Acórdão Nº 0000097-38.2017.8.24.0041 do Primeira Câmara Criminal, 03-05-2022

Número do processo0000097-38.2017.8.24.0041
Data03 Maio 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 0000097-38.2017.8.24.0041/SC

RELATOR: Desembargador CARLOS ALBERTO CIVINSKI

APELANTE: DANIEL FERNANDO CARNEIRO (ACUSADO) ADVOGADO: RENAN SOARES DE SOUZA (DPE) ADVOGADO: THIAGO BURLANI NEVES (DPE) APELANTE: JEFERSON JOSE MIRANDA (ACUSADO) ADVOGADO: RENAN SOARES DE SOUZA (DPE) ADVOGADO: THIAGO BURLANI NEVES (DPE) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

Denúncia: o Ministério Público da comarca de MAFRA/SC ofereceu denúncia em face de Daniel Fernando Carneiro e Jeferson José Miranda, dando-os como incursos nas sanções do art. 33, caput, da Lei 11.343/2006, em razão dos seguintes fatos:

No dia 22 de janeiro de 2017, por volta das 12 horas e 30 minutos, uma guarnição da Polícia Rodoviária Federal realizou a abordagem de uma motocicleta Honda CG 150 Titan ESD, cor vermelha, placa MEF 7037, que se encontrava em atitude suspeita na Rodovia BR 116, Km 7.0, Bairro Faxinal, neste Município de Mafra/SC, oportunidade em que, após realizar revista pessoal no condutor e no passageiro, foi encontrada em poder do denunciado JEFERSON JOSÉ MIRANDA (condutor) 1 (uma) bucha de "maconha", pesando cerca de 4,7 g (quatro gramas vírgula sete decigramas), e com o passageiro DANIEL FERNANDO CARNEIRO, em suas vestes íntimas, 3 (três) porções de "crack", num total de 150,1 g (cento e cinquenta gramas vírgula um decigrama) e 1 (uma) porção de 49,1 g (quarenta e nove gramas vírgula um decigramas) de pasta base de "cocaína", conforme se infere dos laudos periciais das fls. 81-83, tudo sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar. (evento 31/PG, 18-5-2017)

Sentença: o juiz de direito Andre Luiz Lopes de Souza julgou procedente a denúncia para condenar Daniel Fernando Carneiro e Jefferson José Miranda pela prática do crime previsto no art. 33, caput, da Lei 11.343/2006, ao cumprimento de pena privativa de liberdade de 5 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão, em regime inicial fechado, e ao pagamento de 580 (quinhentos e oitenta) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos. Além disso, decretou o perdimento, por confisco, em favor da União, da motocicleta de Honda CG 150, placa MEF 7037 (evento 228/PG, 21-10-2021).

Trânsito em julgado: muito embora não certificado pelo Juízo a quo, verifica-se que a sentença transitou em julgado para o Ministério Público.

Recurso de apelação de Daniel Fernando Carneiro e Jeferson José Miranda: a defesa interpôs recurso de apelação, no qual sustentou que:

a) o apelante Jeferson faz jus à desclassificação da conduta descrita no art. 33 da Lei de Drogas para a figura penal prevista no art. 28 do mesmo diploma, tendo em vista que a pequena quantidade de entorpecente apreendida com o agente, caracteriza consumo pessoal e não a comercialização;

b) subsidiariamente, seja fixado o regime inicial semiaberto em razão da primariedade do apelante Jeferson;

c) quanto ao apelante Daniel, a fixação do regime semiaberto, uma vez que a pena dos delitos anteriores é diminuta quando em comparação à pena do delito em tela.

Requereu o conhecimento e o provimento do recurso desclassificar, em relação a Jeferson, a conduta para aquela descrito no art. 28 da Lei de Drogas. E, ainda, caso mantida a condenação, a alteração do regime para o semiaberto, pleito que se estendeu em relação a Daniel (evento 248/PG, 18-11-2021).

Contrarrazões do Ministério Público: a acusação impugnou as razões recursais, ao argumento de que:

a) inviável a desclassificação, visto que tanto a materialidade quanto a autoria do delito do crime de tráfico resultaram comprovadas;

b) é irrealizável a alteração do regime fixado na sentença em relação ao apelante Jeferson, diante da existência de uma circunstância negativa, o que autoriza o agravamento a teor do art. 33, § 3º, do Código Penal;

c) não há falar em reforma da sentença no que se refere a Daniel Fernando Carneiro, pois o fato de sua reincidência não ser específica não obsta a aplicação do regime fechado.

Postulou o conhecimento do recurso e a manutenção da sentença condenatória (evento 263/PG em 01-02-2022).

Parecer da Procuradoria-Geral de Justiça: o procurador de justiça Leonardo Felipe Cavalcanti Lucchese opinou pelo conhecimento e desprovimento do recurso (evento 11/SG - 11-4-2022).

Este é o relatório que passo ao Excelentíssimo Senhor Desembargador Revisor.

Documento eletrônico assinado por CARLOS ALBERTO CIVINSKI, Desembargador, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc2g.tjsc.jus.br/eproc/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 2109502v35 e do código CRC 6fa11120.Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): CARLOS ALBERTO CIVINSKIData e Hora: 4/5/2022, às 18:6:32





Apelação Criminal Nº 0000097-38.2017.8.24.0041/SC

RELATOR: Desembargador CARLOS ALBERTO CIVINSKI

APELANTE: DANIEL FERNANDO CARNEIRO (ACUSADO) ADVOGADO: RENAN SOARES DE SOUZA (DPE) ADVOGADO: THIAGO BURLANI NEVES (DPE) APELANTE: JEFERSON JOSE MIRANDA (ACUSADO) ADVOGADO: RENAN SOARES DE SOUZA (DPE) ADVOGADO: THIAGO BURLANI NEVES (DPE) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

VOTO

Do juízo de admissibilidade

O recurso preenche os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, motivo pelo qual deve ser conhecido.

Do mérito

A defesa volta-se tão somente contra a condenação do apelante Jeferson José Miranda pela prática do crime de tráfico de drogas (art. 33 da Lei 11.343/2006), sob o argumento de que a quantidade de material entorpecente apreendido revela tão somente a sua condição de usuário a incidir na conduta descrita no art. 28 da Lei de Drogas, ou seja, posse para o próprio consumo.

O crime em comento está assim tipificado:

Art. 33. Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar:

Pena - reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa.

Acerca da diferenciação entre o tráfico e o porte para uso próprio, a Lei 11.343/2006 prevê:

Art. 28. § 2º. Para determinar se a droga destinava-se a consumo pessoal, o juiz atenderá à natureza e à quantidade da substância apreendida, ao local e às condições em que se desenvolveu a ação, às circunstâncias sociais e pessoais, bem como à conduta e aos antecedentes do agente.

Comentando o dispositivo, lecionam Luz Flávio Gomes, Alice Bianchini, Rogério Sanches Cunha e William Terra de Oliveira:

Há dois sistemas legais para decidir se o agente (que está envolvido com a posse ou porte de droga) é usuário ou traficante:

(a) sistema da quantificação legal (fixa-se, nesse caso, um quantum diário para o consumo pessoal; até esse limite legal não há que se falar em tráfico);

(b) sistema do reconhecimento policial ou judicial (cabe ao juiz ou à autoridade policial analisar cada caso concreto e decidir sobre o correto enquadramento típico). A última palavra é a judicial, de qualquer modo, é certo que a autoridade policial (quando o fato chega ao seu conhecimento) deve fazer a distinção entre o usuário e o traficante.

É da tradição brasileira da lei brasileira a adoção do segundo critério (sistema do reconhecimento judicial ou policial). Cabe ao juiz (ou à autoridade policial) reconhecer se a droga encontrada era para destinação pessoal ou para o tráfico. Para isso a lei estabeleceu uma série enorme de critérios. Logo, não se trata de uma opinião do juiz ou de uma apreciação subjetiva. Os dados são objetivos. (...) A lei nova estabeleceu uma série (enorme) de critérios para se descobrir se a droga destina-se (ou não) a consumo pessoal. São eles: natureza e a quantidade da substância apreendida, local e condições em que se desenvolveu a ação, circunstâncias sociais e pessoais, bem como a conduta e os antecedentes do agente. Em outras palavras, são relevantes: o objeto material do delito (natureza e quantidade da droga), o desvalor da ação (locais e condições em que ela se desenvolveu) assim como o próprio agente do fato (suas circunstâncias sociais e pessoais, condutas e antecedentes). É importante saber: se se trata de droga "pesada" (cocaína, heroína etc.) ou "leve" (maconha, v.g.); a quantidade dessa droga (assim como qual é o consumo diário possível); o local da apreensão (zona típica de tráfico ou não); as condições da prisão (local da prisão, local de trabalho do agente etc.); profissão do sujeito, antecedentes etc. A quantidade da droga, por si só, não constitui, em regra, critério determinante. Claro que há situações inequívocas: uma tonelada de cocaína ou maconha revela traficância (destinação a terceiros). Há, entretanto, quantidades que não permitem uma conclusão definitiva. Daí a necessidade de não se valorar somente um critério (o quantitativo), senão todos os fixados na Lei. O modus vivendi do agente (ele vive do quê?) é um dado bastante expressivo. Qual a sua fonte de receita? Qual é sua profissão? Trabalha onde? Quais sinais exteriores de riqueza apresenta? Tudo isso conta para a correta definição jurídica do fato. Não faz muito tempo um ator de televisão famoso foi surpreendido comprando uma quantidade razoável de drogas. Aparentemente, pela quantidade, seria para tráfico. Depois se comprovou ex abundantia sua qualidade de usuário. Como se vê, tudo depende do caso concreto, da pessoa concreta, da droga que foi apreendida, quantidade, etc...

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