Acórdão Nº 0000187-52.2014.8.24.0073 do Quarta Câmara de Direito Público, 01-12-2022

Número do processo0000187-52.2014.8.24.0073
Data01 Dezembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0000187-52.2014.8.24.0073/SC

RELATOR: Desembargador ANDRÉ LUIZ DACOL

APELANTE: DAGMA SPIESS MILCHERT (AUTOR) ADVOGADO: DIONEI SCHIMANSKI (OAB SC026273) ADVOGADO: TATIANE BONATTI (OAB SC019050) APELADO: MUNICÍPIO DE BENEDITO NOVO-SC (RÉU) MP: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA

RELATÓRIO

Em atenção aos princípios da celeridade e economia processuais, adota-se o relatório da sentença, transcrito na íntegra, por refletir com fidelidade o trâmite processual na origem:

Dagma Spiess Milchert ajuizou Ação Anulatória de Processo Administrativo Disciplinar e de Portaria de Demissão c/c Pedido de Antecipação de Tutela, em face do Município de Benedito Novo, ambos qualificados e representados nos autos, objetivando a anulação do processo administrativo disciplinar e o ato administrativo dele decorrente, que culminou na sua demissão, bem como a reintegração ao cargo e ao pagamento de verbas suprimidas após a demissão, devidamente corrigidas.

Aduziu, em síntese, que ocupava o cargo de Professor P-II-40 no Município requerido e teve instaurado contra si Processo Administrativo Disciplinar, resultante de Processo de Sindicância, no qual ficou evidenciado que houveram adulterações em cupons/notas fiscais referentes à prestação de contas da conta "Adiantamento", enquanto no desempenho das suas funções de Chefe de Divisão de Saúde na Secretaria Municipal de Saúde.

Asseverou que houve cerceamento de defesa e que estaria o processo administrativo eivado de nulidades porquanto: a) não houve denúncia escrita para a instauração da sindicância; b) a portaria inaugural do PAD não trouxe a capitulação das infrações; c) não houve termo de juntada após a juntada de documentos; d) foram juntados documentos após o relatório da comissão; e) ausência de motivação na decisão da autoridade que aplicou a pena de demissão à autora; f) a identidade de membros da sindicância e da comissão e g) a ausência de provas que resultaram na aplicação da pena de demissão.

Referindo-se às disposições da Constituição Federal, da jurisprudência pátria e da doutrina administrativa, postulou a antecipação dos efeitos da tutela para declarar a nulidade de processo administrativo disciplinar e do ato de demissão dele decorrente, bem como do crédito passível de ressarcimento, sendo reintegrada no cargo de Professor P-IIII-40 e, ao final, a procedência do pedido, com a condenação do Município às custas processuais e ao ônus da sucumbência. Requereu, outrossim, a concessão dos benefícios da justiça gratuita. Juntou documentos.

Em decisão, foi indeferido o pedido de antecipação dos efeitos da tutela perseguida, por não estarem presentes os seus requisitos autorizadores. Por fim, os benefícios da justiça gratuita foram concedidos à autora.

Foi juntada decisão monocrática que negou o efeito ativo pleiteado em agravo de instrumento interposto pela autora, bem como acórdão que negou-lhe provimento.

Citado, o Município de Benedito Novo apresentou contestação, defendendo a legalidade do procedimento administrativo guerreado e suscitando a ausência dos requisitos autorizadores da tutela provisória de urgência. Anexou documentos.

Houve réplica.

Foram realizadas audiências, oportunidades em que foram ouvidas as testemunhas e a autora.

O Município requerido encartou documentos, tendo a autora apresentado manifestação.

As partes apresentaram alegações finais.

O Ministério Público lavrou parecer destacando a falta de interesse público a justificar sua intervenção no feito.

Os autos vieram conclusos.

É o relatório. Decido.

Sobreveio sentença (evento 107, SENT1, origem), a qual julgou a lide nos seguintes termos:

Ante o exposto, com fundamento no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos iniciais deduzidos por Dagma Spiess Milchert em face do Município de Benedito Novo.

Diante da sucumbência, condeno a autora ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, os quais fixo em 10% do valor atualizado da causa, tendo em vista o zelo profissional e a natureza da demanda (CPC, art. 85, § 2º). Suspendo, contudo, sua exigibilidade, porque beneficiária da gratuidade da justiça (CPC, art. 98, § 3º).

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Certificado o trânsito em julgado e observadas as formalidades legais, arquivem-se os autos definitivamente, com as devidas anotações no sistema.

Opostos aclaratórios pela parte autora (evento 113, EMBDECL1, origem), os quais foram rejeitados ao evento 117, SENT1 da origem.

Inconformada, a parte autora interpôs recurso de apelação (evento 121, APELAÇÃO1, origem). Em suas razões, asseverou preliminarmente que: a) a decisão recorrida "deixou de se pronunciar sobre requerimento específico de desentranhamento de documentos (notas fiscais em tese adulteradas) juntados de forma extemporânea nesta ação judicial pela parte demandada"; b) o juízo singular não enfrentou a tese de nulidade do processo administrativo em razão da juntada de tabelas e planilhas produzidas unilateralmente após a apresentação de defesa administrativa, desacompanhadas de quaisquer documentos a lastreá-las; c) o juízo a quo não enfrentou a arguição de contradição pelo fato de ter considerado os documentos extemporâneos como suficientes para subsidiar a decisão.

No mérito, argumentou que: a) "comprometida a ampla defesa da Apelante no processo administrativo em questão, forçoso concluir pela nulidade da penalidade de demissão a ela aplicada"; b) a não indicação das condutas investigadas e não capitulação das infrações atribuídas na portaria inaugural e no ofício para cientificação, por si só, resultariam em insegurança jurídica e prejuízo; c) "impossível exercer plenamente o direito de defesa sem conhecer de forma exata a acusação"; d) foi citada em processo que buscava apurar adulteração de documentos de prestação de contas, porém culminou em portaria de demissão e ressarcimento ao erário público; e) a prova documental demonstra identidade entre a maioria dos membros das comissões de sindicância e processante; f) a portaria de demissão não foi antecedida de decisão motivada; g) a ausência de prova das adulterações e apropriações, bem como da autoria, constituem óbices intransponíveis à condenação; h) a demissão decorrente de processo disciplinar não pode ser considerada legal e motivada; i) nenhum cupom ou nota fiscal em tese adulterado instruiu o feito administrativo; j) não restou comprovada a apropriação de valores; k) a pretensa assunção de responsabilidade pela apelante não pode prevalecer, pois decorrente de sentimento de pressão, que pode ser presumida no depoimento do informante Ramides e na existência de reuniões com o Prefeito e contadora; l) "nem mesmo sob o argumento de pretensa confissão colhida na fase de sindicância seria viável concluir pela condenação da Apelante no processo administrativo disciplinar"; m) as provas da investigação poderiam autorizar a abertura de processo, e as confirmadas nos autos autorizariam eventual condenação; n) o fato de terem sido feitos reembolsos de valores a motoristas, apesar das rasuras ou desacordo com os valores estipulados, não autoriza a presunção de que fosse a responsável por adulterações nas notas fiscais ou apropriação de valores.

Ao final, pugnou:

Dadas as circunstâncias, requer-se seja a presente APELAÇÃO CÍVEL conhecida, e ao final provida, para: reconhecendo a negativa de prestação jurisdicional pela sentença recorrida, cassá-la, a fim de reexaminar o mérito da causa e proferir decisão de procedência da pretensão autoral, nos moldes da inicial.

Na remota hipótese de assim não entenderem Vossas Excelências, o que se admite para argumentar, requer-se seja a presente APELAÇÃO CÍVEL conhecida e provida para reformar a sentença recorrida, e julgar procedentes os pedidos formulados na inicial.

Contrarrazões ao evento 126, CONTRAZAP1 da origem.

A Procuradoria-Geral de Justiça manifestou-se pela desnecessidade de intervenção ministerial (evento 12, PROMOÇÃO1).

Vieram os autos conclusos.

VOTO

1. Compulsando os autos, observo a presença de todos os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade, razão por que conheço do recurso.

2. Em sede preliminar, a parte apelante almeja a declaração de nulidade da sentença sob três premissas distintas, quais sejam, a de que a decisão recorrida "deixou de se pronunciar sobre requerimento específico de desentranhamento de documentos (notas fiscais em tese adulteradas) juntados de forma extemporânea nesta ação judicial pela parte demandada", de que o juízo singular não enfrentou a tese de nulidade do processo administrativo em razão da juntada de tabelas e planilhas produzidas unilateralmente após a apresentação de defesa administrativa e de que o juízo a quo não enfrentou a arguição de contradição pelo fato de ter considerado documentos extemporâneos como suficientes para subsidiar a decisão.

Sem razão nos argumentos aduzidos.

Como se sabe, "o julgador não está obrigado a responder a todas as questões suscitadas pelas partes, quando já tenha encontrado motivo suficiente para proferir a decisão. O julgador possui o dever de enfrentar apenas as questões capazes de infirmar (enfraquecer) a conclusão adotada na decisão recorrida. Assim, mesmo após a vigência do CPC/2015, não cabem embargos de declaração contra a decisão que não se pronunciou sobre determinado argumento que era incapaz de infirmar a conclusão adotada" (STJ, 1ª Seção. EDcl no MS 21.315-DF, Rel. Min. Diva Malerbi, j. 8/6/2016).

In casu, após transcrever de maneira acurada os depoimentos colhidos em juízo e destacar os dispositivos legais aplicáveis ao caso concreto, a magistrada sentenciante assim fundamentou seu pronunciamento (evento 107, SENT1, origem):

Observa-se que o Setor de Contabilidade do Município constatou algumas irregularidades referente ao empenho nº 560/2013-FMS, enviando ofício ao Chefe de Controle Interno (ev. 89, anexo589, página1).

Este, por sua vez, enviou o ofício n.º 293/2013 (ev.89, anexo577, página1) ao Secretário Municipal de...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT