Acórdão Nº 0000191-82.2018.8.24.0030 do Terceira Câmara Criminal, 16-08-2022

Número do processo0000191-82.2018.8.24.0030
Data16 Agosto 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 0000191-82.2018.8.24.0030/SCPROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 0000191-82.2018.8.24.0030/SC

RELATOR: Desembargador ERNANI GUETTEN DE ALMEIDA

APELANTE: MATHEUS BONATTI MAESTRI (ACUSADO) ADVOGADO: ALTAMIR FRANÇA (OAB SC021986) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

Na Comarca de Blumenau, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu denúncia em face de Matheus Bonatti Mestri, com 25 (vinte e cinco) anos de idade à época dos fatos, em razão da suposta prática da conduta criminosa prevista no art. 33, caput, da Lei 11.343/2006, diante dos fatos assim narrados (evento 1):

No dia 29 de janeiro de 2018 (segunda-feira), por volta de 11h30min, o denunciado MATHEUS BONATTI MAESTRI foi abordado por Policiais Militares na Av. Porto Novo, Praia do Rosa, Imbituba, quando transportava, embaixo do banco do veículo Hyundai I30, de cor prata, placa OIR-7244, um tablete grande de maconha e dois pedaços pequenos, pesando aproximadamente 800 gramas, para fins de comercialização, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar.

Além disso, em buscas na residência do denunciado, também foi constatado que ele tinha em depósito, igualmente para comercialização, mais um pedaço pequeno de maconha, totalizando a quantia total apreendida 848 (oitocentos e quarenta e oito) gramas.

Por fim, é de se esclarecer que foi apreendida na posse do denunciado a quantia de R$ 430,00 (quatrocentos e trinta reais) em notas miúdas e em sua residência mais R$ 2.000,00 (dois mil reais), dinheiro este proveniente da venda de drogas.

Após a instrução do feito, sobreveio sentença em que a peça acusatória oferecida em desfavor de Matheus Bonatti Maestri foi julgada parcialmente procedente, em cuja parte dispositiva assim constou (evento 134):

JULGO PROCEDENTE a denúncia para CONDENAR MATHEUS BONATTI MAESTRI, pelo crime do artigo 33, §4º, da Lei n. 11.343/06, à pena de 1 (ano), 10 (dez) meses e 15 (quinze) dias de reclusão, no regime inicial aberto, e 188 dias-multa, à razão do mínimo legal a unidade. Nos termos do artigo 44 do Código Penal, substituo a pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade por igual período e ao pagamento de prestação pecuniária no valor equivalente a um salário mínimo, à instituição a ser definida pelo Juízo da Execução Penal.

Condeno ao pagamento das despesas processuais (CPP, art. 804).

Reconheço o direito do réu em responder o processo em liberdade, pois não deu ensejo à decretação da prisão preventiva, bem assim levando em conta o regime fixado e a substituição da pena operada.

A defesa de Matheus Bonatti Maestri interpôs recurso de apelação (evento 141). Em suas razões recursais (evento 11), pugnou, em preliminar, pelo sobrestamento do feito para análise da concessão do acordo de não persecução penal (CPP, art. 28-A). No mérito, pediu pela adequação da capitulação jurídica prevista no art. 33, § 4º, para a disposta no art. 28, caput, ambos da Lei 11.343/2006, diante da violação do art. 50, § 1º, do mesmo diploma legal. Caso mantida a sentença, requereu, na primeira fase, pelo decote da valoração negativa da quantidade de droga e, na terceira fase, a aplicação da minorante do art. 46 da Lei 11.343/2006.

Contrarrazões no evento 17.

Lavrou parecer pela Douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. Jorge Orofino da Luz Fontes, em que opinou pelo parcial conhecimento (salvo quanto ao pedido de acordo de não persecução penal) do recurso e pelo seu desprovimento (evento 21).

Documento eletrônico assinado por ERNANI GUETTEN DE ALMEIDA, Desembargador, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc2g.tjsc.jus.br/eproc/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 2541815v13 e do código CRC cb309ed2.Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): ERNANI GUETTEN DE ALMEIDAData e Hora: 26/7/2022, às 12:30:8





Apelação Criminal Nº 0000191-82.2018.8.24.0030/SCPROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 0000191-82.2018.8.24.0030/SC

RELATOR: Desembargador ERNANI GUETTEN DE ALMEIDA

APELANTE: MATHEUS BONATTI MAESTRI (ACUSADO) ADVOGADO: ALTAMIR FRANÇA (OAB SC021986) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

VOTO

O recurso preenche os requisitos de admissibilidade, motivo pelo qual deve ser conhecido.

Preliminar

A defesa de Matheus Bonatti Maestri pugna pelo sobrestamento do feito para análise da concessão do acordo de não persecução penal (CPP, art. 28-A).

A alteração legislativa promovida pela Lei 13.964/2019 acrescentou o art. 28-A do Código de Processo Penal, o qual introduziu o instituto do acordo de não persecução penal que, por sua vez, ao abrir margem à autocomposição no âmbito criminal, constitui forma de relativizar o princípio da obrigatoriedade da ação penal e culminar, caso formalizado e cumpridas as condições impostas, na extinção da punibilidade do agente.

A propósito, o art. 28-A do Código do Processo Penal dispõe que:

Art. 28-A. Não sendo caso de arquivamento e tendo o investigado confessado formal e circunstancialmente a prática de infração penal sem violência ou grave ameaça e com pena mínima inferior a 4 (quatro) anos, o Ministério Público poderá propor acordo de não persecução penal, desde que necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime, mediante as seguintes condições ajustadas cumulativa e alternativamente: [...].§ 13. Cumprido integralmente o acordo de não persecução penal, o juízo competente decretará a extinção de punibilidade.

Embora não se descuide do entendimento de que possui natureza material, a redação do dispositivo evidencia que o intuito do legislador foi restringir sua abrangência tão somente à fase investigativa, anterior ao recebimento da denúncia. Não por acaso, ao regulamentar o acordo de não persecução penal, o dispositivo acima faz menção apenas a investigado, expressão essa que igualmente é utilizada no art. 28-A, § 3º, , e 11º, e art. 14, do Código de Processo Penal e que não pode ser desprezada para se compreender as limitações legais existentes.

Logo, não há falar em concessão do benefício em processos em curso, como no caso, ainda que tenham iniciados em data anterior à alteração legislativa. Aliás, pela redação do dispositivo legal, também não há qualquer lacuna legal a ser sanada pelos meios de integração - analogia ou interpretação extensiva -, porquanto foi claro o legislador quanto aos destinatários.

Em complemento, válido reforçar que o acordo de não persecução visa mitigar o princípio da obrigatoriedade, e não o da indisponibilidade, que passa a reger a ação penal depois ajuizada pelo Ministério Público. Não há, via reversa, qualquer dispositivo legal que autorize a autocomposição quando já instaurado o processo e levada a efeito a pretensão penal pelo titular da ação.

Como bem esclarece a doutrina:

Questão relevante diz respeito à fase da persecução penal em que tem lugar a formalização do acordo. Não há dúvidas de que, em termos legais, esta possibilidade apenas existe caso ainda não recebida a denúncia, descabendo ao Ministério Público efetivar o ajuste em momento posterior. Isto, aliás, é o que se infere da disciplina legal inserida no art. 28-A do CPP, dispositivo este que, em seus diversos incisos e parágrafos, sempre faz referência ao investigado, nada referindo quanto ao já acusado (condição da pessoa denunciada após o ajuizamento da peça acusatória) ou do réu (status do denunciado depois do recebimento da denúncia). Sem embargo, existe corrente doutrinária defendendo a viabilidade de que, por analogia ao art. 28-A e mediante os mesmos requisitos e condições, seja proposto a quem já é acusado no âmbito de processo criminal regularmente instaurado, um acordo de não continuidade da ação penal. Insistimos, contudo, que não há amparo jurídico para celebração desse último ajuste, importando, a nosso ver, em flagrante ilegalidade, já que implica em mitigar o princípio da obrigatoriedade da ação penal sem que haja lei assim estabelecendo.(AVENA, Norberto. Processo Penal. Grupo GEN, 2020. [Minha Biblioteca]; pg. 310).

A partir dessa premissa, por já ter sido recebida a denúncia, prolatada sentença condenatória e encontrando-se o feito em fase recursal, figura-se inviável eventual concessão do acordo de não persecução penal pelo Ministério Público. O Supremo Tribunal Federal já decidiu (Habeas Corpus 191.464-AgR/SC, Primeira Turma, Rel. Min. Roberto Barroso, j. em 26.11.2020):

AGRAVO REGIMENTAL. HABEAS CORPUS. ACORDO DE NÃO PERSECUÇÃO PENAL EM RELAÇÃO AO DELITO DE ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO DE DROGAS (ART. 35 DA LEI 11.343/2006). INVIABILIDADE.1. As condições descritas em lei são requisitos necessários para o oferecimento do Acordo de Não Persecução Penal (ANPP), importante instrumento de política criminal dentro da nova realidade do sistema acusatório brasileiro. Entretanto, não obriga o Ministério Público, nem tampouco garante ao acusado verdadeiro direito subjetivo em realizá-lo. Simplesmente, permite ao Parquet a opção, devidamente fundamentada, entre denunciar ou realizar o acordo, a partir da estratégia de política criminal adotada pela Instituição.2. O art. 28-A do Código de Processo Penal, alterado pela Lei 13.964/19, foi muito claro nesse aspecto, estabelecendo que o Ministério Público "poderá propor acordo de não persecução penal, desde que necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime, mediante as seguintes condições".3. A finalidade do ANPP é evitar que se inicie o processo, não havendo lógica em se discutir a composição depois da condenação, como pretende a defesa (cf. HC 191.464-AgR/SC, Primeira Turma, Rel. Min. ROBERTO BARROSO, DJe de 26/11/2020).4. Agravo Regimental a que nega provimento.

E do Superior Tribunal de Justiça também extrai-se (AgRg no REsp 1846021/RS, Quinta Turma, j. em 3.11.2020):

AGRAVO REGIMENTAL NA PET NO...

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