Acórdão Nº 0000104-38.2021.8.10.0022 do TJMA. Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão, 3ª Câmara Criminal, 2023

Ano2023
Classe processualApelação Criminal
Órgão3ª Câmara Criminal
Tipo de documentoAcórdão


Gabinete Desembargadora SÔNIA AMARAL

TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL

APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0000104-38.2021.8.10.0022

APELANTE: ANTÔNIO DA SILVA VIEIRA

DEFENSOR PÚBLICO: DIEGO SEREJO RIBEIRO

APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL

RELATORA: DESEMBARGADORA SÔNIA MARIA AMARAL FERNANDES RIBEIRO

EMENTA

APELAÇÃO CRIMINAL. LESÃO CORPORAL NO CONTEXTO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E AMEAÇA. INCIDÊNCIA DAS DISPOSIÇÕES DA LEI MARIA DA PENHA. CONDENAÇÃO PELA LESÃO CORPORAL. SUFICIÊNCIA PROBATÓRIA. ALTERAÇÃO DA VERSÃO DA VÍTIMA. COERÊNCIA E FIRMEZA DA PRIMEIRA VERSÃO COM OS DEMAIS ELEMENTOS DOS AUTOS. ABSOLVIÇÃO PELA AMEAÇA. PROVAS PRODUZIDAS EM INQUÉRITO POLICIAL NÃO CONFIRMADAS EM JUÍZO. NEUTRALIZAÇÃO DOS MOTIVOS E CIRCUNSTÂNCIAS DO DELITO. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA.

I – Incidem as disposições da Lei de nº 11.340/2006 (Lei Maria da Penha) quando se trata de violência praticada no contexto de “relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação”.

II – De rigor, a manutenção da condenação pelo crime do artigo 129, § 9º, do Código Penal (lesão corporal praticada no contexto de violência doméstica), quando suficientemente demonstradas a materialidade e a autoria delitivas. Eventual alteração da versão da vítima para beneficiar o agressor não implica absolvição automática, quando a primeira versão, exposta no frescor dos acontecimentos, mostrar-se mais detalhada, firme e coerente com os demais elementos dos autos.

III – Impõe-se a absolvição do apelante pelo crime do artigo 147 do Código Penal (ameaça), quando os elementos de informação colhidos na fase de inquérito não são corroborados pelas provas produzidas em juízo, em observância ao disposto no artigo 155 do Código de Processo Penal.

IV – Não se presta à negativação dos motivos do crime a referência descontextualizada a precedente judicial – no caso, o AgRg no AREsp 1.441.372/GO –, pois, enquanto tal julgado indica o ciúme como elemento fomentador das estruturas de dominação, o magistrado de origem não especificou qual elemento dos autos conduz à semelhante desdobramento.

V – O fato de a vítima ser mulher e mais fraca fisicamente não induz, por si só, a negativação das circunstâncias do crime, pois o artigo 129, § 9º, do Código Penal, inserido pela Lei da Maria da Penha, já pressupõe a vulnerabilidade da mulher.

VI – Apelação conhecida e parcialmente provida.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Desembargadores que integram a Terceira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão, a unanimidade, e em parcial conformidade com o parecer da Procuradoria Geral de Justiça, em conhecer e dar parcial provimento ao recurso, nos termos do voto da Desembargadora Relatora.

Participaram do julgamento esta relatora e os senhores Desembargadores Gervásio Protásio dos Santos Júnior (Presidente) e Sebastião Joaquim Lima Bonfim .

Sala das sessões da Terceira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão, em São Luís-MA, julgamento finalizado aos dez de julho de Dois Mil e Vinte e três.

Desembargadora SÔNIA Maria AMARAL Fernandes Ribeiro

Relatora

1 Relatório

Trata-se de Apelação Criminal interposta por ANTÔNIO DA SILVA VIEIRA contra sentença da 2ª Vara Criminal de Açailândia, que o condenou a 01 (um) ano, 01 (um) mês e 25 (vinte e cinco) dias de detenção, em regime inicial aberto, pelos crimes do artigo 129, § 9º (lesão corporal praticada no contexto de violência doméstica), e do artigo 147 (ameaça), ambos do Código Penal, em concurso material. Além disso, ante a presença dos requisitos legais, o Juízo de origem deferiu ao réu a suspensão condicional da pena pelo prazo de 02 (dois) anos.

Consta na denúncia que, em 22/01/2021, por volta das 13 horas e 45 minutos, ANTÔNIO DA SILVA VIEIRA descumpriu medidas protetivas de urgência que vigoravam em seu desfavor – entre elas, a de distanciamento da parte ofendida – e se dirigiu à residência da ex-companheira, situada na Rua do Comércio, s/n, bairro Jardim Brasil, Açailândia/MA. Na ocasião, o apelante, após discutir com a vítima e com um dos filhos dela, saiu do imóvel para buscar uma faca e, ao retornar para o interior da residência, lesionou a ex-companheira com um corte na mão. Além disso, após ser expulso do recinto, o réu ainda teria proferido ameaças da seguinte ordem: que “podia ir para onde fosse, que ele acharia ela” e que “podia ser preso, mas quando fosse posto em liberdade iria atrás dela”.

Acionada, a Polícia Militar localizou o réu nas proximidades da BR-010 e efetuou a sua prisão em flagrante. Por conseguinte, com o encerramento das diligências pertinentes à fase policial, o apelante foi denunciado pelos delitos de descumprimento de medidas protetivas de urgência, lesão corporal no contexto de violência doméstica e de ameaça, de modo que, após o transcurso regular da instrução processual, findou por ser absolvido da primeira imputação e condenado pelos outros dois crimes.

1.1 Argumentos do apelante

1.1.1 Não incidência das disposições da Lei Maria da Penha ao caso sob análise;

1.1.2 Absolvição dos crimes de lesão corporal e de ameaça, posto que a condenação está lastreada apenas em elementos de informação produzidos na fase policial;

1.1.3 Neutralização das vetoriais dos motivos e das circunstâncias do crime, na primeira fase da dosimetria dos dois delitos pelos quais fora condenado;

1.1.4 Afastamento da agravante do artigo 61, inciso II, alínea “f”, do Código Penal da dosimetria do crime de ameaça.

1.2 Argumentos do apelado

1.2.1 Aderência do caso concreto às disposições da Lei Maria da Penha, ante a vulnerabilidade, a hipossuficiência e a inferioridade física da vítima, que viveu relacionamento com o apelante durante cinco anos;

1.2.2 Suficiência das provas para fins de condenação, posto que a primeira versão da vítima, prestada em...

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