Acórdão Nº 0000167-76.2020.8.24.0000 do Segundo Grupo de Direito Criminal, 30-10-2020

Número do processo0000167-76.2020.8.24.0000
Data30 Outubro 2020
Tribunal de OrigemCapital
ÓrgãoSegundo Grupo de Direito Criminal
Classe processualEmbargos Infringentes e de Nulidade
Tipo de documentoAcórdão


Embargos Infringentes e de Nulidade n. 0000167-76.2020.8.24.0000, da Capital

Relator: Desembargador Ernani Guetten de Almeida

EMBARGOS INFRINGENTES E DE NULIDADE. TRÁFICO DE ENTORPECENTES E PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO E DE MUNIÇÕES DE USO RESTRITO. PRETENSÃO DE ACOLHIMENTO DO VOTO VENCIDO.

CRIME DE TRÁFICO DE ENTORPECENTES. MAGISTRADO A QUO QUE VALOROU NEGATIVAMENTE AS 'CIRCUNSTÂNCIAS DO CRIME' EM RAZÃO DA NATUREZA E VARIEDADE DOS ENTORPECENTES APREENDIDOS, UTILIZANDO A TEORIA DO 'TERMO MÉDIO'. ANÁLISE DAS CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS DO ART. 59 DO CÓDIGO PENAL QUE NÃO PODE FICAR ADSTRITA A CRITÉRIO PURAMENTE MATEMÁTICO. MAJORAÇÃO, NO ENTANTO, QUE SE MOSTRA ADEQUADA AO CASO CONCRETO EM QUE A ABORDAGEM POLICIAL E PRISÃO EM FLAGRANTE OCORRERAM APÓS DENÚNCIAS DE TRÁFICO DE ENTORPECENTES, CULMINANDO NA APREENSÃO DE SUBSTÂNCIAS CONHECIDAS COMO MDMA, MACONHA E COCAÍNA, BEM COMO BALANÇA DE PRECISÃO E RÁDIOS COMUNICADORES. PRETENSÃO DE COMPENSAÇÃO INTEGRAL DO AUMENTO DA PENA-BASE COM A ATENUANTE DE MENORIDADE RELATIVA. INADMISSIBILIDADE. MAJORAÇÃO NA PRIMEIRA FASE DOSIMÉTRICA EM RAZÃO DE AMBAS QUANTIDADE E NOCIVIDADE DAS DROGAS. EMBARGANTE, ADEMAIS, QUE CONTAVA COM VINTE ANOS DE IDADE. PRETENSÕES REJEITADAS

PORTE DE MUNIÇÃO DE USO RESTRITO ( ART. 16, CAPUT, DA LEI N. 10.826/2003). PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO ANTE A ATIPICIDADE DA CONDUTA DECORRENTE DA APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INVIABILIDADE. CRIME DE MERA CONDUTA E DE PERIGO ABSTRATO. OUTROSSIM, DESCLASSIFICAÇÃO DE OFÍCIO PARA O CRIME DE PORTE ILEGAL DE MUNIÇÃO DE USO PERMITIDO (ART. 14 DA LEI N. 10.826/03) EM RAZÃO DAS ALTERAÇÕES ADVINDAS COM O DECRETO N. 9.847/2019 E PORTARIA N. 1.222/2019 DO COMANDO DO EXÉRCITO BRASILEIRO. NOVATIO LEGIS IN MELLIUS (ART. 2º, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CÓDIGO PENAL).

CRIME DE PORTE DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO. VALORAÇÃO NEGATIVA DAS 'CIRCUNSTÂNCIAS DO CRIME'. ARMA MUNICIADA. MANUTENÇÃO. DELITO QUE ABSORVE O PORTE DE MUNIÇÕES DE USO PERMITIDO E ELEVA A PRONTA LESIVIDADE DO ARMAMENTO.

EMBARGOS REJEITADOS. DESCLASSIFICAÇÃO, DE OFÍCIO, DO CRIME DE PORTE ILEGAL DE MUNIÇÃO DE USO RESTRITO PARA DE USO PERMITIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Embargos Infringentes e de Nulidade n. 0000167-76.2020.8.24.0000, da comarca da Capital (4ª Vara Criminal) em que é/são Embargante(s) Matheus Fedrigo de Quadros.

O Segundo Grupo de Direito Criminal decidiu, por maioria de votos, rejeitar os embargos e, de ofício, desclassificar o crime de porte ilegal de munição de uso restrito para de uso permitido, vencidos os Exmos. Srs. Deses. Cinthia Beatriz da S. Bittencourt Schaefer, Sidney Eloy Dalabrida e Ariovaldo Rogério Ribeiro da Silva, que acolhiam parcialmente os embargos. Custas legais.

Presidiu o julgamento, realizado nesta data, a Exma. Sra. Desa. Cinthia Beatriz da S. Bittencourt Schaefer, com voto, e dele participaram os Exmos. Srs. Deses. Luiz Cesar Schweitzer, Sidney Eloy Dalabrida, Ariovaldo Rogério Ribeiro da Silva, Hildemar Meneguzzi de Carvalho, Zanini Fornerolli, Carlos Alberto Civinski e Getúlio Corrêa. Funcionou como Representante do Ministério Público o Exmo. Sr. Dr. Francisco Bissoli Filho.

Florianópolis, 30 de outubro de 2020.

Desembargador Ernani Guetten de Almeida

Relator


RELATÓRIO

Trata-se de Embargos Infringentes formulados por Matheus Fedrigo de Quadros, condenado pela prática dos crimes previstos nos arts. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006 e 14 e 16 da Lei n. 10.826/2003, contra acórdão proferido pela Primeira Câmara Criminal que, por maioria de votos, deu parcial provimento à Apelação Criminal por si formulada, vencido o Exmo. Sr. Des. Ariovaldo Rogério Ribeiro da Silva que votou no sentido de readequar as penas impostas e fixá-las em 7 (sete) anos de reclusão, em regime semiaberto, e pagamento de 593 (quinhentos e noventa e três) dias-multa, por infração ao disposto nos artigos 33, caput, da Lei n. 11.343/2006, e 14 da Lei n. 10.826/2003, absolvendo o acusado da imputação do delito previsto no artigo 16 da Lei n. 10.826/2003, com fundamento no artigo 386, inc. III, do Código de Processo Penal, conforme ementa que se transcreve:

APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS (ARTIGO 33, CAPUT, DA LEI N. 11.343/2006), PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO E MUNIÇÕES DE USO PERMITIDO (ARTIGO 14, CAPUT, DA LEI N. 10.826/2003) E PORTE ILEGAL DE MUNIÇÕES DE USO RESTRITO (ARTIGO 16, CAPUT, DA LEI N. 10.826/2003). CONDENAÇÃO EM PRIMEIRO GRAU. RECURSO DEFENSIVO. MATERIALIDADE E AUTORIA DOS DELITOS SUFICIENTEMENTE COMPROVADAS. IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DO IN DUBIO PRO REO. TRÁFICO DE DROGAS. PENA-BASE. AUMENTO QUE SE PAUTOU EM FRAÇÕES EXTRAÍDAS DO INTERVALO ENTRE A PENA MÍNIMA E MÁXIMA OBTIDA DO PRECEITO SECUNDÁRIO DO TIPO PENAL. ENTENDIMENTO DA MAIORIA NO SENTIDO DE ADMITIR REFERIDO CRITÉRIO QUANDO HÁ FUNDAMENTAÇÃO ADEQUADA E A MAJORAÇÃO NÃO SE MOSTRAR DESPROPORCIONAL. POSICIONAMENTO DESTE RELATOR NO SENTIDO DE QUE O AUMENTO DEVE TER COMO PONTO DE PARTIDA A PENA MÍNIMA E DEVE SEGUIR O PARÂMETRO DE 1/6 (UM SEXTO). PENA-BASE AUMENTADA EM RAZÃO DA QUANTIDADE E VARIEDADE DE DROGA. ACERTO. COMPENSAÇÃO DA CIRCUNSTÂNCIA DESFAVORÁVEL COM A ATENUANTE DA MENORIDADE RELATIVA. ENTENDIMENTO DA MAIORIA QUE MANTEVE A REDUÇÃO DA PENA EM 11 (ONZE) MESES HAJA VISTA ESTAR O RÉU NA IMINÊNCIA DE COMPLETAR 21 (VINTE E UM) ANOS. DIVERGÊNCIA NO PONTO DO RELATOR. INCIDÊNCIA DO REDUTOR PREVISTO NO ARTIGO 33, § 4º, DA LEI N. 11.343/2006. INVIABILIDADE. RÉU QUE SE DEDICAVA A ATIVIDADES CRIMINOSAS. PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO E MUNIÇÕES DE USO RESTRITO E PERMITIDO. PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO DO ÓRGÃO MINISTERIAL. ALEGADA INSIGNIFICÂNCIA DE PORTAR MUNIÇÕES DESACOMPANHADAS DE ARMA DE FOGO. DESCABIMENTO. CONTEXTO FÁTICO QUE NÃO PERMITE TER COMO INSIGNIFICANTE A CONDUTA DO RÉU QUE PORTAVA MUNIÇÕES PARA ARMA DE FOGO DE USO RESTRITO. VOTO DO RELATOR NO SENTIDO DE ABSOLVER O ACUSADO DO DELITO DESCRITO NO ARTIGO 16 DO ESTATUTO DO DESARMAMENTO. DOSIMETRIA. ALTERAÇÃO DA REPRIMENDA IMPOSTA QUANTO AO DELITO DO ARTIGO 14, CAPUT, DA LEI N. 10.826/2003. MAJORAÇÃO DA PENA-BASE. ARMA MUNICIADA. AUMENTO COERENTE. POSICIONAMENTO DIVERGENTE DO RELATOR. IMPOSSIBILIDADE DE FIXAÇÃO DO REGIME SEMIABERTO. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. (TJSC, Apelação Criminal n. 0005449-94.2018.8.24.0023, da Capital, rel. Ariovaldo Rogério Ribeiro da Silva, Primeira Câmara Criminal, j. 13-06-2019).

Em suas razões a defesa requereu a prevalência do voto vencido, aos argumentos de que: a) o aumento da pena do crime de tráfico de entorpecentes na primeira fase dosimétrica seria excessivo e desproporcional, uma vez que o Magistrado utilizou-se de cálculo aritmético entre as penas mínima e máxima do delito (dez anos) dividido pelo número de circunstâncias judiciais (sete, pois prejudicado o comportamento da vítima), majorando a reprimenda em 17 (dezessete) meses por apenas uma delas, em detrimento da fração de 1/6 (um sexto) para cada circunstância, conforme consolidado neste Tribunal de Justiça; b) a atenuante da menoridade relativa deveria ser integralmente compensada, na segunda fase dosimétrica, com a circunstância judicial valorada negativamente na primeira etapa, inexistindo "[...] qualquer margem legal que permita dosar a atenuante por estar o agente mais perto dos 18 ou mais perto dos 21 anos de idade [...]" (p. 18), sendo que no caso concreto o ora embargante tinha recém atingido 20 (vinte anos de idade); c) o embargante foi preso na posse de quatro munições 9mm desacompanhadas de arma de fogo, de forma que a conduta "[...] revela-se incapaz de gerar dano a outrem, sendo comportamento atípico, na medida em que não colocou em risco o bem jurídico tutelado pelo tipo penal, qual seja, a incolumidade pública [...]" (p. 23), o que foi inclusive suscitado pelo Ministério Público em alegações finais; d) o Magistrado fundamentou o aumento da pena base do delito previsto no art. 14 da Lei n. 10.826/2006 no fato de a arma de fogo estar municiada, entretanto esta circunstância seria elementar do tipo; e) o delito previsto no art. 16 da Lei n. 10.826/2006, caso inacolhida a pretensão absolutória, deveria ser desclassificado para a conduta prevista no art. 14 da referida lei em razão da superveniência do Decreto n. 9.847/2019.

Lavrou parecer pela douta Procuradoria de Justiça o Exmo. Sr. Dr. Paulo Roberto Speck, pelo parcial provimento dos embargos "[...] para que seja reduzida a pena-base fixada para o delito de tráfico de drogas, readequando-a na segunda fase em conformidade com o princípio da proporcionalidade e, por consequência, a reprimenda total imposta [...]" (pp. 40/42).

Este é o relatório.


VOTO

Trata-se de Embargos Infringentes formulados por Matheus Fedrigo de Quadros que pretende a prevalência do entendimento proferido pelo Exmo. Sr. Des. Ariovaldo Rogério Ribeiro da Silva no julgamento realizado pela Primeira Câmara Criminal, que, por maioria de votos, deu parcial provimento ao apelo por si formulado.

1. O embargante sustentou que o aumento da pena do crime de tráfico de entorpecentes na primeira fase dosimétrica seria excessivo e desproporcional, uma vez que o Magistrado utilizou-se de cálculo aritmético entre as penas mínima e máxima do delito (dez anos) dividido pelo número de circunstâncias judiciais (sete, pois prejudicado o comportamento da vítima), majorando a reprimenda em 17 (dezessete) meses por apenas uma delas, em detrimento da fração de 1/6 (um sexto) para cada circunstância, conforme consolidado neste Tribunal de Justiça.

No caso, o Juiz a quo apontou: "[...] Consigno ainda que na primeira fase da dosimetria tenho, por critério objetivo, que a exasperação da pena em razão de eventual circunstância judicial desfavorável deve equivaler à quantidade variável entre a pena mínima e máxima (conforme, inclusive, autoriza o art. 59, II, CP), dividida pelo número de circunstâncias judiciais aplicáveis ao delito, isto é,...

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