Acórdão nº 0000195-42.2018.8.11.0011 Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, 05-09-2023

Data de Julgamento05 Setembro 2023
Case OutcomeProvimento
Classe processualCível - APELAÇÃO CÍVEL - CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO
ÓrgãoSegunda Câmara de Direito Público e Coletivo
Número do processo0000195-42.2018.8.11.0011
AssuntoViolação aos Princípios Administrativos

ESTADO DE MATO GROSSO

PODER JUDICIÁRIO

SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO


Número Único: 0000195-42.2018.8.11.0011
Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198)
Assunto: [Violação aos Princípios Administrativos]
Relator: Des(a).
GILBERTO LOPES BUSSIKI


Turma Julgadora: [DES(A). LUIZ CARLOS DA COSTA, DES(A). EDSON DIAS REIS, DES(A). GRACIEMA RIBEIRO DE CARAVELLAS, DES(A). HELENA MARIA BEZERRA RAMOS, DES(A). JOSE ZUQUIM NOGUEIRA, DES(A). MARCIO VIDAL, DES(A). MARIA APARECIDA RIBEIRO, DES(A). MARIA EROTIDES KNEIP, DES(A). MARIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA]

Parte(s):
[ESTADO DE MATO GROSSO - PROCURADORIA GERAL DA JUSTICA (APELADO), LUCI GARCIA SEBALDELI - CPF: 865.291.709-44 (APELANTE), ROSIANE PEREIRA DOS SANTOS - CPF: 026.567.271-62 (ADVOGADO), ESTADO DE MATO GROSSO - PROCURADORIA GERAL DA JUSTICA (CUSTOS LEGIS)]

A C Ó R D Ã O
Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a).
MARIA APARECIDA RIBEIRO, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, PROVEU O RECURSO.

E M E N T A

APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – ATO DE IMPROBIDADE – CUMULAÇÃO DE CARGO - SUPOSTA VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E DANO AO ERÁRIO - VIGÊNCIA DE NOVA LEI DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA MAIS BENÉFICA AO RÉU - DIREITO ADMINISTRATIVO SANCIONADOR – RETROATIVIDADE DA NORMA - AUSENTE COMPROVAÇÃO DE CONDUTA DOLOSA E O EFETIVO PREJUÍZO AO ERÁRIO – IMPOSITIVA A IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO – RECURSO PROVIDO.

1. A improbidade administrativa é disciplinada pelo direito administrativo sancionador, trazendo a nova lei alterações significativas para a configuração do ato de improbidade, dentre outras, por força do art. 5.º, caput, XL, da CF, deve ser observada e aplicada à hipótese vertente, porque mais benéfica.

2. Conforme os novos ditames da LIA, o dolo é imprescindível para a tipicidade das condutas previstas em seus artigos 9.º, 10 e 11, somado à comprovação do efetivo prejuízo ao erário, sendo insuficiente para a tipificação dos ilícitos ali especificados os meros atos voluntários de expediente do agente ou desempenho de competências públicas.

3. Não demonstrado o dolo dos requeridos, entendo restar prejudicada a tipicidade das condutas imputadas na exordial, conforme preceitua os preceitos da Lei 14.230/2021, que alterou a Lei 8.429/1992.

R E L A T Ó R I O

RELATÓRIO

DR. GILBERTO LOPES BUSSIKI (RELATOR)

Egrégia Câmara:

Trata-se de Recurso de Apelação Cível interposto por LUCI GARCIA SEBALDELI, contra sentença proferida nos autos da ação sob n° 0000195-42.2018.8.11.0011, em que o juízo a quo julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais, condenando a parte apelante na suspensão de seus direitos políticos, pagamento de multa civil e proibição de contratar com o Poder Público.

Em suas razões recursais, argumenta a parte apelante quanto à ausência de dolo genérico ou menor culpa nem sua conduta, motivo pelo qual entende que não houve a caracterização de qualquer ato de improbidade.

As contrarrazões foram apresentadas sob id. 27483498.

A douta Procuradoria-Geral de Justiça manifestou pelo desprovimento do recurso, conforme id. 34680989.

É o relatório.

V O T O R E L A T O R

VOTO

DR. GILBERTO LOPES BUSSIKI (RELATOR)

Egrégia Câmara:

Cuida-se de Recurso de Apelação Cível interposto por LUCI GARCIA SEBALDELI, contra sentença proferida nos autos da ação sob n° 0000195-42.2018.8.11.0011, em que o juízo a quo julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais, condenando a requerida em suspensão dos direitos políticos, pagamento de multa civil e proibição de contratar com o Poder Público.

Ressalta-se que se encontram presentes os requisitos extrínsecos, quais sejam, tempestividade, regularidade formal e preparo, bem como os intrínsecos, entre eles, cabimento, legitimidade, interesse recursal e ausência de fato extintivo ou impeditivo de recorrer, que autorizam reconhecer a admissibilidade e a apreciação da pretensão recursal.

De início, cumpre registrar que, após a prolação da sentença sobreveio a Lei n. 14.230/2021 (25/10/2021), que alterou profundamente o regime de responsabilização pela prática de ato de improbidade administrativa, previsto na Lei n. 8.429/1992.

Em decorrência da edição da mencionada Lei n. 14.230/2021, que alterou, significativamente, os dispositivos da Lei n. 8.429/1992Lei de Improbidade Administrativa –, surge a dúvida se as novas regras valem, ou não, para as ações de improbidade administrativa em curso.

Dirimindo a questão, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE n. 843989, paradigma do Tema 1.199, do regime da repercussão geral, de relatoria do Ministro Alexandre de Moraes, fixou as seguintes teses:

1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se - nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA - a presença do elemento subjetivo - DOLO;

2) A norma benéfica da Lei 14.230/2021 - revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa -, é IRRETROATIVA, em virtude do artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes;

3) A nova Lei 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente;

4) O novo regime prescricional previsto na Lei 14.230/2021 é IRRETROATIVO, aplicando-se os novos marcos temporais a partir da publicação da lei.

Analisando o voto do Ministro Relator, extrai-se que a tese prevalente orienta que Lei n. 14.230/2021 não retroage, contudo, deve ser aplicada aos atos de improbidade praticados na vigência da lei anterior, sem condenação transitada em julgado.

Dessa forma, em razão de o processo estar em tramitação, portanto, sem o trânsito em julgado, não há dúvidas de que as alterações procedidas pela Lei n. 14.230/2021 devem ser aplicadas à presente ação.

Sobre o tema, cito a doutrina de Marçal Justen Filho:

“As alterações introduzidas pela Lei 14.230/2021, em todas as passagens que configurem tratamento mais benéfico relativamente à configuração ou ao sancionamento por improbidade administrativa, aplicam-se a todas as condutas consumadas em data anterior à sua vigência. Isso significa que, mesmo no caso de processos já iniciados, aplica-se a disciplina contemplada na Lei 14.230/2021. Portanto e por exemplo, tornou-se juridicamente inexistente a improbidade meramente culposa, tal como não se admite mais a presunção de ilicitude ou de dano ao erário. Logo, os processos em curso que envolvam pretensão de aplicação da disciplina original da Lei 8.429 subordinam-se às regras mais benéficas da Lei 14.230/2021.

Assim sendo, não podemos afastar a novel legislação, mais benéfica aos requeridos.

A propósito:

“A lógica é evidente: o ordenamento jurídico não pode deslegitimar conduta que é benéfica a bem jurídico a que ele próprio confere valor diferenciado (para mais). A legitimidade da conduta, neste caso, deve ser compreendida de forma abrangente, englobando tanto o aspecto penal, como os aspectos cível e administrativo” (REsp 1123876/DF, relator ministro Mauro Campbell Marques, 2ª Turma, julgado em 5/4/2011, DJe 13/4/2011).

Nesse sentido, o STF também já se pronunciou, pela aplicação da lei mais benéfica em campo processual administrativo, verbis:

"A regra constitucional de retroação da lei penal mais benéfica (inciso XL do artigo 5º) é exigente de interpretação elástica ou tecnicamente 'generosa'. 2. Para conferir o máximo de eficácia ao inciso XL do seu artigo 5º, a Constituição não se refere à lei penal como um todo unitário de...

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