Acórdão Nº 0000145-35.2016.8.24.0072 do Primeira Câmara Criminal, 06-02-2020
Número do processo | 0000145-35.2016.8.24.0072 |
Data | 06 Fevereiro 2020 |
Tribunal de Origem | Tijucas |
Órgão | Primeira Câmara Criminal |
Classe processual | Recurso em Sentido Estrito |
Tipo de documento | Acórdão |
ESTADO DE SANTA CATARINA
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
ESTADO DE SANTA CATARINA
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Recurso Em Sentido Estrito n. 0000145-35.2016.8.24.0072, de Tijucas |
Recurso Em Sentido Estrito n. 0000145-35.2016.8.24.0072, de Tijucas
Relator: Des. Carlos Alberto Civinski
PENAL. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO (CPP, ART. 581, IV). CRIME CONTRA A VIDA. HOMICÍDIO SIMPLES (ARTIGO 121, CAPUT, DO CÓDIGO PENAL) E CRIME CONEXO DE CONDUÇÃO DE VEÍCULO AUTOMOTOR SEM HABILITAÇÃO (ARTIGO 309 DA LEI 9.503/1997). DECISÃO DE PRONÚNCIA. RECURSO DO RÉU. PEDIDO DE DESCLASSIFICAÇÃO DO CRIME DOLOSO CONTRA A VIDA PARA HOMICÍDIO CULPOSO NA DIREÇÃO DE VEÍCULO AUTOMOTOR (ARTIGO 302 DA LEI 9.503/1997). INVIABILIDADE. INDÍCIOS DE DOLO EVENTUAL. INDICATIVOS DE QUE O AGENTE, EM TESE, DIRIGIA SEU VEÍCULO COM VELOCIDADE EXCESSIVA, SOB EFEITO DE ÁLCOOL E INVADIU O ACOSTAMENTO, COLHENDO A VÍTIMA PELAS COSTAS. NECESSIDADE DE APRECIAÇÃO PELO CONSELHO DE SENTENÇA. PRONÚNCIA MANTIDA.
- Para a pronúncia não são exigidos os mesmos critérios valorativos dispensados à formação da convicção condenatória; a existência de indícios consistentes que apontam o acusado como autor do delito é suficiente para autorizar o envio do feito à sessão plenária do júri.
- Só é cabível a desclassificação quando houver prova inconteste e que permita juízo de convicção pleno de que o crime cometido é diverso daquele apontado na denúncia.
- Recurso conhecido e desprovido.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso Em Sentido Estrito n. 0000145-35.2016.8.24.0072, da comarca de Tijucas (Vara Criminal), em que é recorrente Paulo César de Jesus, e recorrido Ministério Público do Estado de Santa Catarina:
A Primeira Câmara Criminal decidiu, por votação unânime, conhecer do recurso e negar-lhe provimento. Comunicar a vítima, conforme determinação do art. 201, § 2º, do Código de Processo Penal. Custas legais.
Participaram do julgamento, realizado nesta data, os Desembargadores Ariovaldo Rogério Ribeiro da Silva e Hildemar Meneguzzi de Carvalho.
Florianópolis, 6 de fevereiro de 2020.
Assinado digitalmente
Carlos Alberto Civinski
Presidente e relator
RELATÓRIO
Denúncia: o Ministério Público ofereceu denúncia em face de Paulo César de Jesus, dando-o como incurso nas sanções do artigo 121, caput, do Código Penal, e artigos 304 e 309, ambos da Lei 9.503/1997, em razão dos seguintes fatos:
Consta do incluso inquérito policial que no dia 14.11.2015, por volta das 20h30min, o denunciado Paulo César de Jesus, com a capacidade psicomotora alterada em razão do consumo de álcool, conduzia seu veículo Fiat/Siena, de placas MFY-6047, de São João Batista/SC, em alta velocidade, pela Rodovia SC 410, Nova Descoberta, em Tijucas/SC.
De tal modo, assumindo totalmente o risco de causar um sinistro, em razão de sua condição de embriaguez, o denunciado invadiu o acostamento da Rodovia SC 410, Nova Descoberta, em Tijucas/SC, fazendo com que seu veículo atingisse pelas costas a vítima Eduardo Henrique Dalsenter, que caminhava por aquele local, o qual veio a óbito em razão das lesões sofridas pelo impacto (laudo pericial de fls. 49/51), ressaltando-se que diante da colisão, o corpo da vítima foi lançado a uma distância de 36,33m (laudo pericial de fls. 67/75).
Pelo fato de dirigir sob efeito de álcool, em alta velocidade e por não ter respeitado o acostamento da Rodovia, é inequívoco que o denunciado agiu com dolo eventual, assumindo plenamente o risco de produzir o crime acima descrito.
Ademais, as circunstâncias em que os fatos ocorreram demonstram que o denunciado expôs a perigo comum toda a comunidade local, notadamente aquela residente ou que eventualmente estivesse trafegando ou caminhando pelo local dos fatos.
Além disso, na ocasião do acidente, o denunciado deixou de prestar socorro à vítima, tendo em vista que se evadiu rapidamente do local dos fatos após o sinistro.
Por fim, ao tempo do crime, foi constatado que o denunciado dirigia seu veículo, na Rodovia SC 410, Nova Descoberta, em Tijucas/SC, sem a devida permissão para dirigir ou habilitação. (fls. 1/2)
Decisão de pronúncia: o juiz de direito Mônani Menine Pereira julgou parcialmente admissível o pedido formulado na denúncia para absolver sumariamente o acusado Paulo César de Jesus em relação ao crime descrito no artigo 304 da Lei 9.503/1997 e pronunciá-lo, como incurso nas sanções do artigo 121, caput, do Código Penal, e artigo 309 da Lei 9.503/1997, a fim de submetê-lo a julgamento pelo Tribunal do Júri da comarca de Tijucas (fls. 206-214).
Recurso de Paulo César de Jesus: a defesa interpôs recurso em sentido estrito, sustentando a ausência de dolo eventual na conduta e consequente desclassificação do crime para a modalidade culposa, diante de alegada inexistência de prova de que tenha ingerido bebida alcoólica na ocasião, bem como de que dirigia seu veículo automotor em alta velocidade e tenha atingido a motoneta da vítima na traseira.
Requereu o conhecimento e provimento do recurso para reformar a decisão, a fim de que seja desclassificada a conduta imputada para homicídio culposo na direção de veículo automotor, previsto no artigo 302 da Lei 9.503/1997 (fls. 228-239).
Contrarrazões do Ministério Público: a acusação impugnou as razões recursais, ao argumento de que há indícios suficientes da autoria delitiva para pronunciar o recorrente, razão pela qual caberá ao plenário do Tribunal Júri valorar as provas e decidir pela condenação ou absolvição do acusado, assim como pela possível desclassificação da conduta imputada na denúncia.
Postulou pela manutenção da decisão de pronúncia (fls. 243-252).
Trânsito em julgado: muito embora não certificado pelo Juízo a quo, verifica-se que a decisão transitou em julgado para o Ministério Público.
Juízo de retratação: o Magistrado a quo manteve a decisão recorrida por seus próprios fundamentos (fl. 53).
Parecer da Procuradoria-Geral de Justiça: o procurador de justiça Aurino Alves de Souza opinou pelo conhecimento e desprovimento do recurso (fls. 261-266).
Este é o relatório.
VOTO
Cuida-se de recurso em sentido estrito interposto por Paulo César de Jesus contra decisão de pronúncia, no qual pugna pela desclassificação do crime doloso contra a vida para o delito de homicídio culposo consumado na direção de veículo automotor (artigo 302 da Lei 9.503/1997).
O recurso preenche os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, motivo pelo qual deve ser conhecido. E, em atenção ao princípio tantum devolutum quantum appellatum, a apreciação limita-se à análise dos argumentos expostos em sede recursal.
Inicialmente, cabe transcrever o disposto no § 1º e no caput do art. 413 do Código de Processo Penal:
Art. 413. O juiz, fundamentadamente, pronunciará o acusado, se convencido da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação.
§ 1º A fundamentação da pronúncia limitar-se-á à indicação da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação, devendo o juiz declarar o dispositivo legal em que julgar incurso o acusado e especificar as circunstâncias qualificadoras e as causas de aumento de pena.
A decisão de pronúncia deve indicar a presença de elementos suficientes ao reconhecimento da materialidade e indícios que apontem o agente como autor da conduta descrita. Ela é um mero juízo de admissibilidade da acusação, estando a análise adstrita, tão somente, a prova de materialidade e indícios de autoria, caso contrário, sobrepor-se-ia à competência do Tribunal do Júri.
Antes de analisar a tese recursal, importante colacionar os elementos probatórios presentes no feito.
Da comunicação da ocorrência registrada em 14-11-2015 pela cunhada da vítima fatal, Catia Daltroso Dalsenter, extrai-se (fl. 8):
Que a comunicante é cunhada da vítima; que acredita que por volta das 20:30h, recebeu um telefonema de sua sogra (mãe da vítima) comentando sobre um possível acidente de trânsito envolvendo Eduardo Henrique Dalsenter; que a comunicante foi até a casa de sua sogra, aonde ficou sabendo sobre o local do acidente; que rapidamente se deslocou até a Rodovia SC410, Km10,7 acerca de trezentos metros do Motel Eli; que, quando a comunicante chegou no local do acidente, o qual já estava isolado por policiais rodoviários e militares estaduais; que, no local, a comunicante soube que o condutor do veículo Fiat/Siena, cor branca, placas MFY6047 havia invadido o acostamento e atropelado Eduardo; que, a comunicante conversou com a namorada de Eduardo, de nome Narieli Maria Cipriani, a qual estava junto no horário do acidente e, esta relatou para a comunicante que havia furado o pneu da Honda/Biz, de placa MHS0693, em que eles estavam; que Eduardo estava empurrando a motoneta no acostamento, momento em que o condutor do veículo Siena perdeu o controle e atingiu a Biz e Eduardo; que, a namorada de Eduardo estava mais atrás e não foi atingida pelo carro, tendo apenas ferimentos leves, por ter caído; que, vários transeuntes afirmaram que o condutor do carro estava embriagado e que havia fugido do local do acidente; que, a comunicante sabe informar que várias pessoas que estavam no local depredaram e tentaram atear fogo no carro, antes da chegada da polícia militar; é o relato.
Posteriormente, ouvida na fase policial em 22-11-2015, ratificou os termos do boletim de ocorrência (fl. 18).
O irmão da vítima, Rodrigo Dalsenter, chegou no local da colisão quando o veículo do recorrente e a motoneta (Biz) da vítima estavam sendo guinchados. Sobre os fatos, relatou na fase policial:
[...] Que o depoente relata que passado uns dois dias do ocorrido, voltou ao local do acidente, inconformado com a morte de seu irmão, de apenas dezenove anos de idade; que, conversou com alguns moradores próximos do local do ocorrido e acabou conhecendo o Sr. Altair, o qual relatou para o depoente que presenciou todo...
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