Acórdão nº 0000194-81.2013.8.11.0092 Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, Terceira Câmara Criminal, 15-02-2023

Data de Julgamento15 Fevereiro 2023
Case OutcomeNão-Provimento
Classe processualCriminal - APELAÇÃO CRIMINAL - CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS
ÓrgãoTerceira Câmara Criminal
Número do processo0000194-81.2013.8.11.0092
AssuntoHomicídio Simples

ESTADO DE MATO GROSSO

PODER JUDICIÁRIO

TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL


Número Único: 0000194-81.2013.8.11.0092
Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417)
Assunto: [Homicídio Simples, Crime Tentado]
Relator: Des(a).
GILBERTO GIRALDELLI


Turma Julgadora: [DES(A). GILBERTO GIRALDELLI, DES(A). JOSE ZUQUIM NOGUEIRA, DES(A). RONDON BASSIL DOWER FILHO]

Parte(s):
[MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (APELANTE), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (REPRESENTANTE), MAYCON ROGERIO DA SILVA - CPF: 041.273.241-63 (APELADO), DEFENSORIA PUBLICA DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 02.528.193/0001-83 (REPRESENTANTE), FRANCISCO RODRIGUES SILVA - CPF: 056.881.873-36 (VÍTIMA), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS)]


A C Ó R D Ã O
Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a).
LUIZ FERREIRA DA SILVA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO.


E M E N T A

APELAÇÃO CRIMINAL – ART. 121, CAPUT, C/C ART. 14, INC. II, AMBOS DO CÓDIGO PENAL – IMPRONÚNCIA – IRRESIGNAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO – 1. PRETENDIDA A PRONÚNCIA DO APELADO NOS TERMOS DENUNCIADOS – INVIABILIDADE – AUSÊNCIA DE LASTRO PROBATÓRIO MÍNIMO CAPAZ DE RESPALDAR O PRONUNCIAMENTO DO RECORRIDO AO CRIVO DO JÚRI POPULAR – DECLARAÇÕES EXTRAJUDICIAIS DA VÍTIMA NÃO REPRODUZIDAS NEM RATIFICADAS EM JUÍZO – DEPOIMENTO JUDICIAL DE TESTEMUNHA QUE SE LIMITA A RELATAR O QUE OUVIU DIZER DA VÍTIMA – ELEMENTO INFORMATIVO DO INQUÉRITO NÃO CORROBORADO NA FASE PROCESSUAL – ‘HEARSAY TESTIMONY’ QUE, POR SI SÓ, NÃO SATISFAZ O ‘STANDARD’ PROBATÓRIO NECESSÁRIO PARA A DECISÃO DE PRONÚNCIA – PRECEDENTES – IMPRONÚNCIA MANTIDA – 2. APELO CONHECIDO E DESPROVIDO.

1. Na hipótese, as declarações prestadas pela vítima na fase extrajudicial não foram reproduzidas e tampouco confirmadas por ela na etapa judicial, ao passo que a testemunha ouvida em juízo, admitidamente, limitou-se a narrar o que ouviu dizer da vítima, sem agregar subsídio cognitivo autônomo e independente do relato inquisitivo do ofendido, o que significa que os indícios incriminatórios existentes nos autos não satisfazem o standard probatório necessário para decisão de pronúncia, segundo o atual posicionamento das Cortes Superiores.

2. Recurso de apelação criminal conhecido e desprovido.

APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO

APELADO: MAYCON ROGÉRIO DA SILVA


R E L A T Ó R I O

EXMO. SR. DES. GILBERTO GIRALDELLI

Egrégia Câmara:

Trata-se de recurso de apelação criminal interposto pelo MINISTÉRIO PÚBLICO contra a r. sentença proferida pelo d. Juízo da Vara Única da Comarca de Alto Taquari/MT nos autos da ação penal n.º 194-81.2013.8.11.0092 – código 30720, que, com fulcro no art. 414 do Código de Processo Penal, impronunciou o réu MAYCON ROGÉRIO DA SILVA, deixando de submetê-lo a julgamento perante o Egrégio Tribunal do Júri pela prática do crime tipificado no art. 121, caput, c/c art. 14, inciso II, ambos do Código Penal.

Nas razões recursais disponíveis no ID 142656656, o apelante pretende a pronúncia do apelado, nos exatos termos da denúncia, a fim de que ele seja submetido a julgamento pelo Conselho de Sentença do Júri Popular, com arrimo no art. 413 do Código de Processo Penal, alegando que as provas coligidas aos autos, inclusive na etapa judicial, são suficientes para implicar o possível envolvimento do recorrido no crime doloso contra a vida e, consequentemente, para respaldar o seu pronunciamento ao crivo de seus pares na Corte Leiga.

Em contrarrazões vistas no ID 142656664, a defesa técnica do apelado rechaça a pretensão acusatória e requer seja negado provimento ao apelo.

Instada a se manifestar, a i. Procuradoria-Geral de Justiça, por meio do parecer encartado no ID 147902662, opinou pelo desprovimento do recurso ministerial.

É o relatório.

À douta Revisão.


V O T O (MÉRITO)

EXMO. SR. DES. GILBERTO GIRALDELLI (RELATOR)

Egrégia Câmara:

Inicialmente, cumpre reconhecer que o recurso em apreço é tempestivo, foi interposto por quem tinha interesse e legitimidade para fazê-lo, e o meio de impugnação empregado afigura-se necessário e adequado para se atingir a finalidade colimada, motivos por que, estando presentes os requisitos objetivos e subjetivos para a sua admissibilidade, CONHEÇO do apelo manejado pelo i. ORGÃO DE ACUSAÇÃO.

Verte da denúncia que, no dia 21/10/2012, por volta das 22h30min, no estabelecimento comercial denominado Bar Esquenta, situado no bairro Treze Pontos, na Comarca de Alto Taquari/MT, o apelado MAYCON ROGÉRIO DA SILVA, com consciência e vontade, utilizando-se de um revólver da marca Taurus, calibre .32, efetuou 03 (três) disparos de arma de fogo na direção da vítima Francisco Rodrigues da Silva, somente não lhe causando a morte por circunstâncias alheias à sua vontade, uma vez que os projéteis não foram deflagrados.

Segundo a proposição ministerial, na data do fato, o recorrido e a vítimas se encontravam no referido bar, quando, em dado momento, o réu caiu dentro de uma lata de lixo e, após se levantar, dirigiu-se até a vítima e a acusou de tê-lo chamado de “lixo”, ao que o ofendido respondeu negativamente e disse que terceira pessoa havia dito aquilo, sendo que, quando a vítima ia embora do estabelecimento comercial, o increpado desceu de um carro e tentou desferir 03 (três) disparos contra o seu rosto, porém, a arma falhou nas 03 (três) tentativas.

Diante deste fato, o apelado foi denunciado, ao que se seguiu o devido processo legal, culminando na inadmissibilidade da acusação e na sua impronúncia por insuficiência de indícios de autoria delitiva, contexto em que o Parquet agora exsurge inconformado perante esta instância revisora, nos termos já relatados.

Feitas essas breves digressões, passo à análise do mérito.

Como é cediço, a pronúncia constitui decisão de mera admissibilidade da acusação, para a qual basta que haja prova da materialidade criminosa e indícios suficientes da autoria ou participação delitivas, consoante dispõe o art. 413, caput e §1.º, do Código de Processo Penal.

Isto porque os crimes dolosos contra a vida se sujeitam, por força de expressa determinação constitucional, a julgamento pelo Egrégio Tribunal do Júri [art. 5º, inciso XXXVIII, alínea d] e, a despeito desse comando, o procedimento respectivo é fracionado pelo Código de Processo Penal em duas fases principais com funções bem delimitadas (art. 406 e ss.), visando assegurar a regularidade do processo e impedir que toda pretensão acusatória seja invariavelmente submetida à sorte de um corpo de jurados orientado pela íntima convicção, sem que antes se evidencie a provável prática de um delito da sua competência.

O rito bifásico tem início com a instrução preliminar ou judicium accusationis, que é endereçada a um juiz togado e se restringe, como dito, ao exame da admissibilidade da acusação, mediante um juízo ainda precário sobre os fatos supostamente criminosos e sob a luz do conhecimento técnico do Direito, que poderá culminar na pronúncia do acusado, com o consequente envio da imputação da forma mais simples possível ao Conselho de Sentença; mas também na impronúncia ou na absolvição sumária, ou mesmo na desclassificação da infração penal.

Assim, acaso se convença da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria ou participação no crime, o magistrado deverá pronunciar o acusado de forma fundamentada, especificando o dispositivo em que o incursionar, inclusive com as qualificadoras e as causas de aumento de pena.

Nesse momento, os “indícios suficientes” devem ser compreendidos como um princípio de prova capaz de situar o réu no contexto criminoso, mesmo que de maneira não plenamente segura, mas o bastante para submetê-lo ao julgamento de seus pares, únicos competentes para sanar eventuais controvérsias.

Deve-se ter em conta ainda que, ao prolatar um juízo fundado de suspeita das imputações, não compete ao magistrado singular a análise aprofundada das provas, devendo contentar-se com razoável apoio nos elementos indiciários e motivar o seu convencimento de forma comedida, sem avaliações subjetivas e sem externar conclusões ou convencimento absolutos no sentido de que tal agente é ou não o autor do delito, para não influenciar o ânimo dos jurados.

Por sua vez, sabe-se que a impronúncia, instituto previsto no art. 414 do Código de Processo Penal, é a antítese da pronúncia e, de tal forma, será reconhecida quando não houver prova da existência do crime ou indícios mínimos acerca da autoria ou de participação. Nessa hipótese, encerra-se a primeira fase do rito escalonado do Tribunal do Júri com decisão sem julgamento de mérito, o que não inviabiliza o oferecimento de novas denúncias acaso sobrevenha a produção de elementos inéditos acerca do fato ilícito.

Assim sendo, o acolhimento do pedido de pronúncia formulado i. ORGÃO MINISTERIAL neste caso concreto depende necessariamente da existência cumulativa de prova da materialidade do delito doloso contra a vida e de indícios mínimos capazes de apontar o apelado como possível autor ou partícipe na empreitada criminosa.

Outrossim, cumpre pontuar que, em recente mudança de orientação jurisprudencial, visando perfilar o seu entendimento com o posicionamento do excelso Supremo Tribunal Federal a respeito do tema, o colendo Superior Tribunal de Justiça passou a inadmitir a possibilidade de decisão de pronúncia baseada exclusivamente em provas produzidas no inquérito policial, sob pena de ofensa ao preceito contido no art. 155, caput, do Código de Processo Penal, consoante se exemplifica através dos seguintes julgados das referidas Cortes Superiores:

2. Nova orientação do Supremo Tribunal Federal (HC n. 180144, Ministro Celso de Mello, Segunda Turma, DJe 22/10/2020). A primeira fase do procedimento do júri constitui filtro processual com a função de evitar julgamento pelo plenário sem a...

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