiro e a ré. Requereu, por fim, a improcedência do pedido inicial e a revogação do benefício da justiça gratuita.

Houve réplica (fls. 144/145).

A representante do Parquet opinou pela realização de audiência de instrução (fl. 151-v).

Designada audiência (fl. 152), foram ouvidas no ato 6 testemunhas, sendo 2 arroladas pela requerida (Maria Lourdete de Melo e Tiago Balke) e 4 pela demandante (Alceu Silveira Machado, Raquel Soares Rego Mondaca; Cleide Vasoler e Adriana Machado Duarte). Ao final, a magistrada singular encerrou a instrução e determinou a intimação das partes para apresentação de alegações finais por memoriais (fl. 158), que foram colacionadas às fls. 163/165 e 167/173.

O órgão ministerial, em parecer de fls. 174/176, deixou de se manifestar sobre o mérito da lide, em virtude da desnecessidade de sua intervenção.

A requerida Dalva pleiteou a nomeação de defensor público (fl. 177).

Sobreveio sentença de improcedência do pedido (fls. 178/181), constando em seu dispositivo:

Pelo exposto, JULGO IMPROCEDENTE o pedido formulado na inicial por Eliete Cristina Bonilha.

Declaro extinto o feito, com resolução do mérito (art. 487, I, do CPC).

Condeno a autora ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes que fixo em 15% sobre o valor da causa, com fundamento no art. 85, §§3º e 4º do NCPC, ficando tais verbas suspensas diante do deferimento da justiça gratuita.

P. R. I.Transitada em julgado, satisfeitas as obrigações fiscais, arquive-se.

Descontente, a autora interpôs recurso de apelação (fls. 185/187), alegando que não teve participação no contrato de compra e venda firmado entre a requerida e o Sr. Fábio e nem tinha conhecimento da ação judicial n. 139.09.001980-3, que visava rescindir aludido pacto. Afirmou que sua posse não é precária, uma vez que, desde 2008, reside no bem, de forma pacífica e sem oposição. Além disso, sustentou que o imóvel lhe foi entregue por seu ex-companheiro, que comprou para que residisse nele com a sua filha, após a separação.

Ao final, pleiteou o conhecimento e provimento do recurso, a fim de julgar procedente o pedido de usucapião formulado nos autos.

Lavrou parecer pela Douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. João Fernando Quagliarelli Borrelli, opinando, em preliminar, pela conversão do feito em diligência para intimar a recorrida para regularizar a sua representação e, posteriormente, proceder a sua intimação para apresentar contrarrazões. Quanto ao mérito, deixou de se manifestar, em razão da desnecessidade de intervenção do Ministério Público na causa.

Em despacho proferido por esta relatora, foi determinada a devolução dos autos ao primeiro grau (fl. 199).

A determinação restou devidamente cumprida (fl. 201), nomeando-se advogado à demandada, que apresentou contrarrazões às fls. 203/209.

Os autos vieram conclusos para julgamento.

VOTO

Inicialmente, diante da entrada em vigor, a partir de 18/03/2016, do Novo Código de Processo Civil (Lei n. 13.105, de 16/03/2015), faz-se necessário definir se a nova lei será aplicável ao presente recurso.

Com relação aos requisitos de admissibilidade recursal, consoante Enunciado administrativo n. 3 do Superior Tribunal de Justiça (aprovado em sessão do Pleno do dia 16/03/16), aquela Corte decidiu que "Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC".

No caso em apreço, a sentença foi prolatada já na vigência do novo CPC, portanto, devem ser observados os requisitos de admissibilidade na forma nele prevista, os quais foram preenchidos, razão pela qual o recurso deve ser conhecido.

Por seu turno, a análise do pleito recursal também deve obedecer aos dispositivos do novo código.

Cuida-se de ação de usucapião especial urbana ajuizada pela apelante, a qual alega, na exordial, ter exercido a posse mansa, pacífica, sem oposição e com animus domini por período superior a 5 anos no imóvel localizado na Rua João Manoel Jaques, 843, lote 4, Condomínio Residencial Hannah, bairro Perequê, Porto Belo.

Como é sabido, a usucapião é forma originária de aquisição de propriedade, prevista na Constituição Federal e no livro "Direito das Coisas", do Código Civil, por meio da qual aquele que exercer posse sobre bem móvel ou imóvel, por determinado período de tempo, adquire o domínio deste.

A espécie "usucapião especial urbana" está prevista nos arts. 183 da Constituição Federal e 1.240 do Código Civil e tem como requisitos para aquisição da propriedade: (1) exercício de posse mansa e pacífica de cinco anos ininterruptos, sem oposição; (2) ânimo de dono; (3) utilização do imóvel para sua moradia ou de sua família; (4) área urbana de até 250 m²; e (5) não ser proprietário de outro imóvel rural ou urbano.

Dispõem os citados artigos:

Art. 183. Aquele que possuir como sua área urbana de até duzentos e cinqüenta metros quadrados, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural.

§ 1º O título de domínio e a concessão de uso serão conferidos ao homem ou à mulher, ou a ambos, independentemente do estado civil.

§ 2º Esse direito não será reconhecido ao mesmo possuidor mais de uma vez.

§ 3º Os imóveis públicos não serão adquiridos por usucapião.

Art. 1.240. Aquele que possuir, como sua, área urbana de até duzentos e cinquenta metros quadrados, por cinco anos ininterruptamente e sem oposição,...

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