Acórdão Nº 0000094-25.2013.8.24.0235 do Primeira Câmara de Direito Público, 22-03-2022

Número do processo0000094-25.2013.8.24.0235
Data22 Março 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0000094-25.2013.8.24.0235/SC

RELATOR: Desembargador JORGE LUIZ DE BORBA

APELANTE: JOACABA ACO E FERRO LTDA (RÉU) APELANTE: RAGNINI & RAGNINI IMOVEIS LTDA (RÉU) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interposto por Joaçaba Aço e Ferro Ltda. e Ragnini & Ragnini Imóveis Ltda. à sentença de procedência parcial do pedido formulado em ação civil pública que lhes move o Ministério Público do Estado de Santa Catarina, cuja parte dispositiva se transcreve (evento 230, Sentença 629, fl. 18, na origem):

Ante todo o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados por Ministério Público de Santa Catarina em face de Joaçaba Aço e Ferro Ltda, Ragnini & Ragnini Ltda, nos termos do art. 487, I, do Código de Processo Civil, para, em consequência:

a) DECLARAR A NULIDADE do Alvará de Construção nº 36/2012 expedido pelo município de Herval d'Oeste;

b) ORDENAR a demolição da obra presente no terreno urbano situado à Rua Airton Senna da Silva, nº 81, Centro, no município de Herval d'Oeste/SC de propriedade de Ragnini & Ragnini Ltda, a ser realizado pelas empresas rés no prazo de 60 (sessenta) dias, devendo abster-se de desenvolver qualquer tipo de atividade sobre a área de preservação permanente.

c) DETERMINAR que as empresas rés, no prazo de 60 (sessenta) dias, apresentem Projeto de Recuperação da Área degradada (PRAD) o qual comporte o restabelecimento da área de APP, inclusive eventuais impactos causados pelas atividades exercidas em outros segmentos do terreno.

Após a aprovação do PRAD pela FATMA, deverá ser dado início à sua execução, no prazo de 30 (trinta) dias. Revogo a decisão de pgs. 156-160.

No mais, com base no princípio da causalidade, condeno as empresas rés ao pagamento das custas processuais. Sem honorários, por ausência de má-fé e pela aplicação da simetria (EAREsp 962.250/SP, Rel. Ministro Og Fernandes, Corte Especial, julgado em 15/08/2018, DJe 21/08/2018).

Nas suas razões (evento 242), alegaram que a sentença merece reforma pois a situação não trata de obra nova, e sim de reforma e ampliação de edificação, tanto que houve prévia autorização administrativa da Fatma e do ente municipal. Aduziram que a pequena ampliação prevista no projeto ocorreu ocupando área no lado oposto ao da margem do Rio do Peixe, não causando dano ambiental nem invadindo área de preservação permanente. Asseveraram que a atividade que pretendem implantar no local não consta na Resolução n. 01/2004 do Consema como sendo potencialmente poluidora (estoque e comercialização/revenda de ferro). Ao final, postularam a oportunidade de regularização.

Ofertadas contrarrazões (evento 251), o feito ascendeu a esta Corte e a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer do Exmo. Sr. Dr. César Augusto Grubba, opinou pela manutenção do decidido (evento 7).

Os apelantes juntaram petição aduzindo: "Com observância do Decreto Municipal 4.229/2020 e Lei Federal 14.285/2021, que passaram a dispor sobre novas regras relativas a matéria, requer seja dado provimento ao recurso para reformar a sentença julgando a ação totalmente improcedente e, alternativamente, revogar a ordem de demolição permitindo que as apelantes providenciem a regularização da obra junto ao município de Herval D´Oeste" (evento 18).

O Ministério Público a quo se manifestou (evento 21).

Vieram os autos à conclusão para julgamento.

VOTO

O recurso preenche os pressupostos de admissibilidade. Passa-se à análise das suas razões.

O Ministério Público do Estado de Santa Catarina ingressou com Ação Civil Pública, com pedido de tutela provisória de urgência, em desfavor de Joaçaba Aço e Ferro Ltda., Ragnini & Ragnini Ltda. e Município de Herval d'Oeste, objetivando obter provimento jurisdicional para anular o Alvará de Construção n. 063/2012, expedido pelo Município de Herval d'Oeste, e proibir a expedição de novos alvarás de construção em área de preservação permanente por parte do Município, bem como condenar as empresas na obrigação de fazer consistente na demolição da construção feita em área de preservação permanente e na recuperação do dano ambiental causado.

O pedido de tutela provisória foi parcialmente deferido para determinar o embargo da obra localizada na rua Airton Senna da Silva, 81, Centro, Herval d'Oeste, realizada pelas apelantes Joaçaba Aço e Ferro Ltda. e Ragnini & Ragnini Ltda. Ao final, o MM. Juiz a quo revogou a decisão que antecipou os efeitos da tutela e julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais, decisão contra a qual os recorrentes ora se insurgem.

Analisando-se a documentação acostada, verifica-se que o imóvel é uma construção antiga que em tese existia antes do advento do Código Florestal de 1965. Assim, seria desnecessária a observância da distância de 15 (quinze) metros dos cursos d'água para sua regularidade.

O Código Florestal de 1965 (Lei n. 4.771/1965), vigente à época da propositura da presente demanda, estabeleceu no art. 2º o que seriam as áreas de preservação permanente:

Art. 2º Considera-se Área de Preservação Permanente, pelo só efeito desta Lei, as florestas e demais fôrmas de vegetação natural situadas:

a) ao longo dos rios ou de qualquer curso d'água desde o seu nível mais alto em faixa marginal cuja largura mínima será:

1 - de 30 (trinta) metros, para os cursos d'água de menos de 10 (dez) metros de largura;

2 - de 50 (cinquenta) metros para os cursos d'água que tenham de 10 (dez) a 50 (cinquenta) metros de largura;

3 - de 100 (cem) metros para os cursos d'água que tenham de 50 (cinquenta) a 200 (duzentos) metros de largura;

4 - de 200 (duzentos) metros para os cursos d'água que tenham de 200 (duzentos) a 600 (seiscentos) metros de largura;

5 - de 500 (quinhentos) metros para os cursos d'água que tenham largura superior a 600 (seiscentos) metros;

A previsão foi mantida no art. 4º do Novo Código Florestal (Lei n. 12.651/2012), justamente com o propósito de garantir a função ecológica e a preservação dos recursos hídricos, paisagem, estabilidade geológica, biodiversidade, fluxo gênico de fauna e flora, assim como a proteção do solo e o bem-estar da população.

Destaca-se, nesse ponto, que o julgamento do Tema 1.010 do Superior Tribunal de Justiça, que cuida da extensão da faixa não edificável a partir das margens de cursos d'água naturais em trechos caracterizados como área urbana consolidada - se corresponde à área de preservação permanente prevista no art. 4º, I, da Lei n. 12.651/2012, cuja largura varia de 30 (trinta) a 500 (quinhentos) metros, ou ao recuo de 15 (quinze) metros determinado no art. 4°, caput, III, da Lei n. 6.766/1979 -, não se aplica ao caso, notadamente porque a obra nem sequer está localizada a 15m (quinze metros) de distância dos cursos d'água.

Na espécie, as apelantes iniciaram a construção de uma estrutura nova no local onde já havia o prédio antigo, o qual, da mesma forma que a obra nova, estava edificado a 7 (sete) metros do Córrego Hipólito e a menos de 4 (quatro) metros do Rio do Peixe, ou seja, dentro da área de preservação permanente.

Nos autos, vê-se que foi realizada vistoria in loco pelos engenheiros sanitaristas Rodrigo Costa e Carlos Regi Pereira, os quais constataram o distanciamento: "a construção situa-se a 7 (sete) metros do rio de menor porte Córrego Hipólito; que em relação à distância da edificação do Rio do Peixe, em períodos normais é de 3,60 (três metros e sessenta centímetros), já em dias chuvosos e em dias com elevação do nível do Rio a distância é 0 (zero) metro" (evento 96, Anexo 51-52).

É certo que tanto o prédio anterior quanto a construção embargada foram feitos em área de preservação permanente (APP), e que não foi observada a distância mínima do Rio do Peixe e do Córrego Hipólito fixada pela legislação pertinente. Nesse ponto, ressalta-se que, conquanto inexistente nos autos a largura precisa do Rio do Peixe, as imagens aéreas dão conta da metragem extensa, superior a 70 metros.

Por outro lado, sob o aspecto da área ser considerada urbana, existem requisitos técnicos que também devem ser observados.

O art. 2º, XIII, da Resolução n. 303/2002, do Conama, apresenta o seguinte conceito de área urbana consolidada:

Art. 2º. Para os efeitos desta Resolução, são adotadas as seguintes definições...

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