Acórdão Nº 0000161-24.2017.8.24.0049 do Quarta Câmara Criminal, 28-04-2022

Número do processo0000161-24.2017.8.24.0049
Data28 Abril 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 0000161-24.2017.8.24.0049/SC

RELATOR: Desembargador SIDNEY ELOY DALABRIDA

APELANTE: CLAUDIO CAMARGO (ACUSADO) ADVOGADO: FERNANDA TRENTIN (OAB SC022149) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR) OFENDIDO: JONATHA DIORIO FERREIRA (OFENDIDO) OFENDIDO: KARLA DIORIO CAMPOS (OFENDIDO)

RELATÓRIO

Na comarca de Pinhalzinho, o órgão do Ministério Público ofereceu denúncia em face de Cláudio Camargo, imputando-lhe a prática dos delitos capitulados no art. 121, § 2º, II, IV e VI, c/c o art. 14, II, e art. 121, § 2º, II e IV, c/c o art. 14, II, todos do Código Penal, pois, segundo consta na inicial:

No dia 15 de janeiro de 2017, por volta das 20h30min, na Linha São Paulo, Zona Rural, neste município e Comarca de Pinhalzinho, o denunciado Cláudio Camargo, com evidente animus necandi, desferiu diversos golpes de faca1 contra as vítimas Jonathan Diorio Ferreira e Karla Diorio Campos, sua ex-companheira, causando-lhes as lesões descritas nos laudos periciais das fls. 423 e 434 , respectivamente, somente não consumando o seu intento homicida por circunstâncias alheias à sua vontade, isto é, porque as vítimas foram imediatamente socorridas e receberam pronto e eficaz atendimento médico. Por ocasião dos fatos, o denunciado praticou as agressões inicialmente contra a vítima Jonatahn Diorio, tentando sufocá-lo e em seguida desferindo vários golpes de faca. A vítima Karla, por sua vez, passou a ser esfaqueada pelo denunciado no momento em que saiu em defesa de Jonathan, seu filho. Os crimes foram impelidos por motivo fútil, porque o denunciado praticou os delitos em razão de ter discutido com a vítima Karla Diorio Campos em razão do alto volume do rádio. Os crimes foram praticados mediante recurso que dificultou a defesa das vítimas, pois estas passaram a ser agredidas de inopino pelo denunciado. Ainda, o denunciado praticou o crime contra a vítima Karla Diorio Campos, sua companheira, por razões da condição de sexo feminino e prevalecendo-se da relação doméstica e familiar que mantinha com ela (Evento 15, DENUNCIA44, dos autos originários).

O feito prosseguiu em seus ulteriores termos, tendo o Magistrado a quo admitido a denúncia, a fim de pronunciar Cláudio Camargo, dando-o como incurso nas sanções que lhe foram imputadas (Evento 158, SENT277, dos autos originários).

Realizado o Júri e sentenciado o feito, o Magistrado a quo julgou procedente o pedido formulado na inicial, para condenar o réu ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 23 (vinte e três) anos, 1 (um) mês e 10 (dez) dias de reclusão, em regime inicial fechado, além do pagamento de 17 (dezessete) dias-multa, no valor unitário mínimo legal, por infração ao art. 121, § 2º, II, IV e VI, c/c o art. 14, II, e art. 121, § 2º, II e IV, c/c o art. 14, II, todos do Código Penal (Evento 751, SENT1, dos autos originários).

Inconformado com a prestação jurisdicional, o réu interpôs apelação criminal, mediante a qual postulou a anulação do julgamento, sob a assertiva de que a decisão do Conselho de Sentença foi contrária às provas dos autos, haja vista que não era inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato em razão da embriaguez patológica.

Aduziu que não agiu com animus necandi e desistiu voluntariamente de prosseguir na execução do delito, nos moldes do art. 15 do Código Penal.

Asseverou, ainda, que devem ser afastadas as qualificadora do motivo fútil e da surpresa, porquanto os acontecimentos foram precedidos de discussão com as vítimas, como também do feminicídio, uma vez que o decorreram do desacerto e da ingestão de bebida alcoólica, que levaram à perda do controle.

Por derradeiro, postulou a concessão de verba honorária (Evento 812, RAZAPELA1, dos autos originários).

Apresentadas as contrarrazões (Evento 816, CONTRAZAP1, dos autos originários), a douta Procuradoria-Geral de Justiça, por intermédio do Exmo. Dr. Humberto Francisco Scharf Vieira, manifestou-se pelo conhecimento e não provimento do reclamo (Evento 12, PROMOÇÃO1).

Documento eletrônico assinado por SIDNEY ELOY DALABRIDA, Desembargador Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc2g.tjsc.jus.br/eproc/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 2056489v12 e do código CRC c226501b.Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): SIDNEY ELOY DALABRIDAData e Hora: 7/4/2022, às 15:32:17





Apelação Criminal Nº 0000161-24.2017.8.24.0049/SC

RELATOR: Desembargador SIDNEY ELOY DALABRIDA

APELANTE: CLAUDIO CAMARGO (ACUSADO) ADVOGADO: FERNANDA TRENTIN (OAB SC022149) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR) OFENDIDO: JONATHA DIORIO FERREIRA (OFENDIDO) OFENDIDO: KARLA DIORIO CAMPOS (OFENDIDO)

VOTO

Satisfeitos os requisitos legais de admissibilidade, conhece-se do apelo.

Sabe-se que as decisões do Tribunal do Júri, em regra, não podem ser modificadas, por força do princípio da soberania dos vereditos, previsto no art. 5º, XXXVIII, "c", da Constituição Federal. Logo, o respectivo recurso de apelação criminal deverá conter motivação vinculada às hipóteses legais previstas no inciso III do art. 593 do Código de Processo Penal, sob pena de não ser conhecido.

A respeito da alínea "d" do inciso III do art. 593 do Código de Processo Penal, colhe-se da doutrina de Renato Brasileiro:

[...] para que seja cabível apelação com base nessa alínea e, de modo a se compatibilizar sua utilização com a soberania dos veredictos, é necessário que a decisão dos jurados seja absurda, escandalosa, arbitrária e totalmente divorciada do conjunto probatório constante dos autos. Portanto, decisão manifestamente contrária à prova dos autos é aquela que não encontra nenhum apoio no conjunto probatório, é aquela que não tem apoio em nenhuma prova, é aquela que foi proferida no arrepio de tudo que consta nos autos, enfim, é aquela que não tem qualquer prova ou elemento informativo que a suporte ou justifique, e não aquela que apenas diverge do entendimento dos juízes togados a respeito da matéria (Manual de processo penal. v. II. Niterói: Impetus, 2012. p. 969-970).

Com efeito, compete a esta Corte verificar apenas a congruência, ainda que alicerçada em parcos elementos que prestigiem a versão não preferida pelo recorrente, da decisão dos jurados com o conjunto probatório.

1 Ausência de animus necandi

Argumentou o apelante que a decisão condenatória, ao rejeitar a tese de que não pretendia matar as vítimas e praticou crimes menos grave, é manifestamente contrária à prova dos autos, razão pela qual requer a anulação do julgamento, com a consequente realização de novo Júri.

Em que pesem as alegações defensivas, forçoso reconhecer que a tese acusatória, acolhida na sessão plenária, encontra respaldo nos elementos constantes do caderno processual, circunstância que impede a pretendida anulação.

Vale dizer que tanto a materialidade como a autoria delitiva, ainda que não controvertidas no reclamo, encontram suporte no boletim de ocorrência (Evento 1, INQ4-6), nos laudos periciais de lesão corporal (Evento 13, LAUDO / 42 e Evento 14, LAUDO / 43), no exame em local de ação violenta (Evento 117, LAUDO / 177-193), nos laudos periciais complementares (Evento 117, LAUDO / 202-203, todos dos autos originários), bem como na prova oral coligida.

Ouvido sob o crivo do contraditório na fase do judicium accusationis, o apelante Cláudio Camargo admitiu ter discutido com Karla Diorio Campos e ingerido bebida alcoólica, mas disse que não se lembrava de nada mais do dia dos fatos, em razão do avançado estado de embriaguez. Já durante a sessão de julgamento, afirmou não se recordar do ocorrido (Evento 88, VÍDEO330, e Evento 738, VÍDEO1, ambos dos autos originários).

Sempre que perquiridas, as vítimas Karla Diorio Campos e J. D. F. descreveram detalhadamente que os fatos ocorreram conforme descritos pela acusação, no sentido de que o acusado, ex-companheiro da primeira que ainda compartilhava da residência, em razão de mero descontentamento daquela com o volume do som que este ouvia, atacou-lhes de inopino, desferindo-lhes múltiplos golpes de faca, somente não consumando o intento homicida por circunstâncias alheias à sua vontade (Evento 1, INQ18-19, Evento 95, VÍDEO326 e 328, Evento 738, VÍDEO2-3, todos dos autos originários).

Vale pinçar da decisão de pronúncia as declarações ofertadas na primeira fase do rito especial do Tribunal de Júri:

[...] que Cláudio Camargo era seu ex-companheiro, mas ambos dividiam residência para divisão de custos. Que no dia dos fatos, Cláudio pediu para reatarem o relacionamento, sendo negado por Karla. Que em razão dessa negativa, Cláudio ficou bebendo cachaça na varanda da casa, enquanto a vítima estava no interior da residência, assistindo à TV. Que em razão de Cláudio estar ouvindo rádio em volume alto, pediu a ele para abaixar o volume, e ele, de ato contínuo, desferiu um tapa em seu rosto. Que em razão disso, desferiu 2 tapas em Cláudio, que apenas sorriu e se dirigiu aos fundos da residência. Que pediu a Cláudio para sair de casa, e como ele não concordou, disse-lhe que ela mesmo sairia. Que nesse momento, chamou seus filhos É. e J. para saírem, pois iriam à casa de sua mãe e enquanto se dirigia ao seu veículo no exterior da residência ouviu uma gritaria no interior da residência e se dirigiu para lá, pois Cláudio havia ido atrás das crianças. Que ao entrar na casa, viu Cláudio segurando J. pelo pescoço, dentro do banheiro, mas até ali não tinha visto faca alguma em poder de Cláudio. Que ao tentar amenizar a situação, levou a primeira facada de Cláudio, embaixo do braço, na lateral do tronco. Que ao levar a facada, caiu de joelhos, pois a faca entrou inteira, e depois Cláudio ainda a golpeou nas costas. Que enquanto estava sendo golpeada viu que J. havia levado uma facada também, pois já havia poça de sangue no chão. Que depois de cessar as facadas na declarante, Cláudio retomou a...

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