Acórdão Nº 0000110-80.2013.8.24.0072 do Terceira Câmara de Direito Público, 29-03-2022

Número do processo0000110-80.2013.8.24.0072
Data29 Março 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0000110-80.2013.8.24.0072/SC

RELATOR: Desembargador JAIME RAMOS

APELANTE: ADEMIR MELO APELANTE: ESTADO DE SANTA CATARINA RÉU: OS MESMOS

RELATÓRIO

Estado de Santa Catarina, com base no art. 1.022, inciso I, do Código de Processo Civil, opôs estes embargos de declaração, alegando existência de omissão no acórdão embargado porque, "ao deixar de analisar que a decisão interlocutória que se manifestou sobre a legitimidade ativa dos autores não realizou qualquer juízo de mérito sobre a mesma, mas apenas um juízo preliminar, com base na teoria da asserção, deixando a análise concreta da questão para a sentença", deixou de aplicar o entendimento consolidado pelo Superior Tribunal de Justiça através da tese jurídica do Tema 1.004, a qual assentou que "quem adquire a propriedade da área desapropriada após a expropriação é ilegítimo para requerer indenização por desapropriação indireta".

Intimada, a parte embargada ofereceu contrarrazões defendendo a manutenção do acórdão embargado.

VOTO

Nos termos do art. 1.022, incisos I, II e III, do Código de Processo Civil/2015, os embargos de declaração, como cediço, servem para complementar decisões omissas proferidas por Juiz ou Tribunal que, eventualmente, tenham deixado de se manifestar sobre questão expressamente alegada pela parte, ou sobre a qual deveria ter se pronunciado, de ofício, por se tratar de matéria de ordem pública. São manejados, também, para expungir do acórdão ou da sentença, eventuais obscuridades e/ou contradições e, ainda, para corrigir eventual erro material.

NELSON NERY JUNIOR e ROSA MARIA DE ANDRADE NERY, acerca da finalidade dos declaratórios, ensinam:

"Os Edcl têm finalidade de completar a decisão omissa ou, ainda, de aclará-la, dissipando obscuridades ou contradições. Não têm caráter substitutivo da decisão embargada, mas sim integrativo ou aclaratório. Prestam-se também à correção de erro material. Como regra, não têm caráter substitutivo, modificador ou infringente do julgado". (Comentários ao Código de Processo Civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015, p. 2.120).

Entretanto, a doutrina e a jurisprudência têm admitido que, em situações excepcionalíssimas, sejam atribuídos efeitos infringentes ou modificativos aos embargos declaratórios, quando o saneamento do vício implicar alteração do julgado embargado.

NELSON NERY JUNIOR e ROSA MARIA DE ANDRADE NERY, acerca da matéria, ensinam que "os Edcl podem ter, excepcionalmente, caráter infringente quando utilizados para: a) a correção de erro material manifesto; b) suprimento de omissão; c) extirpação de contradição. A infringência do julgado pode ser apenas a consequência do provimento dos Edcl [...]" (Comentários ao Código de Processo Civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015, p. 2.120).

O Superior Tribunal de Justiça, a respeito, tem orientado:

"PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. OMISSÃO. OCORRÊNCIA. CONDENAÇÃO DA PARTE REQUERIDA EM HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. CABIMENTO. MÁ-FÉ RECONHECIDA PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. ART. 18 DA LEI N. 7.347/1985. PRINCÍPIO DA SIMETRIA. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO ACOLHIDOS COM EFEITOS INFRINGENTES. 1. A atribuição de efeitos infringentes, em sede de embargos de declaração, somente é admitida em casos excepcionais, os quais exigem, necessariamente, a ocorrência de omissão, contradição, obscuridade, ou erro material, vícios previstos no art. 1.022 do Código de Processo Civil de 2015. "2. In casu, os embargos de declaração merecem ser acolhidos a fim de reconhecer omissão quanto à circunstância de que um dos acusados foi condenado pelo Tribunal de origem por litigância de má-fé, o que teria o condão de manter a condenação à verba honorária. [...] 4. Embargos de declaração acolhidos, com efeitos modificativos, a fim de conhecer e dar provimento ao agravo interno de fls. 3226/3236 e-STJ." (EDcl nos EDcl no AgInt no REsp 1.736.894/ES, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, j. 21/02/2019, DJe 01/03/2019).

"PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO INTERNO NA PETIÇÃO NO RECURSO ESPECIAL. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. APLICABILIDADE. DECLARATÓRIOS ACOLHIDOS, COM EFEITOS INFRINGENTES. CONFIGURADA EXCEPCIONALIDADE. ANULAÇÃO DOS ACÓRDÃOS ANTERIORES. RETORNO DOS AUTOS À CONCLUSÃO PARA OPORTUNO JULGAMENTO. I - Consoante o decidido pelo Plenário desta Corte, na sessão realizada em 09.03.2016, o regime recursal será determinado pela data da publicação do provimento jurisdicional impugnado. Aplica-se o Código de Processo Civil de 2015. II - É possível a modificação do julgado por meio dos Embargos de Declaração, não obstante eles produzam, em regra, tão somente, efeito integrativo. Essa possibilidade de atribuição de efeitos infringentes sobrevém como resultado da presença de um ou mais vícios que ensejam sua oposição e, por conseguinte, provoquem alteração substancial do pronunciamento. III - O acórdão embargado merece correção, ante a ausência de manifestação, no julgamento do Agravo Regimental, sobre a existência de erro na decisão monocrática agravada. IV - Embargos de declaração acolhidos, com excepcionais efeitos infringentes, para anular os acórdãos dos Embargos de Declaração e do Agravo Interno e determinar o retorno dos autos à conclusão a fim de que seja reexaminada a petição de fls. 656/673e." (STJ, EDcl nos EDcl no AgInt na PET no REsp 1.685.054/SC, Rel. Ministra REGINA HELENA COSTA, PRIMEIRA TURMA, j. 21/02/2019, DJe 28/02/2019).

Na espécie, o embargante defende a presença de omissão na decisão embargada porque o acórdão, "ao deixar de analisar que a decisão interlocutória que se manifestou sobre a legitimidade ativa dos autores não realizou qualquer juízo de mérito sobre a mesma, mas apenas um juízo preliminar, com base na teoria da asserção, deixando a análise concreta da questão para a sentença", deixou de aplicar o entendimento consolidado pelo Superior Tribunal de Justiça através da tese jurídica do Tema 1.004, a qual assentou que "quem adquire a propriedade da área desapropriada após a expropriação é ilegítimo para requerer indenização por desapropriação indireta".

Em contrarrazões, a parte embargada ofereceu contrarrazões defendendo a manutenção do acórdão embargado.

Tem razão o Estado embargante.

Isso porque, como se confere dos autos, embora tenha sido reconhecida a legitimidade da parte autora na decisão saneadora apontada no acórdão embargado (Evento 41, PROCJUDIC2, p. 87 e ss.), esta também foi clara ao consignar o seguinte:

"No caso dos autos, sustenta a parte autora que era possuidora do imóvel objeto da desapropriação (ou, no caso, desapossamento). Saber se efetivamente aquela situação narrada corresponde a realidade concreta já envolve o mérito.

AFASTO, por isso, a aventada ilegitimidade ativa."

Ou seja, efetivamente, a análise da questão relativa à ilegitimidade ativa foi relegada para a fase de sentença, tanto é que o digno Magistrado sentenciante assim se pronunciou a respeito:

A propriedade da área apossada pelo requerido está demonstrada pelos documentos de fls. 09-10.

A aquisição da propriedade pelo autor em momento posterior à expropriação não afasta sua legitimidade para perseguir indenização por desapropriação indireta. Até mesmo porque, "a jurisprudência catarinense firmou posição no sentido de que ao adquirente de imóvel expropriado sub-roga-se, automaticamente, na integralidade dos direitos inerentes ao bem, dentre os quais se inclui a pretensão indenizatória acoimada [...]" (Apelação Cível 2014.027192-5, Rel. Des. Cid Goulart, de Maravilha, Segunda Câmara de Direito Público, j. em12/08/2014).

Assim, reconheço a legitimidade ativa do autor.

Por tal motivo, não há como falar em preclusão e, assim, passa-se à análise da alegada ilegitimidade ativa "ad causam" da parte autora.

O ente demandado sustenta a ocorrência da ilegitimidade ativa da parte autora, ao argumento de que a aquisição da propriedade ocorreu após a data do apossamento administrativo.

Razão assiste ao Estado embargante.

Isso porque o Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o REsp n. 1.750.660/SC, afetado pelo regime dos recursos repetitivos para definição do Tema 1.004/STJ, estabeleceu a seguinte tese jurídica:

"Reconhecida a incidência do princípio da boa-fé objetiva em ação de desapropriação indireta, se a aquisição do bem ou de direitos sobre ele ocorrer quando já existente restrição administrativa, fica subentendido que tal ônus foi considerado na fixação do preço. Nesses casos, o adquirente não faz jus a qualquer indenização do órgão expropriante por eventual apossamento anterior. Excetuam-se da tese hipóteses em que patente a boa-fé objetiva do sucessor...

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